...um espaço nosso nessa decadência”¹
Estava conversando com uma pessoa de banda que estava lançando um disco e que me perguntava como fazer para divulgá-lo na internet.
– Eu já fiz fotolog, um myspace, um blog, youtube, página no orkut, na showlivre, trama virtual, flickr... – dizia ele.
– Apague tudo – respondi.
Ele achou que eu estava brincando.
– Se a música é boa, use a internet, inicialmente, para divulgar apenas a música. É ela que tem de aparecer – disse para ele.
Que alívio da porra! A partir dessa conversa, me livrei de um trauma e finalmente descobri o motivo de minha rabugentice com bandas novas. Eu consigo encontrar talento – “consigo encontrar talento”, diga-se de passagem, em relação, única e exclusivamente, ao meu gosto pessoal, caro leitor rabugento – em muitas bandas e artistas atuais, mas não passa disso.
– Man, ouça isso agora, isso é o que vai salvar o rock – disse um amigo pelo msn, mandando um arquivo em mp3.
Ouço a música, gosto dela, me interesso pela banda, vou no site e, em duas horas, eu já tenho todas as músicas. E fotos da banda. E fotos da equipe técnica da banda. E foto dos amigos da banda. E vídeos. E depoimentos dos fãs. E o que eles comeram no almoço. E diários dos integrantes da banda com os temas “Criar é doloroso” e “O sucesso é complicado”.
E, assim, o que ajudou a destruir os Beatles em 10 anos, nos anos 60, e o RPM em dois anos, nos anos 80, destrói qualquer banda em duas horas, nos atuais anos 00. Em duas horas, eu não agüentava mais aquela banda. Acredito que o artista, naturalmente, goste de se expressar e de se expor, seja lá qual for o meio para isso, mas, diante do imediatismo atual, talvez, mais do que nunca, seja preciso que antes o seu público peça por isso.
Se a música é boa, ela já expõe o artista. Já expõe até demais e, ainda assim, a banda dá de bandeja o resto todo?! Aí perdeu a graça. Tive de andar em muito sebo para conseguir ler entrevistas e/ou poder achar uma foto nova de Legião Urbana, Titãs, Paralamas do Sucesso, para assim poder saber o que eles pensavam e se as atitudes batiam com o que cantavam. O fato de ter de ir buscar a informação era um grande motivo para alimentar a curiosidade. Já perdi (ou ganhei) muito tempo ouvindo rádio, esperando tocar uma música nova para eu poder apertar REC e gravar.
O tempero é a fome.
Um cara de uma grande gravadora me disse recentemente que “hoje em dia, a banda tem de bombar na internet”.
Que o fotolog tinha de bombar, o myspace tinha de bombar, o blog tinha de bombar, que tudo tinha de bombar. E essa tem sido a fórmula do sucesso difundida mundo afora.
Fazendo um paralelo, isso é como nos anos 80, quando houve uma revolução nos estúdios de gravação e todos resolveram usar tudo o que podia ser usado. O resultado foi que os sons dos discos dos anos 80 se parecem. As baterias, os baixos, as guitarras, os discos... tudo com o mesmo efeito hi-tech da época. Aquele reverber futurista.
Nos anos 90, aconteceu o mesmo com o design. Com a revolução do microcomputador e, consequentemente, dos programas de edição de imagens, todas as imagens dos anos 90 têm cara de Corel Draw. Usaram todos os recursos que podiam. Em tudo.
Sobressaiu e ficou quem enveredou logo por outro caminho. Nem que tenha sido de forma sutil. Acontece o mesmo agora. São as revoluções por minuto.
Como mostra bem a história, em toda ela, os caras da gravadora sempre estiveram errados.
O marketing certo a ser seguido não existe. Acredito que quem alcança o objetivo desejado é aquele que toma as decisões de acordo com o que vê.
A banda britânica Radiohead, em 2007, olhou para o mundo real e virtual em que ela estava inserida, e pensou ao observar o entrave pirataria-gravadoras-internet-fãs: “se o mundo tá desse jeito, vamos lançar nossas músicas e dizer ‘pague o quanto puder’ ”.
O resultado disso foi que 40% pagaram uma média de 18 reais pelo download de 10 músicas, do disco "In Rainbow". Estima-se que o faturamento do grupo tenha sido em torno de 10 milhões de dólares.
Agora em 2008, o Radiohead lançou o disco físico dessas músicas (com dois vinis, encarte especial, músicas exclusivas...) e o fenômeno é que boa parte dos 60% que não pagaram pela internet, eu inclusive, estão agora comprando o disco nas lojas. Foi lançado esse ano e já é o primeiro nas paradas americanas. E o disco custa, em média, 150 reais. Foi um olé na pirataria, nas gravadoras e na própria internet ao mesmo tempo.
O pirata tem tudo, mas não tem encarte com as letras. Publicidade é mostrar o diferencial que uma coisa tem em relação a outra. Seja loja de varejo ou banda de rock. E no mercado do rock, hoje em dia, o seu “concorrente” tem tudo, mas não tem discrição.
Um tempo atrás, fui conversar com um cara que queria empresariar uma banda em que toquei. Ele já era do ramo, empresário da alegria baiana, experiente...
– Já tenho o esquema montado. Conheço o mercado. É tudo feito no marketing certo. Temos as datas certas para cada coisa – dizia ele.
– Como assim? – perguntamos.
– Tipo, janeiro e fevereiro é bom pra show; março e abril vocês criam; em junho a gente lança; agosto, setembro e outubro é para shows e divulgação bombando; novembro DVD ao vivo, pois é perto do Natal e blá, blá, blá...
A melhor parte foi “março e abril vocês criam”.
Não importa o quê, criem qualquer merda, pois o cronograma do marketing do sucesso não pode ser quebrado. A música é o que menos importa. O artista é mais importante.
Ele ainda disse que ia colocar a gente em outdoors espalhados pela cidade com nossa foto.
Juro que tentei, mas quando ele disse isso, não resisti e dei risada.
– Isso mesmo, au-te-dors – soletrou ele, empolgado pela minha risada.
Ele deve ter achado que era de felicidade.
E ainda chamam o Radiohead de “rock triste”.
__________________
(1) Rádio Pirata, de Luiz Schiavon e Paulo Ricardo.
Pois é, eu acho que você está bem certo nas suas colocações. Porém, chego a conclusão que determinadas bandas não vendem música mas, sim, elas mesmas. Acho esse o caso do Radiohead. O que eles oferecem está sendo vendido. E a música, razão pela qual eles existem, eles não se importaram em cobrar por ela. Claro que para que eles chegassem a esse patamar, houve um momento em que tiveram que oferecer música. Porém, não sei se esse é o produto que as pessoas compram.
muito bom o texto ..
realmente não há fórmula do sucesso porém no meio artístico, o vulgo "pistolão", a grana e o "investimento" parecem ser os fatores mais determinantes de um grupo musical "de sucesso" não importanto o estilo, o que se canta, o que se vende(infelizmente) .. pois todos temos de comer ..
. . .
uma pequena observação: "março e abril vcs criam" .. como se fosse fáácil criar 10 a 20 BOAS músicas em apenas dois meses .. escolher as melhores e lançar assim como se fossem a obra-prima .. novidade, refresco para as idéias e dores do púlbico consumidor ..
Daniel Sinis · Angra dos Reis, RJ 28/1/2008 04:03Para comentar é preciso estar logado no site. Faa primeiro seu login ou registre-se no Overmundo, e adicione seus comentários em seguida.
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