Houve um tempo em que a coisa mais fina que se podia oferecer num jantar era Strogonoff com arroz à grega. Acompanhava Chateau Duvalier, o vinho “fino†oficial do momento. Com o passar do tempo, strogonoff virou comidinha trivial, com versões de carne moÃda e creme de leite de lata, e o arroz ganhou abomináveis complementos como milho verde, petit pois, batata palha e queijo ralado. Perdeu o posto nobre para outras iguarias, como o Filé à Francesa, o Bife à Parmeggiana e o Frango à Kiev que também esteve na crista da onda, sempre acompanhado de uma certa tensão na primeira facada, quando a manteiga jorrava, fervendo, direto para o vestido e para a camisa do freguês. Depois, o tal Supremo de Frango à Kiev ganhou recheio de Catupiry, mas nunca se comprovou a existência do tal requeijão da caixinha redonda na Rússia. Catupiry também é candidato a um dos primeiros lugares no modismo das cozinhas, como forma de dar status ao mais prosaico dos bolinhos de aipim.
E o coquetel de camarão? Servido em taças geladas, numa cama de alface picada e molho golf, também entrou em extinção junto com barquetes de salada de presunto e sacanagens, aperitivos montados no palito alternando rodelinhas de salsicha, azeitonas e queijo prato.
O que dizer das bebidas de moça, dos coquetéis dulcÃssimos, do Alexander, das Meias de Seda, do Xixi de Anjo, e do coquetel de frutas cheio de groselha? Depois foi a Piña Colada e o Kir, Royal ou plebeu, com muito licor de cassis. Entraram e saÃram da moda pra felicidade dos barmen.
Modismo na comida é um fenômeno internacional. O mundo assistiu ao boom do Frango Xadrez, do Sushi, do azeite extravirgem, da ciabata. O fondue é ainda hoje um clássico dos começos de namoro - no inverno, claro. Agora estamos no momento do triunvirato tomate seco/mussarela de búfala/rúcula. Virou comida tradicional, assim como a tequila é a bebida oficial da adolescência. Vida que segue. Mal posso esperar pelo declÃnio do vinho de garrafa azul.
* Esse texto, escrito por mim, foi publicado no Caderno H, suplemento do Jornal do Brasil, em 2004. Resisti à terrÃvel tentação de editá-lo, mas pensei em mil e uma alterações e acréscimos possÃveis. Vai pro blog como foi pra coluna GastronoRio, que eu escrevia na época. Eu tinha limite de palavras, linhas e colunas, coisa de jornal. Estamos em 2008, pleno reinado do temaki, do balcão de caipifrutas nas festas, das bebidas energéticas com gosto de bala derretida misturadas ao uÃsque (depois falam do uÃsque com guaraná, que também foi moda...). Nas festas servem mini-cumbucas de comidinhas de boteco, copinhos de caldinhos, wraps e cascatas de chocolate pra mergulhar frutas. As pastinhas de creme de leite misturado à sopa de cebola de pacote, comidas com biscoito Salclic, entraram em extinção. Os sanduÃches a metro saÃram um pouco da cena. Há linhaça por toda parte. O vinho rosé ficou chique de novo. Servem sucos de melancia com gengibre e abacaxi com hortelã nas festas. As tábuas de frios, patês e pastinhas e as cestas de pães continuam quebrando um belo galho nas socis e o queijo brie derretido com geleia de damasco continua mandando no rechaud do centro de mesa. Tá bão: para mim essa é uma delÃcia que não vai sair da moda, nunca!
E algum desses acepipes não é pura delÃcia?
A moda gastronômica é uma realidade e, como tal, há avanços, recuos, retiradas à francesa, à italiana, à brasileira, à mineira (ai, ai)...
Confesso que me deu água na boca!
Que maldade deliciosa!
beijos
pois é, menina! minha mae perguntou se eu queria algo especial no meu aniversario. eu pedi coquetel de camarao, aquele mesmo, nas taças cheias de gelo! adoro!
andrea dutra · Rio de Janeiro, RJ 3/6/2008 14:56
Andrea, voce tá tão bonita neste retrato envelhecido. Acho que também está na moda. Tenho visto tantos reatratos envelhecidos por ai.......
Mas, voltando um pouco. No meu Lugar João Pequeno, o agnóstico, (o primeiro que conheci e que fazia questão da identidade) ensinava, isto mesmo ensinava:
"Cultura: é comer e crer. Comer e acreditar" e completava o sabichão, "o resto é pinduricalho", como vivia às turras com o mundo intelectual de Gilbués, alfinetava "para os pernóstico, o resto é extensão cultural".
Tá vendo, beijos,
andre.
Bacana, divertido e informativo!!!!
Votado e aplaudido de pé, é claro!!!!
outra coisa que nao vejo como sair de moda nunca...arroz, feijão, ovo frito, farofa e salada de tomate...e se tiver um chouriço então, nossa...Tupiniquins we are, friend mine !!!rsrs...vatadÃssimo !!!...matéria execlente !!!
abs
joe
Andrea, que texto delicioso. Tão bom quanto o assunto. Li lembrando dos textos do Márcio Alemão. Como você é um dos poucos que vejo não arrotar arrogância gastronômica e discorrer como quem entende bem do que fala. Votado com gosto!
Abraço e vai repetindo as doses aÃ...
andre, terei envelhecido?
jair, valeu!
joe, concordo!
edson, que honra!
Querida Andrea:
Imagino que não conheça buchada de bode, mão de vaca, panelada, paçoca e outras delÃcias da cozinha piauiense. Estes opratos ainda vão virar moda no Sul maravilha, assim como o Sertão vai virar mar, e o vice ...versa (ou verseja?)
beijos e abraços
do Joca Oeiras, o anjo andarilho
valeu, Andreinha !!!...abraço !! ( mas...um salmãozinho tb é bom as vezes, né...rsrs)
joe_brazuca · São Paulo, SP 7/6/2008 18:31Para comentar é preciso estar logado no site. Faça primeiro seu login ou registre-se no Overmundo, e adicione seus comentários em seguida.
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