"...Como eu disse, ele havia se tornado um homem difÃcil. Antes ele era disciplinado e correto, sempre vestido impecávelmente com seu terno preto e bengala com pomo de bronze. Mas com a doença, havia mudado muito. Não vestia mais seus ternos, e andava em casa com seus pijamas, ou usando alguma roupa velha qualquer. Era um homem culto, e nunca perdeu este hábito, mas sua biblioteca não tinha mais a velha organização de antes. Seus livros se espalhavam abertos sobre a mesa de leitura, suas páginas manchadas aqui e ali por respingos de diversas bebidas ou cinzas de cigarros. Já andava com alguma dificuldade, mas mesmo assim insistia em fazer seus passeios sozinho pelo parque próximo à sua casa. Certa vez caiu enquanto andava no parque e, para agravar sua situação, quebrou a perna. Aqueles foram dias difÃceis, mas confesso que viajar para Santa Bárbara para cuidar de meu pai me distraÃa um pouco das coisas de São Paulo e de minha própria casa. Não acho que sua avó sentia minha falta nas minhas longas ausências motivadas pelos cuidados com meu pai. Seu bisavô, por outro lado, parecia feliz em me ver. Conversávamos um bocado, mas raramente sobre coisas pessoais. Não me sentia muito à vontade com ele, mesmo agora que ele deixara de ser o homem rÃspido que havia me educado. Sentia-me responsável por ele e tentava zelar por sua saúde e bem estar, e os seus crescentes excessos me preocupavam. Mesmo doente, ele bebia um bocado – sempre bebidas caras, importadas, sofisticadas – e fumava sem parar. Quando os médicos o admoestaram que isso apenas piorava seu estado de saúde e abreviava ainda mais sua vida, era frequentemente grosseiro com eles."
Este é um trecho de meu novo conto, chamado Transgressão.
Depois de muito tempo sem escrever um conto novo que se prezasse, este me surgiu durante um almoço de famÃlia, enquanto conversava com minhas tias avós. Alguns de seus temas já me assombravam, querendo sair e virar narrativa, há algum tempo -- certo e errado, egoÃsmo e liberdade, a loucura e as mágoas familiares e, sobretudo, a imperfeição e as contradições do ser humano real. Saiu tudo em um jorro enquanto eu o escrevia, e me sinto leve e limpo agora.
Há mais um conto no forno, mas não há mais tanta pressa e angústia em terminá-lo. Agora que comecei, as histórias começam novamente a fluir.
É com esta alegria que partilho com vocês este conto, que não é perfeito nem correto, mas é muito humano.
Para ler o conto na Ãntegra, clique no botão de DOWNLOAD para baixar o arquivo .DOC de Transgressão.
* a foto utilizada para ilustrar o conto foi remixada a partir da foto BLOW, publicada por =hellfirediva no DeviantART.
Ainda estou escolhendo uma imagem para colocar ali em cima. Não tenho nada que se preste à função nos meus arquivos, então me resta procurar em flickrs e deviantarts da vida... e tentar achar alguma coisa que não seja (C).
Ainda bem que o Creative Commons existe para nos socorrer nestas horas... :D
Abraços do Verde.
legal o texto, duende. li muito rapidamente, hoje de madrugada, mas gostei.
abs.
Que bom que gostou, Marcos. :D
Abração do Verde.
Eu li ontem você sabe, e no começo achei que sria diferente, mas no fim eu acabei gostando assim mesmo.. lindo
Marcela Fells · Belo Horizonte, MG 3/2/2007 14:43
Hey dona Manga... valeu pelo comentário, e pelos elogios. :D
'Cê sabe que curto um tantão os negocim que você escreve também, né fia? :D
Abração do Verde estrangeiro :D
Caramba! 'calma e elegância...' de cara, a foto: putz...muito boa!!!
agora o conto: tu escreves bem pra caramba, heim? é um conto que 'prega' o leitor. me enrolei um pouco no parentesco.. e recomecei; daÃ, atenção total. quero baixar todo o conto pra ler as entrelinhas.
Hey Francinne.... muito obrigado pelos elogios. :D
Que bom que gostou. Este conto é importante para mim, pois trata-se de algo que ao menos parece ser o inÃcio de uma nova fase produtiva. O estilo e a temática são diferentes dos meus escritor anteriores, e embora sinta-me completamente seguro com este, sempre dá um frio na barriga quando a gente começa uma coisa nova, né?
Baixe o conto sim. Ele tem muitas entrelinhas, e ontem mesmo, relendo-o pela 4a vez, encontrei mais algumas que nem mesmo eu sabia. Os personagens me contam segredos de vez em quando.
Para certos olhares, há entrelinhas perturbadoras no final...
Abraços do Verde.
E eu sei que os parentescos são bem complicados no conto. Não é completamente despropositado. A idéia de fazer com quem pai-filho-neto virem um continuum, como um fluxo humano único, estava em minha cabeça enquanto escrevia...
Abraços apertados do Verde.
Uma amiga havia me apontado alguns erros ortográficos e de digitação no texto. Já estão corrigidos agora.
Desculpem os tropeços. Foi, como eu disse, um conto que foi escrito, revisado e publicado em um espaço de menos de 4 horas. :D
Abraços do Verde.
Ooops... o "impecavelmente" ficou acentuado no post, mas no texto está corrigido.
abraços do verde.
Vim ler tua "Trangressão" e concluo: estou apaixonada pelo avô da LetÃcia! em tempo: não me enrolei na "sarabanda parental", ao contrário, adorei ficar linkando pensamento e palavra prá pescar quem era quem, quase chorei quando ele comprou o casaco de couro e chorei quando avô e bisavô choraram abraçados. Não foi leitura. Era alguém falando comigo e contando as coisas com uma fluidez delicada e ao mesmo tempo real. Tua verve é saborosa. quero mais! Salve Duende !
cris gonzalez · Rio de Janeiro, RJ 5/2/2007 14:57
Puxa Cris.... que bom que gostou!
Fico emocionado quando as pessoas se emocionam com meus escritos. Ainda mais com este, que além de ter vindo bem de dentro é também a inauguração de uma nova fase de escritos para mim. Seus elogios vão não apenas para meu conto, e para a história que tentei contar, mas para meu novo momento. Isso me emociona um bocado, cara!
Um GRANDE abraço!
E se quiserdes ler mais, há alguns contos mais antigos também publicados no Overmundo.
* Reflexões sobre o fio de uma faca (um conto sobre amor, amor próprio, solidão e busca).
* A moça acenando à janela (um conto surgido de uma imagem, que serviu de catalizador para uma narrativa esperançosa sobre queda e reerguimento)
* Na SaÃda (um conto sobre ir embora)
* Melhores Venenos (um conto bem antigo sobre vÃcios e hábitos, e necessidades humanas...)
Leia-os se tiver curiosidade.
E mais uma vez, MUITO OBRIGADO pelos elogios. :D
Abraços apertados do Verde.
Muito bom, acho que antes da fumaça ja estava viajando com eles...
Camafunga · Pelotas, RS 5/2/2007 15:30
Sim... é uma viagem por uma história evolutiva pessoal... :)
Abraços do Verde, e obrigado pelos elogios.
Linkarei célere não só curiosa, mas encantada!
Abraço igualmente apertados.
Boa viagem, companheira. :D
Abraços do Verde.
gostei muito do seu conto... o tom é muito bom, muito honesto. dava para sentÃ-la escrita de próprio. de grande leveza para falar de tantas dificuldades inerentes ao convÃvio humano. mas gostei sobretudo porque me pareceu desde o começo ser uma carta, e eu adoro cartas. não por um romantismo, mas pela eficiência que elas podem ter em transmitir o que somos.... um texto meu que não chegou a ser publicado começa justamente com uma carta... na verdade todos os seus fragmentos são uma grande carta.
e sim... a "coisa do parentesco" é ótima, mostra como estamos todos, na verdade, t˜åo misturados uns com os outros nos nossos sentimentos e como podemos estar em posições diferentes tantas vezes. ótimo.
apenas o parágrafo final é que eu achei que poderia ser suprimido, talvez porque ali descobri que não era uma carta... senti como algo a mais num texto que já estava completo e bom. no mais, cativante.
grande abraço, meu amigo.
Olá meu colega Toinho. Recebo com muita alegria seus elogios e de coração aberto sua crÃtica. E agradeço por ambos.
Mas um conto é como um filho e, seja ele como for, a gente gosta dele com um amor de pai. E como o pai que aprecia seu filho como é, aprecio este conto com seu final, que faz parte dele, que é parte do que ele era ao nascer de mim. Entendo contudo que uma vez escrito -- assim como o filho criado -- o conto pertence ao mundo, e irá tocar outros corações que não o de seu pai. E é assim, nas relações, tudo se muda. Entendo contudo que gostes dele sem seu final, e aceito que o leias assim, sem o final. Deixe para lá meu final, se assim preferes. Hey de entender com a sabedoria difÃcil de pai que esta é a tua relação com ele. Mas entendas e permita, por favor, que eu goste do final do conto também. É o que peço, encarecido. :)
Abraços apertados do Verde.
meu querido... gostei muito da sua resposta!! e fico feliz com ela, porque acredito muito nisso também. acho que obras de artes são mesmo como filhos ou amigos ou amores. fiquei feliz por você defender seu final com alegria e força.
seu conto me cativou e talvez um dia eu chegue até aquele parágrafo e me encontre nele também, porque o mundo está aberto, não é mesmo?!
gostaria muito que você pudesse ler outros textos meus e desse sua sincera opinião... precisamos muito ouvir o outro.
forte abraço,
toinho
Caro Duende.
Gostei do conto muito legal de uma leveza pura. Uma passagem do texto que me deixou meio há ver navios foi quando deixou de fazer a narrativa e passou a escrever em 1º pessoa você já participando da história, foi meio bruto. Logo, voltou a leveza.
Toinho, meu caro, fico feliz que tenhas gostado da resposta. :)
Tenho mesmo um carinho paternal com minha obra, mesmo que tente como posso não ser por isso cego a suas falhas. Fico portanto muito tocado que meu conto tenha te cativado.
Prometo ler seus textos em breve. Só tenho que, antes disso, dar uma vista de olhos em todos os outros textos que comentei (minha caixa de entrada do Gmail está com uma lista enorme de coisas que não olhei anteontem e ontem) e publicar algumas coisas que tinha programadas.
E você, meu caro Higor, fico também feliz que você tenha gostado. Achei interessante que tenhas achado o conto dotado de "leveza pura", embora ache que entenda seu ponto. Não estou certo de que tenha entendido a que trecho exatamente você se refere. Poderia citá-lo para mim?
Um grande abraço do verde a todos :D
licença, minutinho só:
menino verde: vá já ler seus e mails! que coisa, sô...
Visto e respondido, carÃssima Cris. :D
Até o final do dia, haverá mais coisa publicada.
Muito obrigado pela atenção, pelo prestÃgio e pelo carinho.
Abraços apertados do Verde.
Excelente o conto Daniel! Fui totalmente emaranhado na teia dos personagens, na confusão de pai, avô, bisavô. Muito bom o recurso de ruptura das vozes narrativas, o efeito é devastador. Parabéns...
Pedro Vianna · Belém, PA 19/2/2007 19:31
Sinto-me muito honrado com seus elogios e consideração, bem como comos elogios e consideração de tantos outros colegas que se manifestaram tão positivamente sobre meu conto por aqui. É com este estÃmulo, e com todo o alimento literário que consumo, adicionados da gasolina da vida, que alimento a fornalha onde forjo novos escritos. Tais combustÃveis se fazem particularmente preciosos nestes dias em que volto a escrever. Brindarei a todos, humildemente e em breve, com mais alguns novos escritos (como antecipei em meu blog).
Abraços apertados do Verde.
uma pequena correção. na segunda linha, quis dizer "...como os elogios...", mas uma inexplicável fome de letras após o jantar me fez comer um pequeno pedaço da frase. :D
Daniel Duende · BrasÃlia, DF 19/2/2007 19:52
Daniel,
Dos personagens ficou uma suave familiaridade.
E as surpresas Ãam-se desencandeando narração a dentro como um mergulho no imprevisÃvel de todos ali, e de mim mesma.
Mesclando a narrativa com a minha própria história.
De inicio pensei que que´eram apenas pai e filho, e de repente tudo já estava mergulhado num mar de emoções de outras presenças, mesmo aos ausentes foi dada a oportunidade de emergir e ficar lá, fazendo parte do mesmo mar de lembranças
No último paragráfo, todos os personagens estavam mergulhados em novas transgressões.
Não tenho nenhuma palavra a mais para acrescentar, as da narrativa ainda estão imersas no meu mar de sentimentos.
Para ti, um (a)braço de mar.
Dora... minha doce e fiel leitora Dora...
Nem tenho palavras para agradecer o carinho que tens aos meus escritos. Nem tenho palavras também, para me desculpar por tanta demora para responder. Meus últimos dias foram o caos de trabalhos e coisas a fazer...
Fico feliz que tenhas se identificado tanto pelas personagens, com a história, com os sentimentos que bóiam no doce mar de liberdade que vira transgressão aos olhos daqueles que pensam que não se pode fazer o que se tem que fazer.
A vida é feita de se tomar liberdades. Quem não se liberta, é prisioneiro e só.
Beijo do Verde.
Que bom que gostou, Andressa. Fico feliz com seu elogio.
Abraços do Verde.
A sugestão está anotada, Dora.
Abraços do Verde.
Teu conto foi uma das mais poderosas experiências literárias que tive nos ultimos tempos. Talvez por me identificar MUITO como o avo/pai/filho ou ainda por estar vendo pessoas ao meu redor terem a mesma atitude do cara. De qualquer forma, você derramaos sentimentos e mistura as noções de tempo, espaço e relacionamentos com maestria. Meus parabés, e estou indo agora mesmo ler seus outros contos
ThiagoIsaac · João Pessoa, PB 21/6/2007 09:02
Puxa, Thiago... muito obrigado pelos seus elogios! Fico muito feliz -- mesmo! -- cada vez que alguém diz que gosta do que eu escrevo. Ao ler elogios rasgados e emocionados como estes, então, eu fico até sem saber o que dizer.
Espero que goste de meus outros escritos, e se quiser acompanhar o que ando fazendo ultimamente, dá uma chegada em meu blogue O Caderno do Cluracão.
Em breve, quando tiver uma folga das correrias de trabalho, devo publicar algumas coisas novas por aqui.
Abraços apertados do Verde.
Viu, que não sou só eu a rasgar-te elogios emocionados?
Tem hora que é foda amigo,
não dá nem pra dizer de verdade o que se passa...
As palavras, e tão permeadas de emoção...
Até hoje ainda choro e no final, sorrio nestas Transgressão
Obrigado, Dora! Eu fico muito emocionado quando me elogiam os escritos.
Mal vejo a hora em que terei novamente tempo e paz para escrever...
Beijo do Verde.
Duende,
só hj achei sua transgressão nete overmundo.
E confesso que viajei nas suas histórias e narração cheia
de segredos sobre quem era quem.
Gostei demais. Principalmente dos rencontros. Do avô com o Bisavô, do Avô consigo mesmo.
parabéns!
Será que quando buscamos nossa felicidade somos sempre egoÃstas?
não sei, mas vou levar esta pergunta comigo.
Abraços!
Alô, Daniel!
Trate de tirar o outro conto do forno e nos servir.
Se for tão saboroso quanto este, terá minha aprovação.
Um abraço.
Olá pessoal.
Estou voltando ao Overmundo na medida do que meu tempo me permite. Em breve publicarei mais contos. Por hora estou me concentrando em enriquecer o Guia Overmundo com algumas dicas legais de BrasÃlia.
Abraços do Verde.
Excelente, Daniel! Seria ótimo se textos assim fossem lidos com mais frequencia. Bom trabalho!
Georges Kirsteller · São Paulo, SP 26/1/2008 11:55
Muito obrigado pelos elogios, Georges. :)
Estou sempre pensando em voltar a publicar no Overmundo, mas ultimamente mal tenho tempo para escrever, quiçá para publicar =/
Mas vamos ver onde a vida me leva.
Obrigado novamente.
Abraços do Verde.
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