Marçal de Souza: memória de um guerreiro

REPRODUÇÃO
Marçal: “sou marcado para morrer, mas por uma causa justa a gente morre"
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Osni Dias · São Paulo, SP
28/11/2008 · 126 · 13
 

Após 25 anos de sua morte (25/11/1983), o líder guarani Marçal de Souza Tupã’i é lembrado pelos indígenas do Mato Grosso do Sul como um guerreiro que não foi derrotado. Em Atyguasu, grande reunião, realizada em outubro na Aldeia Campestre no município de Antonio João, a foto do líder ocupou lugar de honra no centro da tenda improvisada onde centenas de indígenas debateram a luta dos povos Guarani e Kaiowá pela demarcação de suas terras.

Nesse mesmo local, em 1983, Marçal foi brutalmente assassinado na porta de sua casa, aos 63 anos de idade, com cinco tiros, sendo um na boca, representando simbolicamente a tentativa de alguns setores da sociedade de calarem seu discurso em prol dos direitos dos povos indígenas. Sua voz, porém, ainda pode ser ouvida nas palavras de outras lideranças que seguiram seus passos e continuam lutando não somente pelas terras que lhes pertencem por direito, mas também por dignidade e respeito.

A vocação para proferir discursos inflamados já era evidente desde que Marçal começou a pregar o evangelho, após a conclusão do curso de Liderança Cristã, em Patrocínio, Minas Gerais, com duração de três anos.

Marçal atuou também como intérprete guarani-português, tendo a oportunidade de conviver com antropólogos e cientistas sociais, como Darcy Ribeiro e Egon Shaden, o que lhe proporcionou acesso ao conhecimento científico e cultural.

Mais tarde, afastando-se da igreja presbiteriana e discordando da postura da FUNAI, passou a viver intensamente suas raízes, afirmando: “quero viver com meus patrícios, defender o sangue que corre em minhas veias”. Passou a denunciar os desmandos da FUNAI dentro da reserva indígena, a venda ilegal de madeira, erva-mate e gado, bem como a venda de índias entre 12 e 15 anos, que eram engravidadas por brancos e, como opção de fuga, escolhiam o suicídio.

Marçal denunciou também a escravização de mão de obra indígena nas lavouras, por meio do sistema de adiantamento feito nos armazéns da companhia Matte Larangeira onde os índios, utilizando-se dos produtos antecipadamente, acabavam contraindo uma divida interminável, fato que impedia sua saída dos ervais.

Esses e outros problemas apontados por Marçal ainda são muito atuais, sendo discutidos em livro escrito pelo professor Laerte Tetila, em 1994, e também em documentário produzido por quatro jovens universitários, Ednaldo Rocha, Marcos Bonilha, Dalila Cividini e Leonardo Gordilho, que dedicaram seu trabalho de conclusão de curso ao tema. Desenvolveram um artigo científico, inscreveram-se em um Festival de Vídeo e receberam duas premiações pelo trabalho, em duas competições universitárias.

Essa repercussão confirma que a história deste mito não será esquecida e que não se restringe somente a Dourados ou ao estado sul-mato-grossense. Essa é uma luta de todos os povos indígenas e de todos os brasileiros. É a memória de um homem que lutou por direitos, pelo povo índio e pela raça humana.

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Ivette G.M.
 

Eu não conhecia a história deste líder. Ótimo texto e ótima lembrança porque precisamos conhecer nossos heróis.
Ivette G M

Ivette G.M. · Cotia, SP 27/11/2008 13:42
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Osni Dias
 

Oi Ivette, tudo bem?
Conheço a história do Marçal mas não conhecia tantos detalhes. Vindo para Dourados tive a oportunidade de conhecer suas filhas e acompanhar de perto a luta dos indígenas daqui pela terra. É uma coisa impressionante, só estando aqui pra saber, pois a mídia manipula a opinião pública. E o preconceito para com eles é algo inimaginável. O artigo vem em boa hora, mesmo com as hostilidades que aparecem com a sua publicação. Obrigado pela visita. Fico à disposição para quaisquer informações que vier a desejar. Grande abraço. Divulgue meu artigo, por favor.

Osni Dias · São Paulo, SP 27/11/2008 16:12
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Yerko Herrera
 

Amigo Osni, parabéns por este projeto necessário!

Abraços.

Yerko Herrera · Porto Alegre, RS 28/11/2008 09:18
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Osni Dias
 

Olá colega. Obrigado, creio que é uma pequena parte daquilo que podemos fazer por este país maravilhoso que um dia disseram que era nosso. Inda esse ano desejo produzir um material sobre um encontro indígena realizado em Antonio joão, em homenagem ao grande líder. Assim que finalizar, espero depositá-lo aqui e compartilhar com todos os interessados. Forte abraço!

Osni Dias · São Paulo, SP 28/11/2008 18:18
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O NOVO POETA.(W.Marques).
 

tema atual um exeqüente trabalho.votado.

O NOVO POETA.(W.Marques). · Franca, SP 29/11/2008 13:02
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Renata Machado Setti
 

Muito legal! Parabéns!
Como ele dizia "NÃO TENHA MEDO DO MEDO= ANI REKYHYJE KYHYJEGUI" líder Marçal tupã i guarani em 1980 na inauguração de ATY GUASSU=Grande Assembleia do Guarani, "ñamanoro jepe ani jaguevi ha jakyhyhe"

Renata Machado Setti · Rio de Janeiro, RJ 29/11/2008 18:15
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Osni Dias
 

É isso aí Renata. Em breve estarei postando vídeo sobre o último Ayguasu que aconteceu lá na Aldeia Campestre, em Antonio João, em 29 de outubro. Mantenha contato. Forte abraço. Osni

Osni Dias · São Paulo, SP 29/11/2008 19:43
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Nivaldo Lemos
 

Osni,
parabéns pela matéria; a memória de Marçal é de certa forma a memória de nosso continente latino-americano, desde Atawalpa, passando por Tupac Amaru, Chico Mendes e outra inúmeras lideranças que lutam dia-a-dia pelo direito à terra e a uma existência digna, contra a exploração.

Um abraço.

Nivaldo Lemos · Rio de Janeiro, RJ 29/11/2008 19:45
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Osni Dias
 

Pois é Nivaldo, estando aqui conheci muitos outros que tombaram em nome de um ideal e que a história ou não registrou ou acabou registrando por meio de um viés conservador, pela mídia local. Você bem lembrou os grandes nomes de latino-americanos que também deixaram seu registro por um outro mundo possível. Nossa tarefa é fazer o registro dessa história, ouvindo seus protagonistas. Obrigado pelas palavras, um forte abraço.

Osni Dias · São Paulo, SP 30/11/2008 19:41
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Doroni Hilgenberg
 

Osni,
Grande e consciente texto
Não o conhecia e que bom que o trazes até nós.
essas explorações acontecem até hoje.
Um absurdo!
Pelo tanto que fez, Marçal deve ser lembrado como um herói.
e a luta deve continuar...
bjs e votos

Doroni Hilgenberg · Manaus, AM 1/12/2008 11:19
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Osni Dias
 

Doroni, estamos todos juntos nesse grande barco. Se precisar de apoio por aí, creio que em breve estarei de malas prontas... Grande abraço pra ti e felicidades. Osni

Osni Dias · São Paulo, SP 1/12/2008 19:14
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Escritora Eliane Potiguara
 

QUE MARAVILHA ENCONTRAR ESSA RARIDADE DE TEXTO! QUE SERVIÇO PRESTADOS AOS DIREITOS HUMANOS DESTE LÍDER , PARABÉNS MEU IRMÃO DE LUTA E VERDADE, OSNI DIAS
SUA IRMÃ DE LUZ ELIANE POTIGUARA
aPROVEITA DÁ UMA OLHJADINHA NISSSO:
Olá como vai você? Sou Eliane Potiguara, escritora indígena e estou carinhosamente convidando vc a ler o meu texto sobre "Desenvolvimento indígena sobre perspectiva de gênero". Meu último livro é METADE CARA, METADE MÁSCARA, pela Global Editora com apresentação de Daniel Munduruku e Graça Graúna. Teria um prazer enorme em ser prestigiada por vc. Um beijo de Luz. Eliane Potiguara
CLIQUE NO LINK: http://overmundo.com.br/overblog/desenvolvimento-indigena-sob-perspectiva-de-genero

Escritora Eliane Potiguara · Rio de Janeiro, RJ 1/7/2009 12:12
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Osni Dias
 

Oi Eliane, obrigado pela sua generosidade. Após a apresentação desse trabalho recebemos dois prêmios em 2008 e a inclusão na programação do Festival de Corumbá, em 2009. è uma mostra de que Marçal continua vivo e presente em nossa memória e em nossos corações. Grande abraço

Osni Dias · São Paulo, SP 1/7/2009 15:33
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