Desde sempre ouvi na escola, que o tempo se divide em quatro estações. Por “tempo”, entenda-se, os 12 meses do ano. Na minha cidade, no interior de Goiás, realmente isto é verdade. Lá, nós, estudantes do Colégio Nossa Senhora do Bom Conselho, podíamos aprender aquelas lições, e aplicá-las na vida cotidiana, observando. Depois cresci, ganhei o mundo, e vi meus sobrinhos nascerem, crescerem e irem para a escola. Só que agora estamos em Palmas, Tocantins. E aqui, embora os livros didáticos sejam os mesmos, e as lições ainda contenham a divisão do “tempo” em primavera, verão, outono e inverno, esta não é uma verdade absoluta que possa ser observada.
O tocantinense, como boa parte dos moradores desta região do País – me corrijam os overmanos do Norte, nos casos em que eu esteja errada – só conhece duas estações. Aqui não faz frio, portanto, não há inverno. O outono, se há, passa desapercebido, pois não há muito como distinguí-lo. Será o outono em agosto, como agora, quando o vendaval desce sobre tudo que há, derrubando árvores mais do que folhas? Não sei. O que posso afirmar sem sombra de dúvida é que nas estações que se conhece aqui, temos: a das águas, e a da estiagem. Cada uma dura seis meses, sendo que de alguns anos para cá, tem chovido menos, e a estiagem, em conseqüência, durado mais.
O que me pergunto é justamente sobre estas diferenças de um País continental que não está acolhida nos livros didáticos. Na realidade, meu segundo grau foi técnico em magistério, e meu primeiro curso superior, Pedagogia que deixei faltando dois semestres para terminar. Mas neste tempo que passei entre o Campus da UFG de Jataí, e a Faculdade de Educação no setor Universitário, em Goiânia, me apaixonei pela educação como meio de compreensão da vida, e transformação do mundo. Como não haveria de ser assim, bebendo na fonte de tão brilhantes educadores como Paulo Freire e Marilena Chauí? Impossível.
Assim foi que nunca me conformei com as coisas desnecessárias que enchem os currículos da escola pública. Perguntas sem resposta que os alunos às vezes nos fazem - sim, já lecionei para a primeira fase – como por exemplo: “professora, eu vou usar isto pra quê?”
Sinceramente, o aluno da nossa região, precisa ser informado de que enquanto é inverno no calendário oficial das estações – realidade para os nossos vizinhos de Goiás, em junho e julho, por exemplo - para nós é pleno verão, com direito à temporada de praia e carnaval fora de época. Estas realidades paralelas, que não cabem no livro didático, ou ainda não foram por ele assimiladas, dão a impressão a estes brasileiros, de que estão “fora do mundo”. E não estão, pois o mundo, também é aqui.
A inclusão digital, com tendência a abraçar escolas públicas em todo País, de certa forma vem relegando as bibliotecas ao segundo plano. Pesquisar, no meu tempo de escola primária,era uma aventura que sempre levava a outras descobertas. Ir à biblioteca, manusear aqueles livros belíssimos que traziam notícias de todos os lugares do mundo, era fascinante. Hoje, o pequenino lá de casa – na quinta série - tem pelo menos quatro pesquisas por semana para fazer. Todas na Internet. Temas que pela complexidade, fico pensando: será que pediram isso mesmo? Ele, pelo menos, tem o privilégio de ter computador em casa, com acesso à net, mas nem sempre foi assim. A escola, pública, não tem equipamentos para atender a demanda de todas as turmas. E lá vão seus coleguinhas para os cybers e lans que nem sempre os pais podem pagar.
Os mais ácidos podem estar se perguntando o que pretendo ao levantar esta discussão aqui. Como o cultural é quase sempre o intangível, o impalpável, me incomoda pensar o que de fato a escola ensina quando dá lições erradas, inadequadas, ou exige do aluno o que ele não pode dar. Um velho ditado popular árabe, citado na obra de Khalil Gibran, diz: “ a autoridade repousa sobre a razão”. E eu pergunto: que razão há neste modo de educar tão desconexo? Num mundo cheio de diferenças e sutis particularidades, há que ensinar às crianças sobre as diferenças que não estão nos livros didáticos, de modo que elas se sintam parte de um mundo equilibrado. De preferência um em que haja espaço para os livros. Diversos, de autores de todos os cantos do País, e específicos sobre cada realidade.
Bom dia Roberta. Concordo com o seu apontamento: "A inclusão digital, com tendência a abraçar escolas públicas em todo País, de certa forma vem relegando as bibliotecas ao segundo plano". E a leitura, o manuseio do livro propriamente dito, vai parar aonde? Dessa maneira a cultura da oralidade vai por água abaixo. As crianças estão deixando de ser relacionarem fisicamente, para ficaram nos bate-papos da vida... paradigma digital??? É preciso pensar sobre isso.
Quanto às estações do ano Roberta, aqui no RN, tirando a Zona da Mata, as outras regiões conhecem apenas a estiagem e o tempo das chuvas que enchem os açudes e espalham a beleza cortante das serras, pedras e vegetações, que ficam verdinhas, verdinhas, quando orvalhadas...
Um abraço.
Querida Roberta:
Não só gostei do seu texto como adorei o tema que você desenvolveu. Não sei se está sabendo, estou propondo ao overmundo a edição de um livro exatamente sobre este tema. E acho que o seu artigo tem tudo a ver virar um capítulo do livero
De uma espiada na minha proposta expessa no Fórum do Observatório.
beijos e abraços
do Joca Oeiras, o anjo andarilho
Adorei seu texto Roberta. As informações contidas nos livros didáticos são relamente absurdas. E, hj, com a possibilidade que os alunos têm (infelizmente nem todos) de acessar o conhecimento pela internet, os livros ficam ainda mais anacrônicos.
Qto ao problema das bibliotecas, não sei aí no seu estado, mas por aqui não é o projeto da inclusão digital (que está longe de ocorrer) que as relega ao segundo plano. Essa desvalorização já é antiga pq, de uma maneira geral, a escola está mais preocupada com a transmissão dos conteúdos do que com a formação do leitor. E, por incrível que pareça, tenho percebido que o computador e a internet têm contribuído para que crianças e jovens leiam e escrevam mais. O que, claro, não significa que devamos abandonar os livros. Eu tb adorava ir a biblioteca do colégio para ler tudo que encontrava pela frente.
Até há pouco tempo eu me desesperava com a falta de gosto de meus alunos pela leitura. Fazia de tudo para seduzí-los para os livros. Hj, estou mais calma. Tenho aprendido com eles que o fato de conviverem diariamente com as tecnologias que não existiam na minha época de juventude faz com que suas preferências e habilidades sejam diferentes das minhas.
De qualquer maneira, como adoro ler, penso como vc a respeito da necessidade de a escola valorizar os livros.
Grande beijo
Oi Felipe, não entendi porque vc relacionou o livro à cultura da oralidade. A cultura letrada é que desprestigiou a oralidade. E sobre o que vc diz a respeito de as crianças ficarem nos bate-papos da vida...não é o que fazemos aqui no overmundo nos deleitando com isso rsrsrsrsrrs Elas tb não têm o mesmo direito?
Abrçs
Oi, Roberta!!!!
meus parabéns!!!! :)
Abraços!!
Bem Ize, acredito que uma criança adquiri mais vocabulário, mais conhecimento, começando primeiro pelos livros. Vi reportagens, li alguns textos sobre isso. As crianças se expressão menos hoje em dia. Estão mais monossilábicas... Se nos batemos papo por aqui, é por decorrência de textos como este aqui acima, não é conversa furada, despropozitada. Um recente pesquisa aponta a queda do rendimento escolar dos adolescente devido ao tempo gasto na frente do computador. Acredito que se o mesmo tempo fosse gasto com leitura, isso seria diferente.
Um abraço.
Querido Filipe:
Desculpe a correção: Você disse " As crianças se expressão menos hoje em dia." mas pretendia dizer " As crianças se expressam menos hoje em dia.
beijos e abraços
do Joca Oeiras, o anjo andarilho
Roberta, menina bonita que troca boniteza com Palmas,
No nordeste também só há duas estações - entremeando os meses - uma de outubro a abril/maio quando chove, (nós a chamamos deinverno); e a estação das secas.
- E que o Brasil oficial ainda é colônia européia.
Legal - as fotos, a dissertação, beijos, andre
Bem apontado Joca. E na verdade não foi só esse o erro. Errei também no "artigo" e no "plural aqui e acolá...
Abraço.
Querido Felipe:
Já que tocou no assunto "uma criança adquire mais vocabulário" e não "uma criança adquiri mais vocabulário".
beijos e abraços
do Joca Oeiras,o anjo andarilho
Oi Joca, não sabia deste post seu, mas vou ler com carinho. Obrigada pelas considerações que fez!
Ize, acho que suas ponderações são muito oportunas. Também reconheço a riqueza de opções que esta geração tem, e que eu pelo menos não tive, por ter vivido a escola primária e a descoberta dos livros bem antes do advento da popularização dos
computadores e criação da rede mundial. Penso que há espaço e necessidades diferentes para tudo, livro e internet. Obrigada pelo rico comentário!
Felipe, agradecida. Este tema realmente tem muito a ser explorado, e acrescentado.
André... nós também chamamos a estação das chuvas de "invernada", e esté é o único inverno que conhecemos, por que frio que é bom, só eventualmente, em áreas serranas, e de maiores altitudes, coisa que não há pela Capital, e maior parte do cerrado tocantinense. Obrigada pelo carinho!
Abraços a todos, e o debate continua...
Mas Filipe (desculpe, errei o seu nome no post anterior) gostaria que vc e os demais se posicionassem sobre o projeto de edição de um livro do overmundo sobre a Memória da Educação e do Aprendizado. Tem como?
beijos e abraços
do Joca Oeiras, o anjo andarilho
Bom texto, informativo da realidade brasileira e cada vez mais diferenciada e preocupante. Bom mesmo.
bjus votado.
Oi Roberta.
Belo texto, belo também pois você fala do ensino- aprendizagem e da necessidade de mudar os parádigmas sem "lascar o pau", no professor, como se ele fosse o único culpado pela derrota da educação.
Um grande abraço,
Elizete Arantes
Elizete, sou filha de professora, meu primeiro emprego foi este, e a carreira acadêmíca é minha próxima aspiração. Portanto, nunca seria injusta com profissionais da educação, esses resistentes!
Cintia agradecida pela sua presença e comentário. Obrigada!
Adorei o texto e me comovi porque vejo minha mãe, também professora, lutar muito em favor da educação desde que me entendo por gente. Concordo com a necessidade de reformulação dos livros, do sistema de educação, de alguns meios ultrapassados de lecionar, avaliar o aluno, motivá-lo, etc. Acho sim que essa é uma luta dos professores e dos alunos também; só não entendo aquele professor que, por conta dos livros estarem em desacordo como o que a gente entende como ideial ou aproximado disso, não faz um esforcinho extra pra corrigir (oralmente) aquilo que está nos livros e não se adequa à Região, cidade, país, classe social, etc etc etc. Pelo menos ajudaria o processo de transformação por uma educação de melhor qualidade e mais aproximada da ideal, por que tanto lutamos e queremos.
Parabéns pelo texto e pela iniciativa.
Bonito texto, com colocações realmente pertinentes. Parabéns. Beijo grande.
Joana Eleutério · Brasília, DF 13/9/2007 17:57Para comentar é preciso estar logado no site. Faa primeiro seu login ou registre-se no Overmundo, e adicione seus comentários em seguida.
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