Ele estava adequado à solidão e, com o tempo, também ficou nu e sem Deus - tinha sua própria religião. Usava uns trapos de cânhamo sobre o corpo. Nada que fosse fabricado pelo homem ele tinha na casa, só natureza e pau-a-pique, construÃda por ele mesmo e o nome. Morava no meio de uma gravanha, aonde nem cavalo queria entrar. Era formada por árvores de grande porte, que serviam como edifÃcios para os tucanos e bugios. Outubro vivia isolado do mundo desde muito moço; aprendeu a ler e se apaixonou por literatura. Porém, só lia dicionários, escrevia os seus próprios livros. Tinha uma coleção de poemas desenhados com carvão, em folhas que ele mesmo curtia. As obras serviam de recheio para o travesseiro – como o travesseiro de um antigo poeta russo. Jamais seriam publicadas.
Em volta da sua casa tinha uma centena de cabaças penduradas, lado a lado. Dizia Outubro que, dentro daquelas cabaças havia o conhecimento sobre as coisas deste mundo e de outros. De uma das cabaças ele tirou um monte de anotações, foi num sábado à noite. Fui visitá-lo, menino curioso, na esperança de ver o céu bordado de luzes e explicações cientÃficas e filosóficas.
Caminhamos pelo terreiro da casa e havia muitos motivos no céu. Outubro aponta o dedo para uma constelação e fala como um sábio:
- Se olharmos com atenção, veremos figuras que foram colocadas pelos homens em épocas distintas. As mais comuns, quando éramos caçadores, por isso pusemos cães, leões, mulheres, caçadores e todas as coisas que nos interessavam. Se as constelações fossem batizadas no século 20, imagino que seriam geladeiras, bicicletas, cantores de rock e talvez até uma nuvem em forma de cogumelos. O céu é um espelho, um conjunto de esperanças, crenças e medos colocados pelo homem entre as estrelas, não se iluda garoto, o céu é tão absurdo... O que enxergamos pode ser uma ilusão, mas sempre um fotograma de um filme cósmico...
Outubro era um homem prático e matemático, que sabia muita coisa, inclusive sobre seu próprio isolamento e insólita solidão. Também era retrato do vazio, do nada, como todas as coisas deste vasto rincão cheio de estrelas e grandes vazios - como um fractal de nadas absoluto. Gostava de alecrim, tomilho, carne de peixe e, naquela cozinha cujo fogão era apenas um buraco no chão, ele fazia tudo à moda caçador – assados envoltos no barro. Comemos milho verde até umas horas.
Muitos anos se passaram e a natureza forjou Outubro para o primitivo. Tinha barba longa por todo o corpo, olhos negros brilhantes como de uma fera. A voz mudou, ele desenvolveu um grito primal e esqueceu o gosto da civilização. Trouxe à tona fósseis que haviam desaparecido do homem, ele já era quase bicho.
A região onde morava Outubro foi devastada como a floresta de Tunguska, na Sibéria. Não ficou uma única árvore viva no raio de um quilômetro. O chão virou uma massa escura, flores derreteram, bugios e tucanos morreram todos. Ele desapareceu depois do grito terrÃvel que ecoou por toda a região na madrugada. Foi um berro de proporções cósmicas, como nunca se ouviu. Feriu nossos tÃmpanos e todos que moravam próximos à casa do velho Outubro, sangraram pelos ouvidos até o dia amanhecer.
Procurei por entre os vestÃgios da destruição algo que pudesse lembrar o velho e só achei um dos seus poemas que era assim...
Este meu arsenal de emoções ronda pelos três milhões de anos. Antes disso, já comia antepassados de pia-vovó pelas estepes africanas. Na orvalhada da consciência admirava perpétua-roxa em cavernas petrificadas. Sou cinza da alquimia do Cosmos e matéria estelar que colhe a luz do Sol. Em duras sendas vi os átomos que formam toda a matéria e as forças que moldam este mundo e outros. (baixar arquivo completo).
Outubro fez a viagem que todos queremos. Uma viagem em sà mesmo, através dos tempos, do cosmos, da humanidade...
Só Arlindo pra me levar tão longe.
Parabéns meu amigo!!!
????Seria outubro,
um Rangel Castilho?
Obrigado poeta.
Por que não?
Me enraizo no barro desse Mar de Xaraiés, bebo da seiva do mandovi,
queria ser aroeira, carandá, só consigo ser rastro, sombra de cordilheira...
pantanal do sul
... acho que o pantanal inventou voce pra explicar melhor pras pessoas o que é ser pantanal!
... por aÃ!
saudações
Você pode não acreditar, meu amigo.
Mas, eu estive lá, com Outubro. Bebi à gua daquelas cabaças.
Eu tinha 07 anos, andava descalço e meu pé tinha a sola tão grossa,
que quando pisava um espinho ele ( o espinho ) quebrava e meu pé
continuava ileso.
Eu andava nú . (não só eu ) Mas todos os meninos até 08 ou nove anos de idade,com o pinto de fora.
Quando vinham pessoas da cidade, ficavam nos olhando e dando risadas ( nós eramos o espetáculo ) o motivo de deboche.
Só que hoje sei o canto dos pássaros melhor que essas pessoas.
Inclusive, eu sou um pássaro que canta, mesmo aqui desta gaiola de cimento.
Seu conto, não me fez pensar só nisso.
Pensei no " Adimirável Mundo Novo ".
Caro Firmiano
Talvez isso tenha moldado vc pra poeta!
donde aconteceu tal evento?
Não tá abrindo no meu computador!!! Vou ver se consego depois em casa...
Adorei até onde consegui ler... já te falei que adoro seus textos Arlindo?
Abraços!
Saudações Ana!
Tente fazer um download (baixe o arquivo para o seu pc).
Eu estava lendo uma poesia da pipoca - faz 5 minutos.
(risos) e vc aparece por aqui!!!!
Grato Ana.
Sim... eu baixei (os três últimos contos seus...) mas o word não abre, nenhum! Vou tentar de outro computador depois...
Abraços!
Salve salve!
Bia, gracias por gostar do Outubro...(logo logo vc vai conhecer a história de Deus, um sujeito diferente. O nome era Deusdemiro).
Ana,
O senhor Firmiano tb. teve problemas para abrir o arquivo.Vou verificar porque só consigo "baixar" - tem um programa Codec e as vezes faltam extensões... coisas desse tipo.
Agradecido!
Arlindo,
Me desculpe a demora na resposta sobre onde nasci (onde aconteceu tal evento) Estou preparando um texto sobrê.
O local se chamava Lagôa do Dr Afrânio, fica depois de Capinópolis
a beira do rio Tijuco.
parabens mesmo, gostei muito. Um estilo de escrever que gosto, livre, acho. Muito bom.
Sempre escreva!
Salve
Firmiano, estou esperando... (esse lugar deve ser bem longe!).
West,
Bacana seu comentário. Gostei mesmo. Tenho uma coleção de contos aà no overmundo.Se quiser pode dar uma olhada.
saudações pantaneiras do sul
Cara! Quanta saudade... não te dou notÃcias, mas não te esqueço! Afinal moramos, todos, numa laranja azul pregada na eternidade onde procuramos beleza na desordem de Deus. Risos
Adoro tua forma de escrever, ratifico. Fico impressionada como consegues superar, sempre, as expectativas. Nota 1.000, eu te dou!
Mesmo distante e, aparentemente ausente, eu te carrego na alma.
Muita Luz.
Cheiros
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