Dois caras, um coração de cão
O cara pardo estava pregado no sofá, diante da tevê. É quase sempre assim à hora do jornal nacional.
Adentrei à sala numa noite boa e de estrelas e de sem calor. E ainda melhor: leve como pluma, sem o pejo da culpa de pecado da cultura judaico-cristã. É preciso, às vezes ser um grego antigo, ser um pagão, ser um cão!
O cabelo um pouco crescido e desgrenhado, fora do habitual, denunciava ainda mais suas cãs. Pensei em troçar dele. Iria dizer: Aí “véio”, está parecendo com uma raposa velha, hein?! Não está na hora de fazer uma bainha nesse coco não?! Segurei a “onda”. Venceu a reflexão. Eu não sabia se estava ali dentro daquele homem, um anjo de candura, como de costume ou o demônio do mau humor que boiava, volta e meia.
Também chafurdei-me no sofá. Havia o mundão de Colatina e adjacências a meu dispor, naquele noite tropical, mas quis ficar. Sabia que não havia nada apeteciável no mundinho da televisão, principalmente, nas notícias do telejornal.
O Willian Bonner com sua mecha prateada e a Fátima Bernardes com melenas caprichadas pela chapinha japonesa, para mim eram porta-vozes de um mundo cão: ocupação ocidental no Iraque, homens bombas, mensalão, terremoto no Afeganistão, o Vasco despencando na tabela. E o velho todo olhos e ouvidos, sem se aborrecer.
Ali do meu lado estava anos da minha vida. Um carola cristão no papel e alma pagã no dia-a-dia. Assim como a ele, quase nada me afetava. Mas o casal da tevê narra o fato do menino iraquiano Ali Ismail Abbas que havia amputado os braços. Estava no lugar errado (num alvo civil atingido por engano pela coalizão anglo-americana). Uma criança muçulmana que perdera, além dos braços, parte da família, incluindo pai e mãe, para nos sacanear, gesticulando com o seu coto de braço. Criptonita! Tentei olhar para meu pai. Ele não poderia me ver com olhos marejando. Deus me livre se ele me visse assim! Ainda bem que um sono súbito o acometeu. Ele se esticou no sofá, pôs uma almofada na cara e não mais viu o telejornal e nada mais. E eu: Para o alto e avante!
Joel,
Que conto
comico se não fosse trágico
gostei!
bjs e boas festas
Texto criativo e muito verdadeiro!
Parabéns! Votadíssimo!
http://www.overmundo.com.br/banco/o-quarto-de-boneca
Votado com alegria! Parabéns!
Abraços daqui e Boas Festas!
Obrigado, amigos, pelo incentivo e pelo voto! Que todos tenham um natal muito feliz e um 2009 com muita energia positiva e sucesso!
joelrogerio · Colatina, ES 22/12/2008 21:40Essa foi muito boa! M,eus aplausos e meus votos! Feliz Natal!
raphaelreys · Montes Claros, MG 23/12/2008 06:42
Oi, Super Joel. Pô, eu tenho chapinha japonesa na cabeça! E também sou jornalista. Mas não sou instrumento do mundo cão.
Olha só, você não tem que acreditar em tudo o que vê nos noticiários. O mundo não é tão cão quanto eles pintam. Todo mundo tem um bocado de coisas boas para contar. Mas a a gente aprende na faculdade que notícia e pequena, superficial, é tudo o que se encaixa num enquadramento que deixa de fora as coisas boas. Lê a Eliane Brum, que é reportar especial da Época. Quando a gente a lê percebe tudo o que o jornalismo deixa de fora: a vida.
Beijo grande,
Sindia.
Valeu, gostei, votado. Fora o aprendizado de mais uma palavra: pejo.
Abraços,
Nossa! Dá até para imaginar a cena. Votado
Sandrah Sagrado · São Paulo, SP 23/12/2008 14:52Para comentar é preciso estar logado no site. Faa primeiro seu login ou registre-se no Overmundo, e adicione seus comentários em seguida.
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