Não é preciso vasto conhecimento da história do Hip-hop no Brasil pra saber que a coisa pegou fogo mesmo em São Paulo. Foi por lá que a Cultura se desenvolveu e conquistou uma multidão de adeptos desde meados dos anos oitenta. Na mesma época o Rio de Janeiro vivia um fenômeno diferente, diversos Bailes Funk levavam milhares de pessoas aos clubes espalhados pelo subúrbio da cidade. Em poucos anos, equipes de som como Furacão 2000, ZZ Discos e Pipo´s fizeram do Funk a música de massa da Cidade Maravilhosa.
Há quem diga que o Hip-hop não se criou muito por aqui porque o pancadão do Funk dominou as caixas de som nas favelas e periferias. Um dos aspectos que mais chama atenção na relação Funk/Rap é o distanciamento entre os dois estilos que, ao meu ver, compartilham mais semelhanças que diferenças. Ambos são música periférica, construÃda a partir de colagens de sons eletrônicos e produzida sem a necessidade de grande recursos. Quando, onde e por quê Funk e Rap começaram a andar em direções opostas?
No esforço de responder estas questões, o laboratório de pesquisas Olhar Periférico anuncia a descoberta do Elo perdido. Uma criatura em plena atividade que representa a mais orgânica ligação entre o Rap e o bom e velho Funk carioca. O responsável por essa junção atende pelo apropriado nome de Funkero. O MC acaba de lançar sua primeira mix-tape, Poesia marginal, disco no qual o rapper aprofunda sua proposta de fundir o Rap com o que o Rio tem de melhor, e eu não estou falando de samba.
Cria do Jardim Catarina (São Gonçalo), Funkero despeja suas rimas em bases construÃdas nas estruturas do voltmix e do tamborzão, as duas principais matrizes do Funk carioca. A produção fica por conta de Iky Castilho, que além das referências rÃtmicas, ainda recheia as músicas com sintetizadores caracterÃsticos dos primórdios do Miami Bass. É o caso de RelÃquia. Faixa que, embalada pelo refrão: “Da antiga relÃquia e funkero até morrer, deixa o som sacudir você, 100% lazerâ€, bombaria em qualquer baile.
Ligado a 220volts, Funkero constrói com destreza a ponte que liga os dois estilos com muita naturalidade. As letras lembram Mister Catra em sua melhor fase, passeando entre as crônicas que cantam a guerrilha urbana e histórias de noitadas Homéricas. Desde a parceria com o Menor do Chapa, aquele do “humildade e disciplinaâ€, lembra?, até a produção da mix-tape, o MC mais frenético do Rio elabora um estilo próprio e original. O grande mérito do Funkero é conseguir oxigenar a mesmice do Rap com a dinâmica do Funk.
Enquanto a cena do Rap amarga poucas festas, freqüentadas por um público restrito, o Funk segue bombando, literalmente, mundo afora. Fica aqui a torcida para que outros MC´s abram os olhos e consigam intensificar novas possibilidades de encontro da periferia com ela mesma. A aproximação não é apenas possÃvel, como muito bem-vinda. E, quando acontecer pra geral, aà sim o baile vai ficar uma uva!
Cara,
legal não deu tempo abrir os links por isto estou arquivando
para reler depois.
abraços
andre.
Afoice seu comentário foi no minimo deselegante para não dizer outra coisa ...
O funk carioca é um estilo/genero/ritmo musical e isso jah eh muito, e eh ... brasileiro.
Como em quase tudo na vida existem alguns funks sensacionais e outros ruins.
Nely Furtado e Madonna andam bebendo na fonte via Timbaland, mas não deve ser nada não.
Não vou nem comentar sobre o funk, os bailes e o que isso significa em termos sociais.
Gostei pra caramba do texto. A separção entre diversos ritmos é imbecil, pelo fato, de toda música pop ter sido gerada na Ãfrica. Música é música e ponto final.
Tem a boa e a má, basta a cada um decidir o que seus ouvidos desejam. Ah, só mais um adendo pra quem não curtir o Funk Carioca ouça o disco "Looking for the perfect beat" do mestre Afrika Bambaataa, que é o cara mais representativo do Hip-hop e vai ver o diálogo entre o Miami Bass e o Rap e, isso lá em meados dos anos 80.
xavi,
Mais um post na veia.
Passando de relance o papo do cervan, endossaria afirmando que, por razões óbvias, o próprio conceito 'música pop' só se tornou possÃvel porque houve escravidão (tiraram um número absurdo de pessoas muito musicais de um lugar e as espalharam pelo mundo. Deu no que deu, ponto)
Quanto ao cerne (muito compelxo) do seu papo, muito providencial também porque, a princÃpio, a base rÃtmica do Rap-HipHop era o mesmo Funk véio de guerra, logo, é óbvio que existem fatores extra-musicais influindo aÃ.
Mesmo sem mirar muito atiro em certos aspectos de nossa profunda crise social e sua geografia, atiro na cultura da violência surda e muda, atávica, estúpida enfim (contexto do Funk) e na proposta reflexiva e culturalmente menos visceral do Rap-HipHop (de contexto geográfico mais amplo, menos guetificado)
Cultura partida, diria. Rachadura, ditadura da violência que, ao que parece vem se agigantando por aqui (cala-te boca!)
Abs
Eu acho que a divisão em termos de ritmo/estilo/genero bastante interessante, não que eles não se interliguem e se misturem , muito pelo contrário.
Mesmo porque dentro de um mesmo ritmo/estilo/genero ainda existem os sub ...
Quanto a questão do pop, depende do que se chama de pop em contraposição ao erudito ? Em questão de tempo e refrão ? Em termos geograficos-territoriais ? Em questão a industrialização e as multinacionais (majors) ??
justamente, duda.
seria distração nossa não perceber as especificidades e diferenças que existem entre o funk carioca e o rap (filho da cultura hip-hop). da mesma forma como é bobagem ignorar as semelhanças e as possÃbilidades de encontro.
mas acho que esse debate passa meio por fora da questão da indústria cultural.
o que me deixa mais chateado é perceber que essa divisão acontece impulsionada por uma hierarquização das culturas/estilo/gênero. como se o rap fosse uma evolução do funk. uma lapidação musical, lÃrica, polÃtica e por ai vai. salvo as proporções é quase a mesma relação que se faz entre o grafitti e a pixação.
de um lado os favelados desordeiros e do outro os que foram "salvos" pela cultura hip-hop.
me lembrei deste: "qual a diferença entre o charme e o funk um anda bonito e o outro elegante"
Hierarquização me lembra estruturas de poder do tipo militar, urghhhhhhhhhhhhh .
Pode ser que eu esteja errado, mas eu acho que o momento-época-contexto em que o funk nasceu/projetou-se era completamente diferente do rap assim como o do funk-carioca mas as bases se comunicam.
Quanto ao grafitti e a pixação me lembrei de um fenomeno cada vez mais presente na sociedade de controle , a domesticação das massas.
Vou procurar mais informações sobre o Olhar Periférico (valia um link). Gostei da procura pelo "Elo" a partir do momento em que cada gênero segue seu caminho. O próprio ambiente periférico (majoritariamente) carioca no qual se desenvolvem colabora com que ambos, principalmente o hip-hop, não se apropriem tanto da ostentação praticada por artistas americanos.
Thiago Nogueira Martins · Salvador, BA 1/7/2008 00:31
Parabéns pela matéria. "Cria do Jardim Catarina" é?!. Gostei mais ainda. Vou repassar a matéria aos amigos por aquÃ. Funk do bom sempre é bem vindo. Vou ficar de ouvidos bem abertos.
Que o funkeiro seja bem vindo.
Abs.
Muito bom meu jovem amigo. Essas informações culturais a respeito dos estilos musicais são extremamente necessária.Como tamb ém está muito bem escrito.
Ecila Yleus · Recife, PE 19/8/2008 07:17Não concordo muito com sua visão de que o funk e o rap andam em direções opostas, ao contrário ambas são muito interligadas culturalmente, pelo menos aqui no RJ, o que acontece para mim é a visão unilateral da nossa mÃdia, inclusive a indústria fonográfica, que limita e padroniza as culturas que ambas possuem. Gostaria que você pesquisasse mais sobre o inicio da música eletrônica no Brasil, onde ambos estilos fazem parte, para entender a evolução de cada um deles num paÃs inteiro e não apenas em alguns estados.
Alicia Moreno · Rio de Janeiro, RJ 26/10/2008 01:02Já ouvi a Mixtape do Funkero e posso dizer que está realmente muito boa. Ele está sempre com a gente no "Hip-Hop Santa Marta" e no "São Gonçalo in Rap", é um cara que está fazendo um trabalho muito bom de divulgação e circulação por todos os espaços.
Candace · Porto Real, RJ 10/12/2008 13:43
João Xavi: parabéns, vou verificar cada um dos seus links e provavelmente voltar aqui para complementar meu comentário. Sou vidrado em crÃtica musical, fico extasiado quando vejo uma resenha bem feita de um trabalho musical que merece. Você fez bem. Que pena que termine ficando mascarado, por aqui, o conceito do "funk", pois muita gente quando ouvir essa palavra não vai nem pensar em James Brown, só pra citar um exemplo.
Há ainda uma outra questão social embutida nessa discussão que é referente à conotação sexual na música e dança pop, que também viajou nos porões dos navios negreiros. Aliás, uma demanda natural das pessoas, haja visto o contexto também da música baiana. Um assunto muito bom para nosso Spirito Santo?
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