Atualizado com os novos tempos, diretor gaúcho lança filme em quatro mÃdias diferentes simultaneamente
Carlos Gerbase faz parte de uma geração de cineastas que apareceu em Porto Alegre nos anos 90, com a intenção de colocar o Rio Grande do Sul no mapa nacional da Sétima Arte. Através da Casa de Cinema de Porto Alegre, esse grupo produziu obras-primas como o curta-metragem Ilha das Flores e apresentou para o paÃs cineastas como Jorge Furtado, considerado um dos mais interessantes realizadores do cinema brasileiro atual. Gerbase faz parte desse grupo e, mantendo a tradição, coloca mais uma questão para a produção nacional ao lançar seu novo filme 3 Efes simultaneamente no cinema, na TV, na internet e em DVD. "Só faltou a versão rádio", brincou ele, bem-humorado, com a reportagem do jornal fluminense O Globo.
Segundo a sinopse oferecida pela produção do filme, “3 Efes é uma comédia dramática que aborda as dificuldades – afetivas, financeiras e culturais – enfrentadas por um grupo de personagens que circula em torno de Sissi, uma jovem universitária que sustenta, a duras penas, o pai viúvo e o irmão pequeno. Nessa situação de dificuldade, Sissi recorre aos conselhos de sua tia, Martina, uma dona-de-casa entediada que, em meio a uma crise no seu casamento com o publicitário Rogério, fica irresistivelmente atraÃda por William, um simples catador de papel. Rogério também está em apuros: sua última campanha publicitária deu errado, e agora ele precisa dar um jeito de salvar seu emprego – de qualquer jeito. Assim, sob todas essas pressões do cotidiano, os personagens acabam tomando importantes decisões que vão mudar muita coisa entre eles – e também provocar algumas situações inusitadas".
O filme, que chegou ao público no dia 7 de dezembro, já pode ser visto pelo site www.3efes.com.br. Confira a entrevista exclusiva com o diretor Carlos Gerbase:
Roberto Maxwell - Do que fala "3 Efes" e como ele se conecta (ou não) com sua já relevante carreira como cineasta, músico e pensador de cinema?
Carlos Gerbase - Fala de 3 coisas básicas na vida de todos nós: a fome, o sexo e o fasma. Fasma é a nossa capacidade de representar o mundo pelas linguagens. "Sal de prata", meu último filme, era sobre a dificuldade que à s vezes temos de distinguir os fasmas da realidade. Este 3 Efes tenta mostrar como as linguagens estão estreitamente relacionadas com nossos instintos mais "animais", de modo que, à s vezes de forma engraçada, à s vezes de forma trágica, tanto a fome quanto o sexo nos levam a tomar atitudes difÃceis.
RM - Em que a opção pelo mini-DV afetou no processo de criação do filme? Além da viabilidade econômica, que "viabilidades estéticas" o suporte ofereceu a você, um cineasta com histórico de filmes em pelÃcula?
CG - As tecnologias digitais, de modo geral, tornaram possÃvel a realização deste filme. Desde a adaptação (com uma câmera Panasonic mini-DV que trabalha com pouca luz), passando pela edição (em ilha Final-Cut), até chegar à distribuição nas salas de exibição (no sistema Rain, que é totalmente digital). Se eu tivesse que captar, finalizar ou exibir em pelÃcula, o filme simplesmente não existiria. Além disso, só com uma câmera digital é possÃvel trabalhar com uma equipe tão pequena (8 pessoas no set) e filmar tão rápido (20 dias, no total).
RM - A estratégia de lançamento de 3 Efes chega pouco depois de toda a polêmica gerada pelo vazamento de Tropa de Elite na internet antes do lançamento oficial nos cinemas. O filme teria vendido milhões de DVDs e, portanto, sido prejudicado nas bilheterias. Por outro lado, é tentador comparar a sua estratégia com a de Steven Soderbergh no projeto Bubble que foi boicotado nos Estados Unidos e, de algum modo, foi considerado um fracasso. De que modo essas três experiências - Bubble, Tropa de Elite e 3 Efes - se conectam?
CG - Não vejo uma conexão direta. Tropa de elite custou 10 milhões de reais e foi distribuÃdo pela Warner. Seu sucesso não está ligado à pirataria, e sim à temática e à s suas qualidades cinematográficas. Bubble é um filme norte-americano, não sei seu orçamento, mas com certeza é muitÃssimo maior que 3 Efes, que foi filmado com 30 mil reais e finalizado (total da produção) com menos de 100 mil reais. 3 Efes é um pequeno filme autoral, que está sendo distribuÃdo em todos os veÃculos que demonstraram interesse e se mostraram economicamente interessantes. Sei antecipadamente, que o circuito das salas não dará lucro significativo. O filme fica uma semana em cartaz e pronto. Não vou ficar chateado quando ele sair. As pessoas vão poder ver na TV, na internet, ou em DVD. Pra mim, já é um sucesso.
RM - O jornal O Globo declarou, em sua edição on line, que o filme chegou ao público já pago e que, por isso, estará disponÃvel gratuitamente no portal Terra. Num momento em que se fala da viabilidade do cinema brasileiro enquanto indústria, podemos dizer que o senhor fez um bom negócio?
CG - É ao contrário. Ele chega ao público já pago porque foi comprado pelo Terra, pelo Canal Brasil e pela TV-COM. Acho que fizemos um bom negócio, para todas as partes envolvidas. Mas isso só foi possÃvel pelo baixÃssimo custo da produção. O mesmo esquema não se aplicaria a um filme de orçamento normal. Ou até se aplicaria, se, em vez do Canal Brasil, o comprador fosse a TV Globo.
RM - Para terminar, a "versão rádio" continua sendo uma opção descartada?
CG - Foi uma brincadeira durante a entrevista. Mas depois fiquei pensando nisso e faz sentido: não tem versão de filme para deficientes auditivos, com aquelas legendas especiais? Quem sabe no futuro não fazemos também filmes para deficientes visuais, ou simplesmente para quem quer "ver" um filme enquanto dirige? É uma boa...
Publicado originalmente em Alternativa.
Oi, Maxwell. Bacana a matéria. Já tinha lido algo sobre o 3 efes e achei muito curiosa a opção pela "legenda": fome, sexo e fasma - que transforma o terceiro (ou segundo) efe em efe implÃcito. hehe. Também gostei muito dessa idéia de fasma. Quero ver o filme para ver como o Carlos Gerbase explora isso.
Mas uma coisa o Thiago me lembrou de lembrar a vocês: acho que vale a pena introduzir o Gerbase no mundo da audiodescrição. Dá uma olhada nessa minha materinha aqui. Quem sabe ele não lança uma versão do filme com narração para cegos e alguém que queira "'ver' um filme enquanto dirige". hehe.
(Outra que descobri na apuração da matéria, conversando com o Cadu, foi que um cineasta canadense chamado McLaren, já chegou a lançar filmes para cegos. Não sei exatamente como são os filmes dele, mas fica aà a dica. Teve uma mostra sobre o McLaren há pouco tempo no MAM-RIO.)
Eu li essa matéria, achei bacanÃssima. Eu acho uma excelente idéia. Me deu vontade de fazer no meu Dekassegui. Será que eu consigo?
Roberto Maxwell · Japão , WW 19/12/2007 17:25hehe. Acho que é tranqüilo. Pelo que a Graciela contou, o sujeito que fez a audiodescrição do filme do Padre Marcelo Rossi fez de um modo bem caseiro, quase artesanal mesmo. Ele gravou uma faixa de áudio com a voz dele e depois inseriu como se fosse uma faixa extra de dublagem. Parece simples. É só ter disposição (para decupar e sincronizar tudo), sensibilidade (para montar o roteiro ou falar de improviso nos momentos certos) e um microfone acoplado ao PC. :)
Viktor Chagas · Rio de Janeiro, RJ 19/12/2007 17:47Acho que o cinema tá demorando até demais para largar mão da pelÃcula e partir para outros meios, até porque a arte não pode parar no tempo e se esquivar das novas tecnologias. Parabéns pelo trabalho.
Jan Moura · Cuiabá, MT 20/12/2007 11:29Muito boa a entrevista. Também estou com o Jan Moura. E a porposta do filme em versão para rádio é algo bem bacana também.
Higor Assis · São Paulo, SP 20/12/2007 12:13Bom mesmo. E a versão "rádio" ia estourar a fita!
Adroaldo Bauer · Porto Alegre, RS 23/12/2007 13:26
Muito boa a idéia de lançar o filme em várias mÃdias simultaneamente!
Gostei da entrevista também.
Oi Roberto, acabei de ver o filme do Carlos Gerbase e gostei muito. Jà tinha visto outras matérias, mas foi o seu artigo que me fez ir lá no Terra e assistir ao filme. É muito bom ver trabalhos como esse misturando vÃdeo digital com roteiros bem elaborados e espertos (à s vezes melhores do que os roteiros que são filmados por aà na forma "tradicional", com pelÃcula). Vale lembrar o seu próprio filme, o Dekassegui, e também o Cafuné feito pelo Bruno Vianna, que merecem os mesmos elogios (ambos estão disponÃveis aqui no Overmundo).
Enfim, parabéns pela matéria e para o Carlos Gerbase.
Olá, gente, bacana que as pessoas estão se interessando pelo texto e pela proposta do Gerbase. É interessante o espaço do Overmundo por justamente extrapolar o que as outras mÃdias falaram sobre o filme, ressaltando apenas o lançamento. Poder discutir a proposta é essencial, visto que no mundo atual, a notÃcia não é a obra de arte, somente, mas todo o processo de produção. Isso é de um ganho intelectual enorme para os consumidores (ou podemos dizer prossumidores?)
Abraços a todos.
ROberto,
Gostei muito. Vou mergulhar no assunto. Mesmo sendo leigo no assunto, acho que o cinema, muito em breve mesmo, será principalmente digital (todas as linguagens deverão ser digitais). Só devemos temer a precariedade fÃsica dos suportes 'modernos' (o caráter descartável deles é chocante)
Muito boa matéria.
Abs
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