E O VALE DESABROCHA

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Logos das Secretarias de Cultura de Blumenau e Itajaí e do Simpósio de Brusque
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Labes, Marcelo · Blumenau, SC
6/5/2007 · 161 · 5
 

O VALE DESABROCHA

Pensar o Vale do Itajaí como sendo apenas uma região turística do sul do país onde se pode ver gente loira de olhos claros, apreciar a arquitetura enxaimel e curtir as festas típicas que acontecem durante todo o ano se não é ignorância, é pelo menos ingenuidade. É certo que muito mais do que o citado não chega aos ouvidos e leituras em outras regiões do Brasil. Mas há que se fazer justiça. Sim.

Comecemos por Itajaí, que se apresenta como um excelente exemplo. Pois que é a única cidade do Vale que possui um verdadeiro teatro municipal. No mínimo, ousadia. Mas sendo o município da região que mais cresce, pode se ver que não cresce somente economicamente. Há, no meio disso, uma preocupação em desenvolver e aprimorar o gosto pela cultura e pela arte em seus diversos formatos. É o que a Fundação Cultural de Itajaí faz com maestria. Se bem que podemos pensar que, de um município que enriquece, não se poderia esperar menos.

Mas o mais impressionante é que existe uma efetiva procura por cultura. Sem procura, sem necessidade de uso, não haveria sentido a cidade ter, além do teatro, pelo menos mais duas casas de cultura; da mesma forma como não haveria sentido em promover o Festival Brasileiro de Teatro, manter o Salão dos Novos funcionando e outros tantos, tantos eventos interessantes que, como deveria mesmo ser, já recebem espectadores de diversas outras cidades-satélites dessa humilde capital cultural.

Os eventos e projetos itajaienses podem e devem ser conferidos no site da instituição – por quem mora perto e quem mora longe: se não puder visitar a cidade (Rio Branco não é logo ali), que pelo menos Itajaí sirva de inspiração para cidadãos das mais diversas vertentes brasileiras como uma cidade que promove arte e só ganha com isso.

Com Blumenau, acontece — embora com menor força — um movimento parecido. Por aqui, (ô terra fabril), muito se reclama e pouco se faz em relação à criação e exposição de ações artísticas. Certo? Errado! Muito já vem sendo feito e pode ser facilmente percebido no projeto Roteiro Cultural que a Fundação Cultural de Blumenau (FCB) organiza junto à prefeitura.

Para evitar que os eventos fossem aproveitados somente por participantes de seus respectivos segmentos (música para músicos, teatro para atores, sarau para poetas) como normalmente acontecia, surgiu a idéia de expor toda a programação do mês para todos os segmentos, inclusive para a população em geral, que talvez seja quem mais tira proveito disso. Assim, criou-se um público heterogêneo e os segmentos (plásticas, musicais, poéticas, cênicas...) podem interagir numa miscelânea de gostos e jeitos às vezes os mais diferentes.

Blumenau já conta com o CineArte, com o Circo Acústico e as mostras do Museu de Arte da cidade. Mas conta com uma surpresa. Pois.

Não se pode esperar sempre tudo do poder público. Pensando nisso, um grupo de autênticos atores-artistas criou a Temporada Blumenauense de Teatro, que funciona da seguinte forma: a FCB cede o espaço e apóia financeiramente a divulgação, mas quem organiza, promove e mantém a Temporada durante todo o ano são os grupos cênicos, sejam eles amadores, acadêmicos ou profissionais. Uma surpresa, sem dúvida, quando a organização (algo tão importante para uma instituição pública) atinge a sociedade civil em prol de uma maioria. Nós. O povo.

Santa Catarina é, já em si, mas também para os outros estados brasileiros, aquilo que a Europa mostra-se aos demais continentes: um aglomerado de povos com ascendências e aspirações culturais as mais diferentes, que muitas vezes não conseguem dialogar entre si por mera mania. Com O Vale do Itajaí, não é diferente. Se por motivos estritamente geográficos (as barreiras naturais: rios, montanhas e mato) ou culturais mesmo (ascendências distintas, como a germânica e a italiana), não saberia lhes dizer, mas eis alguns dos motivos para que você, seja lá onde estiver, saiba tanto a respeito da minha região como eu mesmo: pouquíssimo! Porque não se costuma informar e buscar informação a respeito do que se passa ao nosso lado. Mas, pesquisando, encontrei informações que serão utilíssimas para algumas pessoas.

Por exemplo: Brusque, uma cidade basicamente têxtil-varejista, abriga há seis anos o Simpósio Internacional de Escultura do Brasil. Já foram homenageados por diversos e competentíssimos artistas Xico Stockinger, Amílcar de Castro, Oscar Niemeyer... Um simpósio com duração de trinta dias: trinta dias de troca de experiências, informações e... cultura! Brusque mantém o Museu Internacional de Escultura a Céu Aberto (Parque das Esculturas), que abriga as criações internacionais dos simpósios. E que merece uma visita urgente!

Em Rio do Sul, pé da serra, um projeto da Fundação Cultural daquela cidade que merece destaque chama-se Estação Cultural. “São espaços que funcionam como escolas culturais, onde são oferecidos aos alunos cursos gratuitos nas áreas de Artes Cênicas, Artes Musicais e Artes Visuais. As aulas são ministradas por professores da Fundação Cultural.â€, diz o site do órgão. E isso acontecendo embaixo dos nossos olhos.

Para quem não conhece Santa Catarina, envio um sincero convite. Mas não somente para as famosas festas de outubro, para conhecer construções antigas e coloridas ou ver gente loira de olhos claros. Há muito mais por este estado que tão pouco configura culturalmente na cena nacional. Mas uma pergunta: existe esse espaço para Santa Catarina no cenário nacional? E para o Piauí, existe? Existe, no espaço nacional, lugar para o Acre?

Pra quem não sabe, Santa Catarina passa de “estado de espírito†para “estado que fomenta e induz à culturaâ€. Ainda que timidamente, mas de coração. Certamente.

Fundação Cultural de Blumenau

Fundação Cultural de Itajaí

Fundação Cultural de Brusque

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Egeu Laus
 

Beleza de post, Labes, obrigado!

Egeu Laus · Rio de Janeiro, RJ 2/5/2007 23:47
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Labes, Marcelo
 

Imagina, Egeu. Teu agradecimento me lisonjeia. Vejo como uma obrigação moral: há que se falar do que precisa ser dito. Abraço.

Labes, Marcelo · Blumenau, SC 3/5/2007 02:13
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Clara Bóia
 

Afe, vamos lá. Sabe que esses teus últimos textos rendem algumas teses, mas eu tenho preguiça de escrever :)
Tava hoje mesmo falando com alguém sobre essa história da cena cultural aqui na região, especialmente em Blumenau. Os tempos áureos do Teatro Carlos Gomes (quando ainda era Frohsinn ?), as óperas estrangeiras que vinham pra cá, quando a escola de música do teatro era um conservatório, quando o Seu Heinz Geyer tava vivo. Década de 50, 60? Tudo aquilo que contam e que acontecia enquanto eu estava na fila pra nascer.
Tudo muito germânico, mas nenhum problema até aí, até por que na cidade só tinha sobrenome alemão, ou não?
Mas bom, veja bem, eu gostei de título. Especialmente do "desabrocha", não só pelo sentido lírico da flor vicejante, mas também pelo sentido mais ordinário: Blumenau está deixando de ser broxa.
Mas não tem mártir nenhum nessa história, né? E, houve sim, e há pessoas trabalhando, mas nenhum santo guerreiro da cultura contra os dragões do entretenimento fácil. As coisas acontecem por que a arte é uma torrente cheia de crises de identidade. E também por causa de umas leis de incentivo, que não têm nada de nobre, mas ajudam a encher a barriga.
"Mesmo com todo rock, com todo pop
Com todo estoque, com todo Ibope,
A gente vai levando, a gente vai levando, a gente vai levando esse toque"

Clara Bóia · Blumenau, SC 6/5/2007 15:57
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Fabinca
 

Que bom ver um texto sobre Santa Catarina que não se refira apenas às suas lindas paisagens naturais (embora elas devam ser louvadas).

Chapecó, uma cidade com mais de 150 mil habitantes, capital do oeste, como dizem, não tem um teatro. Uma vez fui assistir a um ótimo espetáculo de balé da Escola de Artes de Chapecó em uma casa de shows(!!!). Sentada em uma cadeira desconfortável, via os bailarinos dos joelhos para cima quando muito.

Não assisti a nenhum espetáculo em Itajaí, mas visitei a casa de cultura quando estive na cidade há uns três anos. Teria ido ao teatro se tivesse dado tempo.

Fabinca · Bento Gonçalves, RS 6/5/2007 21:00
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Labes, Marcelo
 

Sem dúvida, Clara, ainda não há mártires culturais por aqui. (Haverá algum dia?) De qualquer forma, este texto fixa-se como um prelúdio para um texto mais azedo, em que citarei os desmandos e desorganizações estatais em relação ao pouco (?) que se cultiva culturalmente por aqui.

Fabinca, pensemos que seremos nós que faremos Santa Catarina deixar de ser um estado de espírito. Seja no teatro de Chapecó, seja com manifestos no overmundo. Mas lamento o teu lamento porque ele também é meu. Abraço.

Labes, Marcelo · Blumenau, SC 9/5/2007 11:49
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