AMANHÃ

Amanhã...
Amanhã vou estar mais feliz, terei de novo a alegria infantil.
Amanhã esquecerei o sexo, serei inocente outra vez.
Amanhã serei mais dedicado, vou dar meu máximo.
Amanhã falarei com as flores, serei delicado.
Amanhã não me deixarei abater, serei forte.
Amanhã vou levantar cedo, aproveitarei a vida.
Amanhã vou me olhar no espelho, verei a beleza.
Amanhã agradecerei aos céus, o mundo estará lindo.
Amanhã vou cantar, serei espontâneo.
Amanhã vou...
Amanhã...
Amanhã...
Amanhã...
Madrugada
Manhã...
Mas o Amanhã já chegou.
A vida nada mudou.
O samba já acabou.
A embriaguez já passou.
Os humanos ainda estão por aqui.
O sorriso ainda parece forçado.
Não há motivo para dizer obrigado.
E infantil não é a alegria, mas a estupidez.
E o sexo ainda vem cobrar a sua parte.
E a dedicação é apenas para os fracos.
E as flores voltaram para os seus broches.
E a fraqueza ainda habita o fundo dos olhos.
E quem acorda cedo tem apenas olheiras.
E as olheiras denunciam a feiúra dentro do espelho.
E aos céus só resta a chuva, para esfriar as cinzas da beleza.
E o cantar é agora somente um fundo para a tristeza.
E para mim já não resta o amanhã, mas restam papéis e algumas letras.