Dividir é conquistar

.Vanor Correia.
.as meninas do Balé Afro Mojê Molê.
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joao xavi · São João de Meriti, RJ
14/12/2008 · 238 · 3
 

Dividir e conquistar. A máxima, presente nos mais famosos manuais de guerra, foi criativamente subvertida na edição carioca do festival Tangolomango. Nessa guerra (não santa, porém abençoada) somente as fronteiras foram derrubadas. A proposta da brincadeira, que o pessoal do Tangolomango já banca há sete anos, é promover trocas entre grupos culturais distintos. O resultado dessa experiência pôde ser assistido ao vivo e a cores, numa montagem coletiva que aconteceu no Circo Voador, Rio de Janeiro.

Todo processo começou com a seleção dos grupos que participaram do festival em 2008. A escalação contou com gente do Rio, Recife e (pela primeira vez) com um time de hermanos Chilenos. Essa galera se reuniu durante todo um final de semana no bairro da Lapa (região central do Rio), cenário ideal para inspirar o trabalho de criação coletiva que iria conceber o espetáculo. O grande desafio, e a graça do jogo, foi harmonizar tantos talentos em função de um único momento.

Na sexta-feira, dia do primeiro encontro, os grupos trocaram as impressões iniciais sobre os trabalhos de cada um. A idéia era começar a reflexão sobre como cada grupo poderia contribuir para a montagem geral do espetáculo. Já no sábado o espetáculo começou a tomar forma. Curioso é perceber a dinâmica de como cada trabalho se insere na formatação final do espetáculo. Talvez toda essa troca só seja possível porque os grupos que participaram do festival trabalham com propostas artísticas que privilegiam a coletividade. Não existe em nenhum dos grupos uma figura que centralize as atenções, essa estrutura jogou a favor da junção, a favor do diálogo.

No momento do espetáculo o Circo Voador foi armado como um verdadeiro picadeiro. Geraldo Júnior e sua banda ocupavam o palco. Do lado de fora do Circo uma fila bem grande aguardava a abertura dos portões. Apreensão de todas as partes, até que os Gigantes Pela Própria Natureza abriram os trabalhos, e os portões, convidando o público a se acomodar nas dependências do Circo. O lúdico entrava em ação desde o momento inicial, quando as pessoas ocuparam as cadeiras, elas já estavam fazendo parte do espetáculo.

No chão, pouco a pouco, cada um dos outros grupos foi tomando seu espaço. O Gigantes pela Própria Natureza chegou chegando do alto de suas pernas-de-pau, com uma mistura contagiante de batuque (com tambores de Maracatu) teatro e poesia. Só aí já teríamos um belo apanhado de diferentes elementos da nossa cultura popular, mas o espetáculo estava apenas começando. Na seqüência o Balé Afro Majê Mole apresentou sua primeira performance. O grupo, oriundo do Recife, é formado por meninas com idade aparente entre oito e quinze anos. Elas entravam no picadeiro em pequenas formações, realizando coreografias de diferentes danças Afro, com uma energia incrível. Os passos são muito velozes, e revelam uma grande motivação por parte das meninas em realizar esses números. Foi o primeiro momento emocionante da noite.

Com as atenções novamente voltadas para o palco, os Pandeloucos iniciaram sua contribuição. Os meninos e meninas são alunos da Associação de Músicos e Compositores da Baixada Fluminense (AMC), sediada em São João de Meriti. Armados de poderosos pandeiros e acostumados a acompanhar alguns dos maiores bambas da nossa música, a criançada levantou a platéia interpretando clássicos do samba. O povo acompanhou a apresentação “na palma da mãoâ€, inundando o Circo no final com palmas ainda mais calorosas.

Interessante foi observar como cada grupo assistia e vibrava com a apresentação dos demais. Estavam todos em uma energia sintonizada, naquela noite todos os grupos foram um só. Prova disso foi à gradual intervenção dos grupos nas apresentações alheias. Gigantes e a Cia. Urbana de Dança (representada por apenas dois, porém super talentosos b.boys) iniciaram uma dança conjunta. Em seguida as meninas do Majê Molê retornaram ao picadeiro para um número de sapateado apresentado junto aos b.boys. A versatilidade das meninas recifenses ajudou a inserir harmonicamente grupo de break-dance (o mais urbano dos grupos participantes) no espetáculo.

Quando é o corpo que fala, não se precisa de tradutor. Foi com essa proposta que os chilenos do El Circo Del Mundo agregaram seus talentos ao espetáculo. O grupo, que já atua a mais de doze anos, trabalha em duas vias: como uma escola de Circo, e como uma companhia que se apresenta ao redor do Mundo. Para o Tangolomango eles trouxeram números de malabarismo, tecido e um palhaço. Apoiados pelo instrumental da banda de Geraldo Júnior, as apresentações ofereceram ao público carioca novas possibilidades de se enxergar a arte circense. O palhaço, por exemplo, representava um operário. A moça do tecido uma lavadeira. Essas temáticas sociais foram somadas ao entretenimento normalmente proporcionado pelos circos.

Pra fechar a festa, os grupos foram convocados e devidamente apresentados a platéia, que correspondeu com aplausos calorosos. O número final, o mais animado da noite, contou com todos os grupos e a participação mais que especial da platéia. Cariocas, recifenses, chilenos (e mais quem estivesse por lá). Todos dançaram juntos no picadeiro, ao som de Geraldo Júnior e seu forró que destilou todo seu repertório e, com o público pegando fogo, foi obrigado a seguir noite a dentro emendando clássicos da música do povo brasileiro.

Foi dividindo um pouquinho do talento e do conhecimento que cada grupo conseguiu conquistar, um ao outro, e todos juntos a platéia. Ao final do processo a impressão que se tem é que cada pessoa saiu do Circo com novas idéias e diferentes possibilidades de perceber um mundo que é múltiplo. Ficamos todos um bocado mais ricos quando dividimos e conquistamos.

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Claudia Almeida
 

Claudia Almeida · Niterói, RJ 14/12/2008 07:38
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Thiago Paulino
 

Vida Longa ao Tangoloango...!!

Quem sabe algum dia grupos aqui de Sergipepossam participar desses belo e instigante caldeirão cultural.

Conheço o trabalhode Geraldo Junior e do Majê Molê, ambos de primeira linha artística com uma força muito grande.

Votado...

Thiago Paulino · Aracaju, SE 15/12/2008 19:27
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azuirfilho
 



joao xavi · São João de Meriti (RJ)
Dividir é conquistar

Música é uma Coisa abencoada, uma linguagem Universal de muita luz.
Temos de caprichar sempre e avançar unindo pessoas e rompendo fronteiras e obsciridade.
Temos de fazer a vida valer a pena e fazer o mundo ser melhor.
Parabéns pelo trabalho táo valoroso.
Abracáo Amigo.
Maior orgulho vir ver e conhecer o Trabalho de vocés.

azuirfilho · Campinas, SP 7/1/2009 16:05
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.ensaio geral - ajustes finais horas antes do espetáculo. zoom
.ensaio geral - ajustes finais horas antes do espetáculo.
.o batuque elevado dos gigantes pela própria natureza. zoom
.o batuque elevado dos gigantes pela própria natureza.
.a força das meninas do Mojê Molê. zoom
.a força das meninas do Mojê Molê.
.a percussão dos Pandeloucos. zoom
.a percussão dos Pandeloucos.
.Geraldo Júnior e sua banda fechando a tampa em alto estilo. zoom
.Geraldo Júnior e sua banda fechando a tampa em alto estilo.

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