DEUS DE DEUS

Leandro Palmeiras Photostream
1
Benny Franklin · Belém, PA
18/8/2007 · 165 · 34
 

Foto: Adida Fallen Angel/Flickr/Creative Commons

"OM MANI PADME HUM!"
(Salve a jóia que vibra no lótus)

Findo os meus dezoito orvalhos pêcos,
Porque engasgado de vieses
Desconectei-me do Verbo acreditar e, agora, aos quarenta,
Conectei-me de novo ao Vulto
Na busca do Sangue Derramado.
Não deparava
Deus de Deus havia anos.
Minha devoção
Resumia-se a expelir vômitos e anfetaminas.
Porque bêbado de lascivo poder,
Porque barbudo de corrupção e anginas,
Temia ser Deus de Deus;
Porquanto era a Pedra e não Eu
O próprio Deus de Deus
Em pessoa.
...................
Na verdade,
Nunca temi espumar
O gozo de Deus de Deus.
Creiam-me! Meus momentos com o Dito-Cujo
Sempre se sujeitaram a amolar canivetes de lágrimas,
A grelar sonhos de enxadas e suores,
A copular palavras sem nunca penetrá-las
E a negrejar pivetes de tênue esquina
Com passos e rejeitos desgalados...
Antes, fumar Deus de Deus,
Era como transpor à desmedida angústia,
De modo que, meu conhecer,
Prestava-se a orar imagens de corpos e baionetas,
A calcular milagres (?) de rezas pernetas
E de acreditar
Em seitas de fortunas e pranchetas:
Sobretudo certas seitas
De subornar exegetas;
Sobretudo imorais seitas
De fétidas sarjetas...
...................
Ai! Sempre repousei na fomedez das dúvidas
E na certeza de ser (Eu e a Pedra)
O Deus de Deus.
Porém, dado à redenção do olhar,
Coube a mim e não a Ela,
Ser o anjo de compungir meteorito,
Ser o frasco de sorver e baldear sexualmente
As incredulidades noturnas.
Porque antes, sendo Deus de Deus,
Coberto de lamas vaginadas,
Estava forçado pelo vômito do querer,
A morrer de mãos dadas
Com as virgens beatas despossuídas.
...................
Além do mais, apostava
Que Deus de Deus
Possuía extrema coragem de matar,
Que de Deus de Deus
Devastava rios de sonhos
E se desfizesse em sangue sob a rala maquiagem
Dos nossos esfomeados encantos.
Sempre cri que fé
Soar-se-ia a mim e não aos céus
Como se prendêssemos Deus de Deus
Às gaiolas dos padres,
Às máscaras dos broxas,
Às flôres dos natimortos...
Cujo amor camuflado
Qual fechadura
Das têmperas entreveradas,
Soar-se-ia a mim e não a Deus
Como paternidade
Sem alva compostura.
...................
Mesmo que
Invejasse ser Deus de Deus,
Não era o que eu mais temia.
Minha piedade em mim
Resumia-se em fomes e guerras,
Em lúgubres enterros,
Em homens sem terra...
Já que, intuído
A furar os meus olhos
Com alfinetes de inferno e céu,
Eu cria ser Deus de Deus...
E Deus de Deus,
Não haveria de me catar em bagos soluçantes
Como carniça humana,
Ou féretro congeminado
Caminhando em fina abstinência.
...................
Nunca temi ser
Como o aço das nuvens sem sexo,
Tampouco ser o próprio Deus de Deus.
Porque agora, Deus de Deus,
Obrigava-me
A copular
As selvagens orquídeas desmerecidas;
Obrigava-me agora, a ver
O gozo excitante
Das nuvens em descomunhão de idéias...
Porque, enfim, agora, “Acreditei-meâ€
E hoje, Creio-O.
...................
Deus... Deus...
Agora de posse do cajado eletrônico,
Não temo recusar o amor dos condenados,
Não temo expulsar
A loucura dos Deuses broxados...
Porque agora, Senhor, anexando-me a Ti,
Razão da razão,
Verbo do verbo,
O Teu fluído há que alimentar
O meu cimo desconhecido,
O insustentável há de iluminar-me – e galar-me!
Daí Senhor, perdoe-me o gládio:
“Que dizer da saúde emprenhada
Dos fortes rochedos de nós?â€
A face — não!

Benny Franklin

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Autoria
Benny Franklin
Ficha técnica
Poema que é "pano para muitas mangas". Cada "Uniforme da Fé" deveria ser talhado conforme anseia o coração do homem. Retalhos? São mangas a serem costurados em outra circunstância.
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Humberto Firmo
 

Teogonista Benny, o olimpo estremece.
Face a face fica difícil de se encarar.
frente a frente com o eu-mesmo.

Volto e comento mais ao vo(l)tar

Humberto Firmo · Brasília, DF 16/8/2007 12:37
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André Teixeira
 

Benny!!!

Desde algum tempo venho comungando intimamente do ensinamento que oblitera em parte o sentido restante da Bíblia (em princípio alfabetizante fulcrado na Espiritualidade), atribuído a Cristo: "VÓIS SOIS DEUSES". Em outras (minhas) palavras: Pois como disse um certo galileu, "Vois sois deuses".
Portanto, celebrando-me estarei, por conseguinte, celebrando deus também. Note-se também que com o poder de "ser deus" advém também, como disse certo amigo da vizinhança, 'grandes responsabilidades!!' "
.

Comentário completo AQUI.

Cara, afluem também as linhas gerais do seu poema para o livro que recentemente tem me tirado o sono, 'Ascece', do Nikos Kazantzákis, cuja lápide, hoje, GRITA: "Não quero nada. Não tenho medo de nada. Sou livre."

'Poesofia ou Filoesia?' são os teus escritos?

Poesia e Filosofia emeiados com fina linha em bela estampa.

GRANDE abraço!!!

A.

André Teixeira · Aracaju, SE 16/8/2007 13:01
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Humberto Firmo
 

André vc falou em Ascese do Nikos, aí me lembrei do Ascese Mística do Pietro Ubaldi que mistura ciência e filosofia/sabedoria/mística.

Uma coisa leva a outra, esse poema do Benny faz pensar.
abraços

Humberto Firmo · Brasília, DF 16/8/2007 13:35
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Rangel Castilho
 

É bem verdade, Benny!
Basta crer que o céu já nos espera.
Em qualquer esfera, de qualquer cor e em qualquer dimensão
haverão deuses. E lhe digo mais:
Eu lhe abençôo...

Rangel Castilho · Anastácio, MS 16/8/2007 13:41
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Nivaldo Lemos
 

Benny,

teu poema vasculha o universo da própria alma, teomancia promordial da existência, numa viagem mística, quase teológica, pelos mistérios da criação. Poesia teogônica. A melhor que li.

Parabéns.

Um abraço.

Nivaldo Lemos · Rio de Janeiro, RJ 16/8/2007 14:07
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Marcos André Carvalho Lins
 

não tenho " capital pensante " para oferecer qualquer comentário. apenas, receioso, compactuo com tua escolha ao final. Deus de Deus, apenas enquanto Nele não nos residirmos, fizermos morada e erigirmos sentido. Deus, como bem dizes tu, se compreendi bem, está nas pequenas centelhas de humanidade e até mesmo numa "esfácela" pedra a condoer-se de suas tamanhas e infinitas obrigações perante Ele.
belo texto!! ( grande reflexão )
abraços,

Marcos André Carvalho Lins · Recife, PE 16/8/2007 14:12
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José Telmo
 

Benny, ainda não li seu poema. Agora, apenas uma observação: verifique o mantra. Todas as referências que tenho trazem OM MANI PADME AUM e não RUM.
Abraços,

José Telmo · Belo Horizonte, MG 16/8/2007 17:43
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Lígia Saavedra
 

Benny do céu!
O Vaticano te espera e a tua excomunhão também. Te imagino morando dentro de um livro sem letras, como castigo. Não vc não merece castigo e sim aplausos muitos.
Meadmiromideti.
Como diz meu amigo Dolzane, Carpe Diem

Lígia Saavedra · Ananindeua, PA 16/8/2007 18:06
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Benny Franklin
 

Benny Franklin · Belém, PA 16/8/2007 18:34
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Saramar
 

Benny, Benny, onde as palavras para dizer mais alguma coisa?
Deois da ponte que atravessei lendo esses versos, vejo-o do lado do Deus que sempre acolhe suas imagens dispersas pelo mundo.
Vou reler e depois tentar dizer alguma coisa.
beijos

Saramar · Goiânia, GO 16/8/2007 18:53
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Agenor
 

Fantástico este teu reencontro com Deus, não o "deuses broxados" presos às "gaiolas dos padres", os deuses de "seitas de fortunas e pranchetas", sobretudo " de subornar exegetas", mas o Deus de Deus, SOBERANO CRIADOR INCRIADO, o Deus de "alva compostura"
Fantástico!

Agenor · Aquidauana, MS 16/8/2007 19:54
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Luiz Antonio Cavalheiro
 

Blz de texto. Volto pra votar.

Luiz Antonio Cavalheiro · Cordeiro, RJ 16/8/2007 20:47
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carlos magno
 

Olá amigo Benny,

gosto muito da maneira diferente com que você constroi e conduz seu texto poético e o coteúdo também é muito interessante. Meus sinceros aplausos e abraços.
Carlos Magno.

carlos magno · Rio de Janeiro, RJ 16/8/2007 22:38
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jjLeandro
 

O homem jamais quer descobrir ou aceitar ser ele o próprio Deus de Deus. Seria refutar o que ele mais persegue: a eternidade. Se não a possui aqui, a projeta no Além, de conformidade com a idéia de ter que durar para sempre, pois é superior a tudo que na face da terra existe.
O seu grande calvário é, pois, a irrefutável constatação de ser igual a tudo que existe aqui: finito! Já o disse Schopenhauer, a despeito de seu pessimismo, que para a Natureza não interessa o espécime, mas a espécie. O espécime é finito, só a espécie sobrevive.
abcs Benny, bela poesia.

jjLeandro · Araguaína, TO 16/8/2007 22:49
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Cintia Thome
 


Benny
Mais uma jóia? E brilhante.
Envaidecida de conhecer este amigo...amigo de Deus.
Razão da Razão
Verbo do verbo

Só voce para definir erros e acertos do homem diante Dele.
Você é "o " Poeta. Modernismo ...agora já sabemos o significado rs. Bom demais.
OHF aplaude.

Cintia Thome · São Paulo, SP 17/8/2007 06:51
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BETHA
 

BENNY,
glória a Deus pela tua bendita inspiração!
Abçs de Betha.

BETHA · Carnaíba, PE 17/8/2007 10:46
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Adroaldo Bauer
 

Se é verbo, idéia foi.
Então, do criador a criatura à semelhança feito,
finita, o imagina infinito.
Imaginar o verbo ou é a tarefa da fé...
Ou do poema.
E bem o fizestes, Benny.

Adroaldo Bauer · Porto Alegre, RS 17/8/2007 11:09
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FILIPE MAMEDE
 

Metafísico Benny, que poema é esse? Uma mistura de Nietzsche com Fernando Pessoa e mais algumas doses Existencialismo sartreano...
Gostei muito.

FILIPE MAMEDE · Natal, RN 17/8/2007 11:51
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Bel Fonseca
 

Que catarse poética mais maravilhosa, Benny. Que talento incrível. Parabéns.

Bel Fonseca · Belo Horizonte, MG 17/8/2007 18:21
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Humberto Firmo
 

Voltei e votei Benny.
Que os Deuses do Olimpo te ilumine!
abraços!

Humberto Firmo · Brasília, DF 18/8/2007 07:54
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Noelio Mello
 

Amigo Benny.
O reencontro do homem com Deus é um risco de luz no universo. Isso é fé, Benny.
Forte abraço.
Noélio

Noelio Mello · Belém, PA 18/8/2007 08:56
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peninha
 

Deus (?)
Fé (?)
Não ... Não o posso, não ainda...seja-o-teu!

peninha · Butão , WW 18/8/2007 10:39
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Juliaura
 

Oh, Deus!

Juliaura · Porto Alegre, RS 18/8/2007 10:40
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crispinga
 

Para ser arquivado e lido com muita calma!
Lindo texto, pungente...
Bjs
Cris

crispinga · Nova Friburgo, RJ 18/8/2007 14:47
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Aldo Votto
 

Caro Benny,
Poema devoto, poema ex-voto, pleno de votos.
Meu voto de Votto.
Abraço,
Aldo

Aldo Votto · Florianópolis, SC 18/8/2007 15:11
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Sander
 

Meu Deus!
Perfeito!
Como o Deus de Deus.
Abçs
Sander

Sander · Cassilândia, MS 18/8/2007 15:11
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marcio rufino
 

Cada vez mais me sinto encantado por sua divina poesia existencial.

Um forte abraço

marcio rufino · Belford Roxo, RJ 18/8/2007 17:21
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Cintia Thome
 

Deus de Deus...

Uma súplica, uma benção, um parceiro único.
GOSTEI E VOTEI
bj

Cintia Thome · São Paulo, SP 18/8/2007 18:19
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Levi Orlando
 

Benny:
Diferentemente do recado que vc postou no meu perfil, eu ainda não tinha acessado aqui para ler este seu poema.
Ao fazê-lo agora, sinto nêle a expressão da vertigem que o componente místico ancestral da alma humana provoca.
Tocado por ela, faço o cumprimento budista com as mãos postas, de encontro ao peito, que significa:
O Deus que habita em mim reverencia o Deus que habita em ti.
Um abraço.

Levi Orlando · Porto Alegre, RS 18/8/2007 22:03
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Levi Orlando
 

Acrescentando:
Habita em ti, em mim e em todos nós, criadores e criaturas neste vasto Olimpo humano.
Benny:
Com um olhar mais atento, vejo a sacada genial que há no duplo sentido em "A copular palavras sem nunca penetrá-las", entendido o significado de cópula como: palavra que, numa proposição, exprime a relação entre o sujeito e o atributo.
Está aí uma daquelas
pérolas de sentido a que me referi antes.
Um abraço.

Levi Orlando · Porto Alegre, RS 19/8/2007 06:27
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Adriana Costa
 

A furar os meus olhos
Com alfinetes de inferno e céu,
Eu cria ser Deus de Deus...


Foram tuas palavras, poeta, que me trouxeram pra este excelente Overmundo. Obrigada por nunca esquecer-te de mim. Mais grata ainda fico eu, pelos teus poemas inquietos que desaguam dentro da gente.

Adriana Costa · Brasília, DF 19/8/2007 10:16
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Agenor
 

Volte pra votar e renovar meus parabéns.
Abcs

Agenor · Aquidauana, MS 20/8/2007 18:50
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Humberto Firmo
 

Salve Beat Benny!
Voltei, obrigado pelo lembrete.

Os deuses hindus são os que mais se identificam com os movimentos
do mundo: o destruidor Shiva e o criador Brahma, vivem em ciclos
de caos e cosmos.
Seu poema retrata bem essa destruição e criação no lado humano.
A eterna luta entre o inferno e o céu.
Comer e ser comido por esse Deus interno e externo.
Um autocanibalismo cíclico.
O teu poema é isso: Deus comendo Deus e arrotando Deuses.

A jóia do lótus esteja contigo.!

Humberto Firmo · Brasília, DF 22/8/2007 15:39
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Cintia Thome
 

Amei...Repito aqui :amei sobre todas as coisas...amei as coisas e quero retornar para amar sempre sobre todas as coisas.

Cintia Thome · São Paulo, SP 24/10/2007 05:14
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