Em 2005, recebi um inesperado e quase inusitado convite da historiadora Edileuza Penha de Souza para participar de um projeto editorial que acredito seja inédito no país: o livro Negritude, Cinema e Educação – caminhos para a implementação da Lei 10.639/2003. Inesperado porque o livro é dirigido a professores e não sou uma profissional da área da educação. Inusitado porque embora seja uma simpatizante do movimento negro, passo vergonhosamente ao largo da causa, como se minha pele exageradamente branca me dispensasse de envolvimento numa questão tão fundamental como a discussão da invisibilidade da cultura negra na formação cultural e social do povo brasileiro. Mas, como o pedido da organizadora era que eu escrevesse sobre Domésticas, o filme, de Fernando Meirelles e Nando Olival, nem pestanejei em aceitar.
Vi Domésticas pelo menos umas dez vezes, e todas com muito prazer. Não fiz isso por nenhuma obsessão pelo filme, não: ele foi exibido no circuito comunitário do projeto Cinema BR em Movimento, no qual atuo aqui no ES. Trabalhar num projeto como esse tem muitas vantagens e certamente a maior delas é poder levar o cinema para um público que normalmente passaria bem longe das salas de exibição (principalmente se o filme for nacional). Mas me atrai, principalmente, a possibilidade de ver um filme que gosto muitas vezes, até decorar planos e diálogos inteiros. Foi assim com Domésticas.
O projeto do livro surgiu nos intervalos entre as conferências do I Seminário Saída da Escravidão e Políticas Publicas, promovido pelo Governo Federal e a UNESCO, em Brasília, no início de 2005. Edileuza e a professora Rosana Pires conversavam sobre como o cinema pode introduzir debates interessantes nas salas de aula e fizeram um rol de filmes que poderiam ajudar os professores nessa tarefa. Daí a pensar num livro que fosse uma espécie de ferramenta guia para educadores foi um pulo. A idéia era fazer uma espécie de roteiro de leitura dos filmes, com sugestões de encaminhamento dos debates e trabalhos didáticos. Os autores (mais de trinta), foram escolhidos pela sua atuação profissional e afinidade com as questões étnico-raciais, com o cinema, ou com ambas as coisas. São profissionais de áreas bem diferentes, de diferentes locais do país, o que deu à publicação um colorido muito peculiar.
A próxima tarefa foi dar forma aos conteúdos recebidos e, parte mais complicada, partir à procura de uma editora que comprasse a idéia. Essa foi a Mazza Edições, de Belo Horizonte, especializada em livros étnicos e educação especial. A editora sugeriu que o livro fosse dividido em dois volumes. O primeiro foi lançado em agosto. Nele estão nove filmes nacionais e seis estrangeiros realizados até 2001. Entre eles Macunaíma; Cruz e Souza, o Poeta do Desterro, Faça a Coisa Certa e A Negação do Brasil. O primeiro volume conta ainda com o primoroso prefácio do documentarista e antropólogo Noel Santos Carvalho, que faz uma explanação sobre a trajetória e participação do negro no cinema nacional e fala do movimento paulista Dogma Feijoada, do qual faz parte.
O volume II , a ser lançado em março de 2007, trará produções de 2002 em diante. Mesmo com algumas falhas na escolha dos filmes, Negritude, Cinema e Educação é um livro que merece lugar importante nas bibliotecas escolares e, principalmente, na mesa de cabeceira dos professores.
Para vocês sentirem o gostinho do Negritude, vai em anexo o meu artigo sobre Domésticas.
Vi agora que o link para o projeto Cinema BR em movimento não está funcionando. O endereço é www.cbrm.com.br
Bom trabalho, Ilha! Bela reflexão ali no início do texto. Aliás, já que você afirmou a fundamentalidade desta questão do 'negro invisível' porque não continua nesta praia? Sempre achei que o assunto, um falso tabu, indesculpável, é uma espécie de chave mestra dos problemas sociais (e culturais) mais recorrentes do Brasil. Vou ler o teu artigo agora mesmo.
Abs,
Concordo inteiramente com vc, Spírito! Mas não acho que eu seja a pessoa indicada para refletir sobre isso. Não muita leitura na área, nem sou da praia da sociologia ou antropologia. Acho, porém que tem bons pensadores refletindo sobre essa questão no Brasil. Você, pelo jeito, trabalha com a temática do negro na cultura, e poderia nos deixar aqui suas reflexões. Baixei sua peça, mas ainda não li. Se leu meu artigo, deixe aqui sua opinião. Será bem vinda. Um abraço!
Ilhandarilha · Vitória, ES 26/1/2007 11:21
Ilha,
(O bonequinho ao lado sou eu mesmo, o Spirito. Estou num recesso voluntário por causa de um problema de senha) mas não resisti e vamos lá:
O que eu quiz dizer é que o assunto é tão fundamental para o Brasil que todo mundo precisa participar de sua resolução. Não é um problema absolutamente só de negros ou especialistas, muito pelo contrário. Você lembra aquele texto, se não me engano do Bertold Brecht, que (guardando as devidas proporções), se referia as pequeninas omissões da sociedade alemã diante da evolução de incidentes sociais que culminaram no nazismo? Um dia era com os ciganos, no outro com os comunistas, nunca era com a gente, até que um dia...
(Em tempo)
Acabei de ler o teu artigo. Gostei pra caramba. Então? Você já estava na história. Modesta!! Te escolheram não foi à toa. É como o Meirelles, (do filme). Ele é um outro bom exemplo do que falávamos. Fiel a história que começou lá com o 'Domésticas'. Não é que se vá fazer disso um tema único. Até por que não é questão cosmética, superficial, de forma apenas. É uma espécie de substância, de tônus que nos faz falta. Mandei uma cópia pro Zózimo. Se ele ainda não leu vai ler (e gostar de se ver tão bem na foto.)
Abs,
Parabéns
Dai a importância da Lei 10.639 e de iniciativas para ajudar educadores na sua implementação. Acho que só mesmo por meio da educação poderemos reverter esse quadro de (por que não dizer?) desrespeito para com a contribuição do negro na sociedade brasileira.
Legal você ter enviado o texto pro Zózimo. O prefácio do livro, do Noel Carvalho, fala muito nele e em sua contribuição para o cinema e o teatro brasileiros.
Abraços
É isso, Ilha, educação sim. O que atrasa o Brasil é memso a ignorância (principalmente a dos que julgam cultos). O Zózimo, infelizmente, ficou doente durante as filmagens de "O veneno da madrugada' do Rui Guerra. Está se recuperando bem (acho que de um AVC). A fundação Palmares (do MinC) acaba de lançar um DVD com a obra dele. Você vai gostar. Vamos ficar em contato, tá?
Este papo é bom e vai longe, além do mais, como meu nome sugere, sou capichaba (meio). Minha mãe era de Jerônimo Monteiro, conhece? Ali perto de Cachoeiro? É isso.
Grande abraço,
FANZINE EPISÓDIO CULTURAL E REVISTA DO CINEMA MACHADENSE
OLÁ, MEU NOME É CARLOS E SOU O EDITOR DO FANZINE EPISÓDIO CULTURAL E DA REVISTA DO CINEMA MACHADENSE (1911─;2005). ESTOU DIVULGANDO O FANZINE PELA INTERNET EM ARQUIVO PDF (DE GRAÇA )!
O MEU MAIOR INTERESSE É DIVULGAR O MEU TRABALHO. CASO QUEIRA VER OS FANZINES ( QUE SÃO IMPRESSOS AQUI EM MACHADO/MG) É SÓ MANDAR UM E─;MAIL ,OK?
APROVEITE E VEJA O VÍDEO DA MINHA REVISTA NO YOUTUBE. O LINK É:
http://www.youtube.com/watch?v=WEpox-M6zyw
339 downloads em 19/06/2007 e apenas 65 votos!
Gente, o texto está aqui para quem quiser utiliza-lo (respeitando os meus direitos autorais e os da editora, é claro, de acordo com o CC).
Mas sou uma autora carente e preciso de retorno. Se gostaram, votem, elogiem, joguem confete! Se não gostaram, critiquem, mostrem os pontos fracos... Mas por favor, dêem algum retorno. Afinal, é para ter esse feedback que a gente publica aqui sem receber nada.
Abraços
Olá Rapaz, adorei a idéia. Vamos continuar estreitando as relações. Oena que já está em cima do Fórum Regional. Estamos pensando em filmar todo o evento para ficar registrado na Diretoria Regional de Educação do alto sertão sergipano. Quando li o seu comentário, fiquei muito feliz pela sua valiosa colaboração. Veleu!!!! João Everton da Cruz
João Everton da Cruz · Nossa Senhora das Dores, SE 20/9/2007 14:08
Notei agora que os links para o Dogma Feijoada já não existem. Provavelmente as páginas não existem mais. Vai aqui outro sobre o movimento.
Oi Cláudia, esse assunto é tudo que eu vivo e que eu trabalho há décadas... puxa, há quanto tempo trabalho... ainda bem que amadureço mas não envelheço rsrsrsrsrsr sabe, na década de 90 do século passado eu já realizava uma Mostra Cultural da Consciência Negra, onde tudo que fosse referente à negritude e sua contribuição cultural era apresentado e representado pelos estudantes, desde o acarajé, o abará, o caruru, comidas típicas da Bahia, passando pela capoeira, por Zumbi, História da África, pela história de João Cândido , recital de poesias, exposição fotográfica, canções, cantigas de roda e principalmente o debate sobre o branqueamento da cultura negra. Felizmente chegou uma lei 18 a 20 anos depois, mas pelo menos chegou, outros profissionais se sentem mais estimulados, amparados e protegidos para discutir o assunto, eu sempre ouvi que eu era racista, tive uma colega de pele clara que me perguntou por que eu não fazia a mosttra da consciência branca?rsrsrsrsrsr, enfim,,, esse seu trabalho é muito importante e necessário para todos nós...Um forte abraço e votei
Diacui Pataxo · Ilhéus, BA 16/9/2008 15:22Em tempo: o nome Mário Gusmão na Biahia é o nome do cinema negro por aqui. Não sei se esta obra fala dele, mas vale a pena uma pesquisa. Valeu!
Diacui Pataxo · Ilhéus, BA 16/9/2008 15:28
Diacui, que legal que vc achou essa minha colaboração aqui. Depois gostaria de um retorno sobre o texto que está em anexo. O legal de trabalhar com cinema é que um filme é uma obra com muitas possibilidades de gancho com a vida e com os conteúdos curriculares.
O livro Negritude, Cinema e Educação tem como proposta utilizar filmes que passam ou passaram nos cinemas e são mais fáceis de encontrar. Por isso acho que não tem nenhum do Mário Gusmão (aliás, eu não conheço, tem algum link para eu me informar mais?). Mas na introdução se fala bastante do Zózimo, outra referência no cinema nacional.
abraços
Ilha,
Sim, Mário Gusmão! Referência absoluta de ator negro no cinema brasileiro. Conheci a figura no set de Chico Rei, do Walter Lima (se não engano no dia em que ele fazia 50 anos). Além de estar no filme do Walter, ele está também em, pelo menos um, filme do Glauber (não me lembro qual, acho que no 'Dragão da Maldade')
Sobre o Mário Gusmão, gostaria de lembrar que o Elson Rosário realizou um documentário contemplado pelo DOC.TV. Chama-se "Mário Gusmão, O Anjo negro da Bahia".
O Mário figura em Deus e o Diabo na Terra do Sol, embora não tenha sido creditado. Ele também aparece em Dragão da Maldade e Idade da Terra, outros filmes de Glauber, além de outros importantes títulos como O Cangaceiro e Pindorama.
Não estou bem certo, mas acho que ele aparece também no filme experimental "Câncer" de Glauber. A partir de coisas inesperadas como esta que acabamos cultivando um grande interesse e consequentemente um ótimo trabalho. Parabéns pelo convite Ilha!
Ah: embora sejam filmes mais antigos, talvez a Sra Lúcia Rocha possa lhe orientar sobre os filmes do Glauber onde aparece o Mário Gusmão. Verifique através do projeto Tempo Glauber, existe um belíssimo site na internet. www.tempoglauber.com.br
drigo · Belo Horizonte, MG 21/9/2008 19:34
Drigo, legal. Vou dar uma olhada lá. Li seu post sobre o cinema brasileiro. Bacana. Não concordo porém no seu enfoque no público como o problema principal. Acho que a questão da distribuição é mais grave, e é o que torna o cinema nacional tão desconhecido do público brasileiro.
abraços
Cabaei de comprar o livro negritude, cinema e educação
adorei, mas servir para um projeto que estou tentando realizar
parabéns claudia
Que bom, Cláudia! O projeto é legal, não? Você comprou o vol. I ou o II ?
Ilhandarilha · Vitória, ES 21/10/2008 00:00Para comentar é preciso estar logado no site. Faa primeiro seu login ou registre-se no Overmundo, e adicione seus comentários em seguida.
Voc conhece a Revista Overmundo? Baixe j no seu iPad ou em formato PDF -- grtis!
+conhea agora
No Overmixter voc encontra samples, vocais e remixes em licenas livres. Confira os mais votados, ou envie seu prprio remix!