Ana e Joana

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Maria Lúcia · Campo Grande, MS
12/2/2009 · 67 · 8
 


Joana era tão velha que nem mais se sabia sua idade, mas o mais surpreendente é que ainda tinha mãe. Elas eram tão velhas que até brincávamos, dizendo que as duas eram remanescentes de um tempo muito distante.
Estavam sempre juntas e aos sábados costumavam sair pela cidade fazendo visitas e juntando doações de comida e roupas. Eram sempre bem - vindas acomodadas na sala de estar e servidas de um bom mate – doce. A mãe, no entanto tinha um objetivo maior em suas andanças, puxando pela mão sua filha tão velha quanto ela,dizia a todos sobre sua grande preocupação.
Avisava que estava envelhecendo e que a morte a espiava, que em breve deixaria este mundo e que não sabia o que seria de sua menina, pois esta ficaria só no mundo após a sua partida.
Joana tinha um visível atraso no desenvolvimento mental e um visual muito interessante. Muito vaidosa, pintava-se exageradamente, adorava baton, pó de arroz, rouge e as mais coloridas sombras, que passava sem nenhum cuidado sobre suas pálpebras já tão envelhecidas.
Seus vestidos eram rodados e coloridos como vestidos de menina, mas vez ou outra apresentava - se num traje que por certo causava admiração pelo requinte e bom gosto. Vestia uma saia justa e longa de cetim azul petróleo com uma bela blusa no mesmo tom e uma adorável camélia branca que lhe caia no peito e lhe conferia além de uma elegância impar, uma intensa ternura e um indecifrável sentimento de solidariedade.
Joana era muito especial! Embora muito idosa aparentava jovialidade e contentamento contagiantes, era livre de conceitos ou pré – conceitos, valores pré – estabelecidos ou condições. O seu olhar para a vida era desprovido de qualquer sentimento de maldade, hipocrisia ou o que fosse além do seu desejo e necessidade de atenção,presentes, doces, sorrisos e afagos que lhe eram entregues com honestidade e doçura, como que em agradecimento a sua existência.
Sempre ao vê-la me sentia comovida e intrigada, e a cada vez que a via prometia a mim mesma ser mais feliz na manhã seguinte.
Como vinha anunciando, o dia da partida de Ana não demorou a chegar, Joana ficou só como bem sua mãe temia.
O mesmo ritual dos sábados foi mantido por Joana, ela percorria as casas e as pessoas a recebiam, enfeitavam, alimentavam e curavam.
E assim a eterna menina ia sobrevivendo a sua própria sorte. Num belo e ensolarado sábado Joana não apareceu como de costume, foram atrás dela e sua partida era eminente.
Joana foi encontrar – se com a mãe, partiu vestindo sua belíssima roupa azul petróleo com sua grande camélia branca pendurada no peito.
As mulheres da cidade numa homenagem muda e carinhosa acompanharam seu cortejo exageradamente pintadas e vestindo alegres vestidos de meninas.






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Autoria
Maria Lúcia Medeiros Teixeira
Ficha técnica
Psicóloga Clínica - Pós Graduada em Psicoterapia de Orientação Analítica - UNIDERP - IPD.
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Maria Lúcia
 

Olá meus caros overmanos e overminas;

Agradeço desde já àqueles que por aqui passarem e peço desculpas, por que o texto não está bem formatado.

Abraço grande à todos.

Maria Lúcia · Campo Grande, MS 12/2/2009 17:30
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raphaelreys
 

Romantico o fechamento da crônica! Cada alma que vem ao mundo é em missão! Cada qual com o seu cada qual cada um com o seu pecado e felicidade! Beleza mimaha cara! Meus votos e abraços!

raphaelreys · Montes Claros, MG 12/2/2009 18:54
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Cláudia Campello
 

faço minhas as palavras do meu poeta Rafhael Reys.....
lindo conto
e subitamente feliz... p q sera ?

bjsssssss ;)

Cláudia Campello · Várzea Grande, MT 12/2/2009 23:43
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Maria Lúcia
 

Rapha,
é isso ai mesmo, cada um com sua história e sua missão.

Cláudia,
Me explica isto de "subitamente feliz "...

Grata e beijos para ambos overmanos (mina)


Maria Lúcia · Campo Grande, MS 13/2/2009 16:31
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Zico Carvalho
 

Belo Texto, trouxe me lembranças de uma personagem real de minha cidade. Maria Sete Voltas, esse era seu nome, já virou livro, virou poesia , virou música, virou peça de teatro, e por muito tempo continuará inspirando a minha Rondonópolis.
Parabéns, muito BOM!

Zico Carvalho · Rondonópolis, MT 13/2/2009 22:30
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Maria Lúcia
 

Oi Zico,

Bem- vindo!
Joana e sua mãe existiram, no entanto não foram tão homenageadas quanto a tua Maria Sete Voltas.
Volte sempre.
Abraço

Maria Lúcia · Campo Grande, MS 14/2/2009 01:30
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Rangel Castilho
 

Salve, Malu!

Já havia feito a leitura desse seu belo escrito.
Só não havia comentado...

Muito terno e lindo.

Abraço Pantaneiro.

Rangel Castilho · Anastácio, MS 20/8/2009 13:07
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Rebeca Delgado
 

Lindo...triste e lindo

Rebeca Delgado · Curitiba, PR 30/11/2009 11:57
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