Organizar um evento internacional de artes cênicas em uma capital como Maceió, sem nenhum apoio do setor público ou privado, é prova da vontade de fazer da doutora Nara Salles e dos bolsistas e professores do Núcleo de Artes da Universidade Federal de Alagoas – UFAL.
Com uma longa trajetória de atuação na educação popular, a professora, atriz, diretora e pesquisadora vêm desenvolvendo importantes projetos no estado de forma que é impossÃvel falar no ensino da arte em Alagoas hoje sem esbarrar no seu nome em algum momento.
Nara Salles é coordenadora da Escola Técnica em Artes e do Núcleo Transdisciplinar de Pesquisa em Artes Cênicas e Espetaculares, o NACE. É idealizadora do novo curso de dança contemporânea da UFAL e responde pelo projeto Pólo Arte na Escola no estado.
Com tanto serviço, Nara conseguiu um tempinho para conversarmos sobre educação, polÃticas de cultura e mercado de trabalho em artes no estado.
Marcelo Cabral - O que é o NACE?
Nara Salles - É o Núcleo Transdisciplinar de Pesquisa em Artes Cênicas e Espetaculares, ou seja, pesquisa em teatro e a dança integrando também as linguagens da música e das artes visuais ou outra disciplina.
O NACE Surgiu na época da minha tese de doutoramento, na ocasião não havia nenhum núcleo de pesquisa em artes no estado.
M - Fale sobre a implementação do novÃssimo curso de dança da UFAL. Como vai a primeira turma?
N – O curso era mesmo uma necessidade em Alagoas. Oferecer formação superior em dança contemporânea. A primeira turma está bem empolgada, é uma turma grande de 35 alunos. Agora no segundo semestre já receberemos uma nova turma. Estamos satisfeitos, professores e alunos.
M - Vida de artista não é fácil. Como lidar com as expectativas dos estudantes em relação ao mercado de trabalho nas artes? Como você avalia este mercado no estado?
N – Olha, vou te dizer uma coisa, nós temos hoje 250 alunos e não temos nenhum, entre os que querem trabalhar que esteja desempregado. Estão todos trabalhando.
O pessoal de licenciatura tem um mercado de trabalho grande, desde que o ensino de teatro nas escolas se tornou obrigatório por lei, eles precisam contratar professores com formação para dar essas aulas.
M – O mercado de filmes publicitários em Maceió absorve muitos atores?
N – Sim, muito também. Além disso, eles montam grupos de teatro e vendem seus espetáculos para instituições como o Sebrae, o Sesc, ou recebem apoio de projetos de incentivo do Governo Federal.
M - Como foi a experiência, ousada e embrionária, do 1º Congresso Internacional de Artes Cênicas em Maceió?
N – Muito boa! O pessoal do grupo Fontibón de Bogotá, na Colômbia, veio até aqui se apresentar e oferecer oficinas de teatro experimental. Eles vieram com o apoio do governo de lá, enquanto que a Secretaria de Cultura daqui sequer apareceu no evento, apesar de ter sido convidada.
Conhecemos o pessoal do Fontibón durante o Entepola, Encontro Internacional de Teatro Popular no Chile, quando viajávamos com o espetáculo “Em Brancoâ€, uma pesquisa sobre violência urbana cotidiana. Apresentamos na Argentina, Chile, Colômbia e Rio Grande do Sul.
M - Você Acha possÃvel que um evento internacional nos moldes do FIT, em Minas Gerais, possa existir no calendário turÃstico alagoano, despertando a atenção da mÃdia nacional para as produções locais?
N – Acho muito difÃcil porque dentro de Alagoas não existe interesse polÃtico no desenvolvimento das artes. Todo apoio que nós já tentamos, ou convênio, ou qualquer parceria com qualquer órgão de cultura da esfera pública municipal ou estadual não funciona. Eles não apóiam. Com exceção da Fapeal (fundo do Estado para a pesquisa).
A impressão que eu tenho é que eles encaram como “coisa da Universidadeâ€, ou seja, “a Universidade lá e nós aquiâ€, ou “A Universidade tem dinheiroâ€. O que não é a realidade e acredito que não podemos partir desses princÃpios. É preciso unir forças para que as coisas possam acontecer.
Além disso, é incrÃvel o tratamento e o cachê mais alto que oferecem aos grupos de fora enquanto que o pessoal daqui mal tem água pra beber no camarim.
M - Mas o Congresso vai ter uma segunda edição?
N – Sim, claro, bem provável que faremos ano que vem, mas continua pequeno, feito aqui por nós, por nossos bolsistas maravilhosos, que ganham pouco, mas trabalham muito e muito bem.
M - O setor privado não compra a idéia de viabilizar espetáculos ou mesmo um festival que movimente a cidade?
N – É possÃvel sim, mas nós não temos tempo de sair batendo de porta em porta atrás de recursos. Ter que dar aula, coordenar, correr atrás dos eventos, e ainda ter que ir lá conversar à s vezes com alguém que provavelmente não entende nada de arte. Não.
Se for para fazer nós fazemos aqui, com nosso pessoal, nossos recursos, com o pessoal da Colômbia, com quem quer fazer. O Sesc tem sido um grande parceiro.
Nós vamos continuar aqui trabalhando...
M – E o público? Muitas vezes escuto artistas reclamarem que se apresentam pra platéias esvaziadas...
N – Não existe um público porque até então não existia formação de platéia nas escolas, trabalho que estamos realizando atualmente com o Pólo Arte na Escola em Alagoas, mas enquanto não mudar, enquanto não houver um novo olhar sobre as artes cênicas, sobre a dança contemporânea principalmente, vamos ter essas dificuldades. É preciso uma educação para a formação de público.
M – O que é o Pólo Arte na Escola?
N – O Arte na Escola é um grande projeto que está em quase todos os estados, promovida pela Fundação Iochpe, que procura melhorar a qualidade do ensino da arte nos estados.
Eles oferecem material e incentivo através de convênios com instituições que já trabalhavam a educação popular nas cidades. Com a criação da pós-graduação em ensino da arte, podemos oferecer qualificação para professores que já ensinavam arte na rede pública, mas que nunca receberam formação para o ensino de nenhuma das linguagens artÃsticas: música, teatro, artes visuais ou dança. Este é o público do curso, fizemos uma pesquisa e identificamos essa carência.
Contamos com um grupo de estudos continuados, onde os professores de arte da rede pública participam e discutem questões sobre o ensino. Temos também uma videoteca e uma pequena biblioteca à disposição dos professores. Um material muito bom.
Matéria bem bacana, Marcelo!
Parabéns!
Abraços do Verde
(que infelizmente não teve tempo de ler tudo, mas acho o tema extremamente relevante)
Marcelo, as ações culturais desenvolvidas pela professora Nara Salles são a prova efetiva de que educação transforma a arte e a cultura em nosso paÃs. Eu gostaria muito de conhecer o Núcleo, já deixo aqui os meus contatos 51-9215-7970 ou 51-3226-0290 e o meu e-mail alebarreto_capta@yahoo.com.br
Eu sou um produtor cultural independente e quero aprender com iniciativas como esta, que precisamos dar eco aqui no RS. Há poucos dias escrevi um artigo "Vamos educar as pessoas para Produção Cultural" e acredito que o curso deve ser transdisciplinar.
Sobre a questão de vida de artista não ser fácil, posso afirmar que não é fácil ter que viver uma profissão que você não curte. Eu adoro ser produtor cultural e imagino que a professora e o Núcleo adoram o que fazem. Temos que continuar.
Mandem informações sobre o 1º Congresso Internacional de Artes Cênicas de Maceió. Parabéns, já tem um fã em Porto Alegre!
Marcelo
Os textos ficam mais ricos com entrevistas exclusivas. Muito bom.
Abraços
Arte-educação.Ou arte e educação. Muito bom.
Tacilda Aquino · Goiânia, GO 29/6/2007 16:31
A questão do recurso, principalmente pras cênicas, é a grande pedra no sapato. Depois, sendo de interesse, leia está matéria http://www.overmundo.com.br/overblog/catarse-coletiva-o-delirio-no-verbo-falar
É sobre uma peça de uma companhia, pra variar, sem muitos incentivos.
Abraços
Para comentar é preciso estar logado no site. Faça primeiro seu login ou registre-se no Overmundo, e adicione seus comentários em seguida.
Você conhece a Revista Overmundo? Baixe já no seu iPad ou em formato PDF -- é grátis!
+conheça agora
No Overmixter você encontra samples, vocais e remixes em licenças livres. Confira os mais votados, ou envie seu próprio remix!