Lobato e suas grandes verdades

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Vanessa FJ · Florianópolis, SC
19/3/2007 · 384 · 22
 

“Opinião pública só existe em lugarejos. Nas capitais desaparece substituída pela opinião que se publicaâ€. Foram essas duas frases que me prenderam quando eu comecei a ler “Mundo da Lua e Miscelânea†(editora brasiliense), livro do Monteiro Lobato que eu adquiri por R$ 5 em um sebo em Blumenau (SC). Estava ali uma das grandes verdades de Lobato sobre a imprensa do seu (nosso) tempo.

Nascido em Taubaté, interior de São Paulo, esquecido propositalmente pelo regime militar, ler Lobato traz um certo alívio, neste mundo de tantas “meias verdadesâ€, publicadas por aí como se representassem a opinião da maioria. A maioria, claro, nem sempre é ouvida. Engraçado é que me dei conta só agora da importância de ler esse autor, e foi quase por acaso, depois de ouvir rapidamente sobre seu nacionalismo.
O Mundo da Lua foi escrito em 1923, mas bem podia ter sido escrito ontem, tamanha sua atualidade. No prefácio, diz que Lobato o escreveu como uma espécie de diário, durante sua juventude, quando ele vivia mesmo no mundo da lua. Integrou-o com Miscelânea depois, referindo-se a alguns extras, quando tentou retomar essa história de fazer um diário, já mais velho, em 1946. Para quem não conhece, trata-se de uma coletânea de textos do Lobato para adultos, em que ele divaga sobre o Brasil e sobre o mundo. Em algum momento, você vai reparar que ele divaga também sobre você, tua casa, tua cidade...enfim, teu “mundo particularâ€. Depois da leitura, fiquei intrigada querendo saber o que será que Lobato diria sobre o mundo de hoje.

Em “moeda regressivaâ€, um dos textos que compõem o livro, acho que estão algumas dicas. Para Lobato, “há dois capitalismos, um que decorre naturalmente da existência da moeda e outro que decorre da manipulação da moeda (...) O segundo parece que é o grande mal, já que o vemos no fundo do armamentismo, da guerra preconizada como grande remédio, da usura, dos imperialismos, da subordinação das indústrias às finanças, do prodigioso endividamento dos países que hipotecam até a alma das gerações que só virão daqui a séculosâ€.

Em plena década de 40, Lobato parecia mesmo era estar discutindo o nosso mundo moderno. Na Miscelânea “Primeiro amorâ€, por exemplo, em que fala dos selos da Nicarágua, um dos mais belos selos do mundo, faz um importante relato do seu (nosso) tempo sobre o comportamento dos Estados Unidos em relação a essa “outra Américaâ€: “Tio Sam é expedito. Sabe como se lida com aqueles desordeiros do istmo. Arma uma facção política contra outra, bombardeia com os sacos de dólares, improvisa governos e, a sorrir como Gulliver em Lilliput, realiza a coisa dentro das mais rigorosas fórmulas constitucionaisâ€.

Lobato também mostra que era melhor inclusive que muito economista que hoje “pensa†o Brasil. Em “Pelo triângulo mineiroâ€, ele faz uma reflexão sobre políticas regionais de desenvolvimento. “Só o transporte suprime o regionalismo e, portanto, só o transporte nacionalizaâ€. Sim, Lobato estava nos anos 40 discutindo a infra-estrutura brasileira....O que diria Lobato sobre o nosso Plano de Aceleração do Crescimento?
Para concluir, e para o leitor não ficar cansado, vale a leitura de “Pearl Harbourâ€, outra Miscelânea, em que Lobato vai contar sua aflição pela falta de notícias sobre o ataque dos japoneses no Hawai. Ali, vai fazer uma colocação atualíssima: “A informação dos jornais é deficientíssima, porque sempre tendenciosaâ€.

Ah, só pra constar, Lobato citou por mais de uma vez H G Wells, chamando-o de profeta, “o novo Nostradamusâ€. Mas não seria Lobato também um profeta? Ou é o mundo mesmo que se apresenta como uma grande repetição do passado?

Em tempo, este livro que comprei é da 11ª edição, de 1964. Em livrarias, quase não achei exemplares para vender, só mesmo em uma: www.saraiva.com.br. Ainda bem!

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Thiago Camelo
 

Legal. Fiquei com vontade de ler. Tenho a coleção completa de livros infantis dele.

Thiago Camelo · Rio de Janeiro, RJ 16/3/2007 18:37
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Egeu Laus
 

É impressionante o papel de Monteiro Lobato na formação de leitores de uma geração (ou duas?)...

Egeu Laus · Rio de Janeiro, RJ 17/3/2007 00:35
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Edson Wander
 

Vanessa, você não citou, mas imagino que esta coletânea de textos do Lobato deve ter algum comentário dele sobre a política energética brasileira (leia-se petróleo) e seria interessante voltar a esse nacionalismo prafrentex do Lobato mirando agora a promessa de biodiesel. Paranbéns pela lembrança. Lobato é sempre fundamental, tanto pelo literato quanto pelo lúcido pensador brasileiro que também foi.
abraço,
EW

Edson Wander · Goiânia, GO 18/3/2007 20:24
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Vanessa FJ
 

Oi, Edson
importante sua lembrança. Lobato faz comentários sobre o petróleo em diversos livros, mas neste em especial, há coisas mais "sutis" sobre o petróleo e riqueza da terra, e que não ganharam um texto em particular. Mas na tentativa de satisfazê-lo, segue um trecho encontrado em "O Subsolo": "Uma rápida vista d´olhos pelo mundo só nos mostra riqueza e poder nos povos que industrializam o subsolo, dele tirando a hulha, o ferro, o petróleo e todas as mais riquesas entesouradas. Os que se limitam a arranhar a superfície por meio da agricultura, esses jamais serão estrelas de primeira grandeza, jamais serão poderosos, jamais passarão de satélites inermes. Até aqui vivemos como os demais bichos da terra, a explorar umas tantas plantinhas que crescem na superfície - a cana, o cacau, o café, o fumo etc - produtinhos coloniais. Temos de mudar de política. Fazer o que os Estados Unidos fizeram. Arrancar do seio da terra o ferro e transformá-lo em mil máquinas que nos aumentem a eficiência dos músculos (..)". Abs, Vanessa

Vanessa FJ · Florianópolis, SC 18/3/2007 21:38
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Vanessa FJ
 

ops., riquezas né

Vanessa FJ · Florianópolis, SC 18/3/2007 21:43
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Vanessa FJ
 

Egeu,
tenho dúvidas se a minha geração - nascida nos anos 80 ou quase nos anos 80 - teve de fato contato com o Lobato. Infelizmente, acho que muitos não tiveram a oportunidade dessa experiência ou puderam minimamente sair do básico como a Emília... Lobato, que eu mesma estou melhor conhecendo só agora, me parece muito mais que isso (sem querer desconsiderar a genialidade dos personagens infantis...). Abs,

Vanessa FJ · Florianópolis, SC 18/3/2007 21:45
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Juliaura
 

Escondem Lobato.
O vermelho de Lobato é Monteiro,
Do Chapeuzinho é um lobo matreiro.

Juliaura · Porto Alegre, RS 19/3/2007 11:55
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Fabiana Mesquita
 

Uma grande frustração que tenho é não ter lido Monteiro Lobato na infância (anos 80). Hoje leio Lobato para atultos e crianças, por que não?!

Fabiana Mesquita · Rio Branco, AC 19/3/2007 13:06
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Gugapa
 

Muito bom Vanessa! Legal revelar os "lados não lembrados" dos autores! Abração!

Gugapa · Florianópolis, SC 19/3/2007 20:38
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Higor Assis
 

Vanessa.

Fui muito cedo para morar em Taubaté eu nasci na década de 80 e naquela época ainda podiamos respirar "ares" de Monteiro Lobato, isso só no interior e pouco mais por causa do sítio do pica-pau amarelo.

Muito bacana seu texto, parabéns.

Higor Assis · São Paulo, SP 22/3/2007 10:35
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Manoel Moreno
 

Texto bonito e sensível. Você é jovem e pensa bem nas questões que, desde sempre, abalam o presente e desestruturam o futuro de várias gerações. Parabéns.

Manoel Moreno · Rio de Janeiro, RJ 22/3/2007 11:52
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FILIPE MAMEDE
 

É legal quando a gente se reencontra com essas coisas... Texto bacana e esclarecedor...muito bom.

FILIPE MAMEDE · Natal, RN 22/3/2007 13:07
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Egeu Laus
 

O livro Monteiro Lobato de Gian Danton em formato pdf pode ser baixado grátis aqui.
Aliás, alguns livros grátis também podem ser baixados aqui.

Egeu Laus · Rio de Janeiro, RJ 22/3/2007 13:25
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Egeu Laus
 

O Overmundo têm também um blog sobre livros do Fábio Fernandes, aqui.

Egeu Laus · Rio de Janeiro, RJ 22/3/2007 13:27
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Thiago Fragata
 

Vanessa, saudações!
Parabéns pela abordagem acerca da atualidade da palavra de Monteiro Lobato. Esse é um tema candente nas pesquisas. Dá uma olhada em http://www.overmundo.com.br/banco/monteiro-lobato-o-folclorista
Valeu!

Thiago Fragata · São Cristóvão, SE 22/3/2007 17:33
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Paulo Bi
 

Olá Vanessa
Quando moleque tive em mãos toda a coleção infantil de Lobato, incluindo as traduções e adaptações. Ao saborear aquelas aventuras, me transportava para o melhor dos mundos: o da fantasia!
Transferi esse patrimônio para meus filhos.
Sempre tive curiosidade de ler a obra adulta. Seu belo texto veio aguçar ainda mais minha curiosidade.
Parabéns!!!

Paulo Bi · Rio de Janeiro, RJ 22/3/2007 17:35
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André Gonçalves
 

"aprendi" a ler com Lobato.
é bom lembrar dele.

André Gonçalves · Teresina, PI 22/3/2007 17:55
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Hermano Vianna
 

publiquei este texto aqui:

http://www.overmundo.com.br/banco/caipira-hoje

que é uma declaração de amor às contradições da obra de Monteiro Lobato

Hermano Vianna · Rio de Janeiro, RJ 23/3/2007 00:16
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Caronte
 

Seu texto é um convite à leitura feliz e oportuno, porque certas lembranças sempre se fazem necessárias.

Diria ele que um país se faz com homens e livros. Talvez fosse imodesto mas sintetizaria melhor se dissesse que um país se faz com Monteiros Lobatos. Como qualquer ser humano, teve seus acertos e desacertos. Mas acredito que seu legado foi bem maior, e na verdade nós é que somos seus devedores, de algum modo. Devedores naquilo que conhecemos e devedores daquilo que dele desconhecemos.

Descubramos Monteiro Lobato! E Carpe Diem.

Caronte · São Paulo, SP 23/3/2007 04:10
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Tati Magalhães
 

Fiquei interessada em ler. Minhas experiências de Lobato são infantis e - olhe só - resultantes da tv, mais especificamente da antiga adaptação do sítio. Acho que fazia 3ª série do ensino fundamental e o episódio do minotauro me fez descobrir um exemplar na biblioteca da escola. A resposta da professora quendo pedi emprestado o livro: - é muito grosso e você não vai conseguir ler.
Sorte que sou teimosa e insisti. Mas isso é somente pra exemplificar a dificuldade que professores infantis têm de lidar com a leitura como prazer. E por obrigação, tudo se torna mais difícil e descobrir o universo de um autor, inclusive para além das suas obras mais famosas.

Tati Magalhães · Maceió, AL 23/3/2007 09:57
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acreucho
 

“Opinião pública só existe em lugarejos. Nas capitais desaparece substituída pela opinião que se publicaâ€

Nada mais atual que esta declaração de monteiro lobato, principalmente na parte em que ele diz ‘opinião que se publica’ impressionante como isso e atual principalmente aqui para meu estado. Em nosso país, temos dois brasis, o Brasil real e o Brasil virtual.
O Brasil real é aquele que sentimos todos os dias, das favelas, da violência, do caos na saúde pública, da corrupção desenfreada, da politicagem. O Brasil virtual é aquele que está somente na cabeça dos políticos, principalmente na cabeça do Lula, onde ele vê tudo cor-de-rosa, onde tudo está indo bem, onde o brasileiro nunca esteve tão bem.
Impressionante como Lobato era atual mesmo, já no início do século passado, agora temos que considerar que o mundo é uma bola, onde tudo vai dar sempre no mesmo lugar.
Aqui no meu estado, temos a opinião que se publica, pois, o governo domina toda a mídia, publicando o que quer e só o que quer.

acreucho · Rio Branco, AC 20/5/2007 12:24
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Eduardo Pereira ODÙDÚWA
 

Muito bacana, parabens!!!
Vote em nossa iniciativa: a criação da Primeira Biblioteca Comunitária Especializada em Cultura afr-brasileira e Africana no Subúrbio de Salvador - Bahia.

Eduardo Pereira ODÙDÚWA · Salvador, BA 26/4/2008 00:16
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