TRÊS ONÇAS

web
1
raphaelreys · Montes Claros, MG
3/1/2016 · 0 · 0
 

Amostra do texto

TRÊS ONÇAS

Raphael Reys

Dizem os supersticiosos que o mês de abril é o mês da mentira, chuva trespassada, sol a pino. Pareceu-me ser mês do viço dos caçadores de onça. Neófitos garbosos tomadores de cachaça. Vão para a mata nos fins de semana e quando voltam alardeiam as suas proezas em sempre aumentando.
Juvenal, notório caçador de fins de semana, relatou uma estória em empreitada que o apanhou desarmado. Transitava em direção ao curral com o bridão em mãos onde selaria um bom cavalo alazão ao passar em baixo de uma gameleira caíram folhas secas em sua cabeça.
Assustado, pois não ventava em Salinas naquela tarde, olhou para cima e o que viu o deixou estupefato, num misto de medo e de excitação. Atravessada em um galho da gameleira e a observá-lo atentamente, os dois grandes olhos de uma fera pintalgada. O notório defensor, como é temente das coisas de Deus fez em voz baixa a citação do salmo 97 do Livro de David.
Continuou o seu percurso rumo ao seu objetivo projetado com as pernas bambas, pois nessa ocasião, não portava sequer um simples canivete Corneta para se defender. O passo trôpego, como exigia a ocasião aterradora, andou em linha até à curralama. A onça, uma Maçaroca cara de velha, confiante na sua superioridade em força, destreza e velocidade de ataque, continuou andando do outro lado da cerca.
Sempre emparelhada com o nosso advogado caçador. Mais parecia gozar do desespero da sua possível e quase certa vítima. A mão de Deus, entretanto, estava do lado do defensor. Logo à frente, um leitãozinho passou correndo cruzando a frente. Premida seletivamente pela lógica racional do melhor sabor, a maçaroca deu o pulo. Abocanhou o pequeno quadrúpede e gramou o beco para a mata onde, decerto, fez uma lauta e deliciosa refeição tupiniquim…
Já o Chaplin Ourives, que tem sala no mesmo quarteirão, relata ter estado em uma caçada de onça na localidade denominada Boqueirão. Fez a sua espera, arriou a matula, cobriu tudo com folhas verdes camuflando a toca da espera. Bastante cansado, relaxou para tomar um gole da branquinha.
No local da armação, um pequeno jumento estava previamente amarado a uma árvore pelos pés, por grossa cora em cima de um fosso, onde a pintada decerto cairia após dar o pulo, na isca. Apurou os sentidos e, de súbito, uma onça das grandes deu um esturro tão alto que mais parecia cardam rompidos de caixa de Opala. O jumento deu um gemido de dar dó e verteu água pernas abaixo antevendo morte próxima.
A fera, como no relato anterior e sob a égide da coincidência, preferiu abocanhar o jumento deixando. Este que é cobra mais do que criada em caçadas de animais de grande porte, ficou na dele. Deixou a fera dar o bote no jumento, o que foi feito fora do buraco que servia de armadilha.
Quando a desalmada deu a primeira abocanhada na coxa do jumento Pega, arrancando, assim, um bom naco de carne vermelha foi que Chaplin fez o primeiro disparo. Usando, para a ocasião espingarda cartucheira mocha 16. Com o impacto produzido pelo disparo, a onça veio no rastro da pólvora em cima do atirador.
Ele que não é nada besta, deu o segundo disparo. Dessa vez bem no meio da testa da caça. A bicha (do mato) rolou, deu saltos, se ajumentou na casca de uma árvore e arrancou cavaco para todo lado.
Tibo, ilustre fiscal de rendas da nossa urbe, estava no exercício pleno do gozo de férias em sua cidade natal, Guanambi (BA). Cartucheira a tiracolo em uma caçada no Morro Vermelho. Foi quando ocorreu um fenômeno extra-sensorial.
Farta munição, cantil de água, meiota de cachaça, embornal com farofa de galinha caipira. Como companheiro o seu fiel cão de caça, o Fenômeno, exímio batedor de pegadas. Logo deu sinal de dois rastos que parecia ser uma onça maçaroca erada e uma cria. A chapada tem os seus mistérios seus causos, suas assombrações.
O caipora das matas estava na área e resolveu pregar uma peça no caçador maldoso e tomador de fubúias. O Fenômeno acuou as duas onças no galho de um mulungu. Tibo de arma apontada enquadrou a jugular da felina entre a alça e a massa de mira, quando ouviu o choro do cachorro. Acreditem se quiserem.
A maçaroca levantou a pata direita, apontou a destra para caçador e, pasmem. Vociferou entre dentes:
Você não tem vergonha mesmo, não é Tibo - Em outras férias já mataste as minhas duas irmãs e agora queres matar a mim e deixar a minha filha órfã?
Nosso herói gramou o beco pela chapada se fazendo acompanhar na carreira, pelo seu fiel cão farejador. Com o coração a sair pela boca, arriou a arma no chão, sentou-se na areia e apoiou as costas em uma árvore. O cachorro Fenômeno fez à mesma coisa. Passados alguns instantes e estando os dois ainda ofegantes, o cão olhou para Tibo e falou:
Êita Tibo - Eu nunca tinha visto onça falar- Foi à primeira vez...
Foi à segunda carreira de Tibo naquela tarde.
De outra feita, o mesmo cão farejador, já chegado à idade e estando banguela, acompanhou o seu dono numa caçada de tatu canastra. Acuou o bicho numa moita e partiu para fazer o serviço final. Tibo, de arma em riste esperava o tatu passar correndo, fugindo do seu cão, para efetuar o disparo.
Não demorou e escutou risadas vindas de dentro da touceira. Foi ver de que se tratava e o seu cão por não ter mais dentes para agarrar o tatu pela borda do casco. O virou de barriga para cima com o focinho e fazia cócegas na barriga do bichinho. O dito estava para morrer de rir...


Sobre a obra

Caçadores de onças.

compartilhe



informaes

Autoria
raphaelreys
Downloads
149 downloads

comentrios feed

+ comentar

Para comentar é preciso estar logado no site. Faa primeiro seu login ou registre-se no Overmundo, e adicione seus comentários em seguida.

baixar
rtf, 42 Kb

veja também

filtro por estado

busca por tag

revista overmundo

Voc conhece a Revista Overmundo? Baixe j no seu iPad ou em formato PDF -- grtis!

+conhea agora

overmixter

feed

No Overmixter voc encontra samples, vocais e remixes em licenas livres. Confira os mais votados, ou envie seu prprio remix!

+conhea o overmixter

 

Creative Commons

alguns direitos reservados