Pedro Rocha, Salvador, abril de 2006.
Impressões forasteiras de um fortalezense. *
E quando se chega de mala e cuia ali na Praça da Sé, um pouco antes dos becos enviesados do Pelourinho, lá se vem de fitas na mão André, preto de andar apressado, morador da Baixa do Sapateiro, 25 anos, de olhar seguro do que precisa fazer, de fala rápida e desenrolada, sotaque baiano, voz rouca, barba rala, de fitas na mão. Oferece ali para o turista que chega lembranças coloridas de salvador, de graça, e já vai amarrando no braço, enquanto desenrola o papo e dispensa outro concorrente que azucrina para levar os visitantes a algum albergue que lhe dará 10 ou 15 por centro de comissão pelo serviço. Dispensa na manha, dando confiança, “Aqui não é otário não, é nordestino, não é gringo.â€
Depois que a fita tá no braço, não custa nada comprar mais umas 10 por 1 conto. E daà que não tem trocado, tira de dois... na verdade ele ia cobrar era 3, mas vai pelos dois mesmo. E vai meu primeiro dois conto da viagem, rápido e confuso. Dois reais que interou naquela hora os 16, metade André do que vai apurar no fim daquele dia.
A Solange é uma moradora de rua desengonçada, dos dentes tortos, das pontas dos dedos mal formadas, poetisa, de olho rápido, aguçado, de temperamento volátil, um tanto agressiva. Sincera demais para turistas que querem ser apenas viajantes. E daqui a pouco o que era uma conversa despretenciosa, vira meio que uma visita guiada pelo Pelorinho, até o nosso albergue.
Ali, ela brincava, acompanhava Olodum, as batucadas, antes daqui virar um centro turÃstico cultural, limpo, bem guardado, recheado de galerias, restaurantes, ateliês, albergues, pousadas, gringas, gringos, baianas na função de posarem para fotos. Tudo muito bonito. No meio da conversa se levanta, pega dois canudos no lixo, os trança e deles faz e me entrega um laço vermelho. Solange tem aids, fala minha namorada chorosa depois, confirmando a sensibilidade da poetisa de olhar entre-linhas.
Quando lhe vier na cabeça de entrar em um beco escuro, de bares fim de carreira, só pra ver qual é, e conhecer algo que não seja um postal, se ponha no seu lugar de classe média, turista, opressor e legitimador do que vem atrás do consumo de massa, do modelo de vida globalizado e do turismo. Talvez você evite perder 30 reais e os documentos para um cara que depois de balançar o pau no fim de uma mijada, coloca a mão dentro da camiseta e leva sua carteira.
Depois do BO, a postura é de se dar uma folga frente conflitos sociais, comer uma ótima moqueca de marisco para três pessoas por 35 reais, em um daqueles restaurantes transados do pelô. Claro que o mais barato. Outra opção para sua viagem pode ser um tira-gosto de piabas fritas, Pititingas, de pé na areia, ante o mar, na praia de Ponta de Areia, acompanhado de pimentinhas e farofa branca. 5 reais, fora o ferry boat para chegar na ilha de Itaparica e a topic até a praia. Quem sabe o grande shopping open mall Aeroclube Plaza, ou uma tarde em Itapuã, um Acarajé da Dinha...
* foi foda
www.grupotrema.blogspot.com
tava sentindo saudade do T.R.E.M.A. por aqui
Hermano Vianna · Rio de Janeiro, RJ 8/5/2006 16:30Rapaz, isso me lembrou uma visita que fiz a Salvador em 2003. Acho que vou escrever um adendo a respeito por aqui.
Fábio Fernandes · São Paulo, SP 11/5/2006 07:13
Que divertido ler isso, Pedro. :)
Eu trabalho no Pelourinho e vejo essas cenas que você relatou todos os santos dias da semana (que na Bahia, são todos mesmo). Essa cena da fitinha é um clássico...
A grande ironia da coisa é que essa paisagem arrumada, estilizada, cheia de sorrisos negros de cartão postal, cada dia que passa fica mais "poluÃda", "manchada" por aidéticos, prostitutas, mandigos, meninos e meninas de 10, 11 anos drogados... é que o Pelô fica muito próximo de áreas miseráveis da cidade, ele mesmo, antes da "revitalização" feita dor ACM e sua trupe, que retirou todos os moradores e levou pra outro bairro, transformando o lugar num shopping a céu aberto, era um lugar marcado pela pobreza, pelo tráfico...
enfim, falar do pelourinho dá muito pano pra manga....
bacana sua reflexão,
Abraço! (e volte sempre!)
Que delÃcia ler as impressões forasteiras de vc Pedro...consigo imaginar cada cena e ainda de forma despojada e inteligente sinaliza lugares e comportamentos,daà fico imaginar qual seria meu olhar diante desse contidiano...HUM...demais.
Carmen Angélica Costa
ba_cao@hotmail.com
SSA-JUAZEIRO-SSA
Que delÃcia ler as impressões forasteiras de vc Pedro...consigo imaginar cada cena e ainda de forma despojada e inteligente sinaliza lugares e comportamentos,daà fico imaginar qual seria meu olhar diante desse contidiano...HUM...demais.
Carmen Angélica Costa
ba_cao@hotmail.com
SSA-JUAZEIRO-SSA
errata(cotidiano)
Que delÃcia ler as impressões forasteiras de vc Pedro...consigo imaginar cada cena e ainda de forma despojada e inteligente sinaliza lugares e comportamentos,daà fico a imaginar qual seria meu olhar diante desse cotidiano...HUM...demais.
carmen angelica costa
ba_cao@hotmail.com
SSA-JUA-SSA
me impressiona esse texto em destaque no overmundo. Muito e positivamente.
Vamos arregaçar esse o conceito de cultura nesse site!
Muito bom o texto, Pedro. Essa coisa do "olhar de fora", do viajante, é algo que sempre percebo como diferencial em coberturas jornalÃsticas de um repórter "forasteiro", mas que o jornalismo impresso (o diário, principalmente) ainda não captou bem.
Felipe Gurgel · Fortaleza, CE 12/5/2006 15:32Para comentar é preciso estar logado no site. Faça primeiro seu login ou registre-se no Overmundo, e adicione seus comentários em seguida.
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