O roubo do silêncio é o último livro publicado pelo poeta, ensaÃsta e professor Marcos Siscar. Sua obra literária já faz parte da cena poética contemporânea e principia com “Não se diz†(Inimigo rumor, 1999), seguido por “Tome seu café e saia“ (Moby-Dick, 2002), reunidos posteriormente em “metade da arte†(7letras/Cosac & Naif, 2003), espécie de resguardo memorial de toda a obra escrita pelo poeta até aquele momento. Em 2004, o poeta foi indicado para o Jabuti de poesia (Metade da arte), em 2005 recebe convite para representar o Brasil na França, local onde escreve este “O roubo do silêncioâ€. Em 2006 é agraciado com o 2º lugar no “I festival de poesia de Goiaz velhoâ€. E, agora, mais uma vez, "O roubo do silêncio" é indicado como um dos dez finalistas para a última fase da edição do Prêmio Portugal Telecom de Literatura (2007).
O livro, financiado pela CNL (Centre National du livre), França, sobre a forma de bolsa escritor, é publicado no Brasil por meio de uma parceria entre a editora responsável pela premiação do festival e a 7Letras tendo, já em sua outra ponta, tradução francesa preparada para sair em 2007. Creio que todas essas pequenas notas sobre o percurso de uma obra já denotam o lugar do escritor ou uma certa cena geográfica que desenha o espaço poético ocupado pelo autor desses pequenos livrinhos depurados por uma linguagem que trabalha de forma intensa, densa e tensiva com o fazer poético.
A poética de Siscar indaga, com a força movente dos seus intensos rios em movimento, o que é a poesia hoje. Questão que se apresenta em seu trabalho teórico, em sua performance como professor. No entanto, sua poética se impõe. Aliá-se ao trabalho do crÃtico o poeta que se abre para o rastro (crÃtico) para melhor refletir e indagar a poesia e seus sentidos.
“O roubo do silêncioâ€, invertendo sua gênese, transcendendo sua forma pela ruptura, não permite nunca que a técnica se sobreponha ao ato poético, ao seu acontecimento único. Este “rouboâ€, que depura a poesia da prosa oleosa do mundo, se apresenta como poética madura, surgida da confluência entre seus outros tantos rios, inaugurando outras nascentes que vingam entre os carrapichos, imagem recorrente nestes poemas, para estabelecer uma relação dramática com a prosa do mundo e seus fragmentos escorregadios.
Nesses poemas, se algo se pretende comunicar, no intransitivo da linguagem, este algo é o sentimento de dor que nos assola diante de toda e qualquer forma de violência (do poema, da palavra, da vida, do outro, do mesmo, da guerra, da morte, de nascer, de existir). Dividido em quatro fases (Sentimento da violência; Ficção de origem; Balões Brancos; Cidade sem sol) esta prosa fragmento intensifica o sentimento de existir pela aspereza do encontro com a existência, o mais intenso e profundo, que assim se diz (Quando minha morte não me pertence, o modo de morrer não me pertence, esse expatriamento vai entrando dentro da vida./Quando minha morte me é roubada, é o roubo que corre para dentro de mim./O silêncio é o sofrimento da palavra, quando a poesia do silêncio lhe é roubada./ A vingança dos desapropriados é o barulho da prosa do mundo. Se eu pudesse falar, pegaria andorinhas em pleno vôo.) ou como em “As flores do mal†(E no meio de ervas daninhas suo, me sujo, concentrado como um artesão, enfurecido como um filósofo, a extirpá-lo./Enquanto isso, suas sementes caem no chão limpo e a terra as acolhe, hospitaleira./Nuvens passam aos pedaços, quando me deito.).
Mais dolorido ainda é se deparar com “Se eu não estiver perto de mim†(O que não verei se na hora do tambor eu já não estiver perto de mim, quando na hora do tambor, não estando pronto, eu não estiver perto de mim./E eis que na hora do tambor não estou pronto, pois na hora do tambor é como se não estivesse perto de mim.) ou “Balões brancosâ€, dedicado a Pedro (Mas você estava de repente ausente. Inesperadamente, me pediu para sentar de frente para a cidade iluminada. Uma cidade sem sol. São balões brancos, me disse das luzes da lagoa e da lua cheia./Eis que acima das águas se sustenta a claridade que as torna visÃveis./Quantas vezes minha mão ainda lhe mostrará o vendedor de pipocas?).
Seria pouco dizer que aqui se tem uma poética que provoca nossas estranhas certezas sobre o mundo e que carrega, em suas entranhas, uma paradoxal afirmação da vida pela morte. Entre a leveza e a dura realidade, a vida, em sobressalto, é o que se quer salvar.
Denise, bacana encontrar outro texto seu aqui. Muito bom mesmo você compartilhar com a gente essas visões pensamenteadas. Tão bom encontrar trilhas novas nas impressões de suas leituras. Que venham outros textos!
Beijo grande.
Cida, bacana é ter você como leitora e incentivo para a escrita! Quanta delicadeza! Suas leituras muito me honram porque sou sabedora e leitora dos seus textos maravilhosos e bem escritos, para não dizer: sempre inventivos no trabalho e na esgrima com a palavra; essa que nos desconcerta todos os dias e nos provoca e povoa, como você já disse muito bem e melhor do que eu diria aqui.
Beijo enorme e meu muito obrigada pelo carinho!
Bom saber da obra do Marcos através de um texto tão bacana!
Obrigado e parabéns.
Abraço.
Oi, Marcelo, pelo visto conhece a obra do Marcos e o próprio Marcos? Abraços
Denise Sampaio Ferraz · São José do Rio Preto, SP 21/10/2007 13:48
Já havia lido uma ou outra referência ao poeta, mas não em texto tão rico e interessante que incentivam a leitura imediata da obra resenhada.
Obrigada.
beijos
Seramar
Saramar, venho companhando o trabalho do poeta desde "não se se diz" - todos os lançamentos pela Cosac&Naif e pela 7Letras. Há uma assinatura inconfundÃvel em sua obra. Poxa, vale a pena! A poesia ocupa um espaço tão pequeno na litaratura brasileira! Basta saber a dificuldade que todo poeta iniciante encontra para publicar, número de tiragem, etc. No caso do poeta Marcos Siscar, pode-se pensar em um dos marcos da poesia contemporânea que há dez anos vem se firmando. Tenho certeza que lendo toda a obra, você vai gostar muito! Alguns poemas estão pela net, basta dar uma busca pelo nome do poeta. Valeuu!! Valoriando o que é nosso e o que é bom! Com o meu afeto!
Legal, Saramar, que tenhas gostado! Acho que o que vale é isso: a gente ir lendo poesia, fazendo poesia, pensando poesi. O mundo tá carente de poesia, não tá não? Poesia praxis! beijão
Denise Sampaio Ferraz · São José do Rio Preto, SP 22/10/2007 23:41Para comentar é preciso estar logado no site. Faça primeiro seu login ou registre-se no Overmundo, e adicione seus comentários em seguida.
Você conhece a Revista Overmundo? Baixe já no seu iPad ou em formato PDF -- é grátis!
+conheça agora
No Overmixter você encontra samples, vocais e remixes em licenças livres. Confira os mais votados, ou envie seu próprio remix!