Rua do Jogo da Bola

"Dona Verônica e Seu Carlos, ambos há pelo menos 40 anos no bairro, contam histórias divergentes sobre a origem do nome da Rua do Jogo da Bola, o ponto comum fica por conta da obviedade da expressão. Dona Verônica, no entanto, traduz que a rua recebeu este nome porque os escravos, acorrentados, jogavam bola com as esferas de metal que lhes serviam de peso às pernas. Embora menos factível, esta interpretação nos lega um passado de sofrimento. Já na explanação do senhor Carlos, os escravos subiam para o alto do morro para fugir dos capitães-do-mato, e poder jogar bola, ainda que não futebol, já que à época não existia algo parecido.

Seu relato, certamente também expressa o sofrimento a que eram submetidos os negros, tolhidos de sua liberdade, mas evidencia o caráter da vivacidade, da alegria e da malandragem, características marcantes do negro brasileiro, do futebol brasileiro, e do brasileiro, propriamente dito.

Hoje, envelhecidos, os moradores que contam a história não jogam mais bola. O jogo de bola ainda há na rua, entre os moradores mais jovens; mas Dona Mercedes, proprietária de um tradicional bar na esquina da Rua do Jogo da Bola e da Rua do Escorrega, patrocina um campeonato de botão,
para os mais antigos, com direito a troféu e medalhas."


---

Da mini-série Histórias da vida e da Saúde. O trecho é um extrato do trabalho homônimo.

Decidi iniciar esse série depois de muito pensar se valia a pena. O caráter anedótico me faz recear que seu lugar não seja no Overmundo, mas resolvi compartilhar algumas histórias – fruto de uma breve pesquisa de campo da época da faculdade – com os amigos. O objetivo não é muito mostrar o que acontece pelas redondezas hoje, nem apontar esse ou aquele pontão turístico, mas mostrar pequenos pontinhos que dão outra idéia dum pedaço tão pouco conhecido do Rio.

O trabalho de campo, não me furto a lembrar, foi idéia do Gabriel Varela, dono da máquina e de algumas dessas fotos, quiçá. Eu queria ir à Paquetá e ele queria o Morro da Conceição. Foi lá que acabamos, e eu não tenho muito do que reclamar.