Café com leite

Eu vejo as meninas subindo a rua. Caminham e conversam animadamente, pelos cotovelos, com as mãos e ao celular. Falam como se suas vozes fossem acabar nas próximas sílabas. Sobre nada e sobre tudo, param às vezes por nenhum motivo e gargalham. Como dão risada as meninas de 16.

Algumas muito maquiadas, escondem sua meninice no fichário cor-de-rosa. Outras enfrentam a rua de cara limpa, com uma confiança que não terei aos 36. Passam por mim e sinto a mistura de perfumes doces e sabonete de coco e gloss de tutti-frutti. Cheiram a açúcar e afeto.

As meninas que sobem agora a rua, dormem à tarde quando sentem vontade e vêem muita TV. Impressionam-se fácil. Preocupam-se com a prova de biologia, com as fórmulas de física, com o telefonema que não vem. Mas não trocam um guaraná por uma xícara de café preto. Não tomam café preto. Procuram a graça no fundo daquele líquido preto e só encontram quando enchem de açúcar e leite.

Gosto dessas meninas porque ainda não precisam do café como remédio para o sono e cigarro. Vestem uniformes, mas parecem caminhar na praia. Riem, porque têm a rua toda para elas, como o mundo inteiro que se abre...

Eu vejo as meninas subindo a rua que agora desço e também sorrio.