A qualquer hora, que se saÃsse para as ruas da velha e tradicional Caçapava, se podia ver Pedrinho, O Louco.
Era andarilho e permanecia nas ruas da cidade sempre descalço e vestindo roupas menores que seu corpo. As calças mal batiam nas suas canelas, as camisas e casacos eram muito curtos e as mangas apertadas. O que lhe conferia um ar de menino, caricatura de um homem velho com restos de criança.
Carregava sempre uma latinha, que lhe servia de copo e onde recebia café, leite ou água por onde passava.
As pessoas da cidade pareciam ter muito claro que aquela criatura era uma espécie de “patrimônio públicoâ€, que pertencia a todos.
E era assim então que Pedrinho sobrevivia, não era raro vê-lo com fartos pratos de boa comida ou frutas e podia-se perceber claramente que não lhe faltava o alimento de cada dia.
Pedrinho andava pela rua como um menino e brincava com um brinquedo comum aos meninos daquele lugar. Brincava de “gadinho de ossoâ€, andando pela rua a puxar uma corda fina amarrada a ossos, que representavam bois, cavalos, vacas, ovelhas e burricos e que formavam um sistema de relações significativas naquele mundo tão somente seu.
Pedrinho tinha uma grande interrogação. Passava seus dias a fazer uma só pergunta, embora quase nunca falasse, ele perguntava insistentemente.
- Você viu uma Maria por ai? Você viu uma Maria por ai?
As pessoas desejavam saber mais, decifrar aquele enigma, afinal de que Maria, Pedrinho perguntava?
Quando lhe respondiam que não tinham visto a Maria, ele choramingava como uma criança e ia andando murmurando.
- Você viu uma Maria por ai? Você viu uma Maria por ai?
Certa manhã, depois de uma noite fria e comum naquele pampa, Pedrinho foi encontrado muito doente e encolhido num cantinho da Rodoviária onde permanecia a maior parte de seu tempo. Foi recolhido para um dos hospitais da cidade e morreu.
A cidade vestiu luto. As pessoas sentiriam sua falta.
E para homenageá-lo mandaram fazer um grande quadro com um bonito retrato e o penduraram na parede do “Meu Cantinhoâ€, um barzinho na rua principal da cidade.
Hoje ao passar por lá, podemos ver a imagem do menino velho de olhar perdido e sorriso enigmático. E ainda desejar compreender os sentimentos que despertava em todos nós.
Entender finalmente o que aconteceu com Pedrinho.
O que lhe causava aquele alheamento? Sua mente dividida. Seu precário contato com a realidade. Seus sintomas, que assinalavam uma deteriorização progressiva na sua personalidade.
O andar constante por um caminho sem destino e sem fim.
Seu mundo excessivamente determinado por um sentimento que o levava na busca infinita de uma Maria perdida e declaradamente amada.
- Você viu uma Maria por ai ? ? ?
Pedrinho era um doente mental, porém por seu abandono tornou-se um "personagem" que marcou a infância de várias gerações no lugar onde viveu. O texto reproduz apenas a visão romântica da autora e seu fascÃnio pela subjetividade das personalidades mais complexas.
Uma descrição demasiadamente humana. Parabens por trazer esse "personagem" mais para perto de nós. Aguardando votação. Bjos
graça grauna · Recife, PE 11/1/2009 07:41
Graça, bom dia!
Você transformou meu domingo num lindo dia!
Pedrinho era sem dúvida um ser humano demasiadamente humano, que emocionava áqueles que podiam ver isto.
Muito grata, querida. Bjos
É Maria Lúcia, seu texto muito bonito e humano presta homenagem ao desamparo eà alienação mental que faz sofrer. É uma história real, que parece ficção.
Abração, Ivette G M
Sabe Ivete, a cada vez que leio o texto nem preciso fechar os olhos para rever mentalmente a figura tão querida do Pedrinho.
É incrÃvel como algumas figuras marcam nossas vidas. A mim particularmente estas criaturas sempre despertavam minha atenção e curiosidade.
Grata por teu comentário, gostei muito.
Um abraço
Meu falecido tio - " o Chadid" - me contava essas histórias de Caçapava.
Em homenagem a nossa MARIA LÚCIA, conto aqui uma piada sobre Caçapava do Sul , cidade muito fria no inverno.
Aos visitantes diziam:
- "Caçapava do Sul -cidade de duas estações" ...
O interlocutor se precipitava e respondia à provocação:
-ah, sim : inverno e verão !!!!
E aà vinha o golpe de misericórdia :
- Não ! - Inverno e Rodoviária ...
Nossa querida MARIA LÚCIA chega para agregar trabalhos ao gênero do nosso mui caro RAPHAEL REYS , exaltando regioalismo e figuras marcantes das comunas .
Show de bola !!
Salve, Maria Lucia!
Maravilhoso texto, como deveria ser.
Parabéns!
Abraço Pantaneiro.
São almas em missão de renuncia nesse mundo de doidos!Aqui na minha cidade, por ser polo comercial, hospitalar e educacional crescà vendo os tantos Pedrinhos que as cidades vizinhas desovavam nas nossas ruas. Havia até escravos já centenários a andar pelas ruas chupando bico de criança. Muitos fizeram histórias de tragédias e comédias! Beleza o seu postado cara overmina! Um abraço!
raphaelreys · Montes Claros, MG 12/1/2009 06:18
Salve Rangel,
Se vc diz meu grande poeta, creia, eu acredito!
Afinal, você foi meu primeiro crÃtico e incentivador.
Um abraço forte
Olá Raphael Reys,
Pois é, minha cidade era "abençoada" neste aspecto, são inúmeras
as criaturas que perambulavam por ali e eu sempre estive de olho nelas!!!
Meu quase conterrâneo Ivan Cézar de São Sepé. . . acha que tenho teu estilo para escrever, embora não conheça teu trabalho literário, parece que temos algo em comum.
Grata por teu comentário.
Abraço
CarissÃmo conterrâneo Ivan Cézar,
Gostei da piada, realmente um inverno danado de frio e uma Rodoviária daquelas, ninguém merece... mas melhorou um pouquinho!!
Pelo jeito vamos trocar muitas figurinhas e contar causos das nossas frias cidades, agora tão distantes de mim.
Saudade enorme do Rio Grande do Sul!! Mas continuo tomando meu chimarrão por aqui.
Grata e não esqueça de voltar para votar.
Abração
Maria Lúcia, muito linda e comovente a tua história. Fiquei me lembrando de algumas pessoas assim como o Pedrinho, pessoas que conheci na minha infância e que ficaram para sempre em minha memória.
bjs
Bom dia Sandra,
Pois é, todos nós temos uma "figurinha" destas em nossas vidas, eu tenho uma galeria e aos poucos vou mostrando para todos do overmundo e tomara mais além.
Grata e venha votar, por favor.
Abraço
Rangel.
é uma "bonzura" ter você assim por perto acompanhando meu trabalho. . . abraço!
Voltei para votar este texto tão sensÃvel.
Ivette G M
Querida Malu,
Finalmente nos presenteia com seus tesouros. Sua narrativa é emocionante, crônicas que gostarÃamos de ler todo dia, nos jornais.
O ser diferente é incompreendido. Alienado da realidade, nos toca porque é humano. Sabemos quão tênue é a linha que nos separa da lucidez. Andamos tantas vezes por aÃ, arrastando nossos ossinhos. Pena que ninguém nos vê.
Acho que Pedro foi feliz. Ao menos, foi amado.
Beijos, querida!
Cris muito querida,
Você e sua sensibilidade me são muito caras.
Pois é, acho que Pedrinho era feliz mesmo, me lembro dele sorrindo e andando pelas ruas da cidade, pelo menos acho que não sabia de sua infelicidade diante de um mundo tão exigente e cruel.
Além disto querida, a felicidade mora dentro de cada um de nós, vamos colocar prá fora neste 2009?
Te quero muito, muito bem. Um grande beijo
Muito bom e emocionante!
beijos poéticos,
Maria Lúcia,
Grato por essa remembrança pontilhada de Ãmpar criatividade
[O que lhe conferia um ar de menino, caricatura de um homem velho com restos de criança.]
Olá Nina,
Mui grata.
Beijos prá vc também.
Boa noite Adroaldo,
Maravilha seu comentário, fiquei muito contente.
Obrigada.
Olha,sem "puxar brasa pro meu assado",mas você é uma Titia muuuuito talentosa.
Fazer com que o leitor viaje por uma época,levá-lo a imaginar as cores,os cheiros e as personagens de uma narrativa,é coisa para poucos.
Parabéns,MINHA Tia Malú!!!!
Textos como esse nos fazem perguntar: quem são os verdadeios loucos?
um texto maravilhoso, parabéns.votado.
O NOVO POETA.(W.Marques). · Franca, SP 17/1/2009 14:00
As cidades pequenas sempre têm os seus Pedrinhos. A nossa também tinha, lembra? E eram muitos. Miguelzinho, Zé Grande, Lilinda, Catucha(era esse o apelido dela ou era parecido e a Edvirges, que uma vez, enquanto viajávamos, entrou em nossa casa e fez uma faxina das grandes, num acesso de loucura. Ela colocou todos os móveis pra fora da casa, sozinha. Quando chegamos, lembro que o pai nos fez esperar dentro do carro, porque não sabia como ela reagiria. Ela o cumprimentou, muito alegre, acabou de arrumar os móveis dentro da casa e saiu, sem esperar pelo pagamento.
Isso eu nunca tinha visto, em toda minha vida! Mas que vi muita coisa parecida por lá...isso eu confesso que vi! hahahahaha!
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