O homem que filmou um mistério

O ano é 2000. Estamos em Vitória, numa viagem para o Conecom - Conselho Nacional de Entidades de Base de Comunicação. Somos todos estudantes de Comunicação Social, inclusive ele. Na praia, durante uma conversa sobre vários assuntos, ele diz que quer fazer um filme. Na época, trabalhava numa locadora e era apaixonado por cinema, entre os diretores prediletos, estava Almodóvar.

Nove anos depois, ele cumpriu a promessa. O documentário O mistério do Globo Ocular, rodado em Araguatins, a 601 Km de Palmas, é o primeiro filme dele. E, de cara, já foi escolhido no 4º Concurso DocTV Brasil e será exibido, em 2010, para todo o país pela TV Brasil.

Seu nome é Wherbert Araújo, 29 anos, jornalista, natural de Pedro Afonso, fã de cinema desde criança, conforme sua própria definição. “Na verdade sempre fui um apaixonado por cinema. Jornalismo foi a profissão que acabei seguindo porque minha família não tinha condições econômicas de me sustentar num grande centro para cursar uma faculdade ou oficinas de produção cinematográfica�, diz.

O primeiro filme a gente nunca esquece. É clichê, mas se aplica bem a Wherbert. Mesmo trabalhando antes na produção local da minissérie ALICE, da HBO/Gullane Filmes, rodada parcialmente em Palmas, e sendo premiado no Chico, o festival universitário de cinema do Tocantins, foi O Mistério do Globo Ocular a primeira experiência audiovisual assinada por ele que rendeu visibilidade local e que poderá projetá-lo nacionalmente.

A primeira exibição do documentário ao público foi em junho, em Palmas. Eu estava lá e me emocionei com a doença misteriosa que acometeu mais de 200 moradores de Araguatins, entre 2005 e 2007. Não se sabe como, mas quem se banhava no rio Araguaia, no cais da cidade, de repente, ficava cego.

O episódio marcou o Estado e atraiu imprensa, médicos renomados e curiosos. Wherbert era um deles. “Eu tive a sorte de ser repórter do Jornal do Tocantins e ter sido encaminhado para aquela cidade por diversas vezes para noticiar o problema. Com o passar do tempo, já fora do jornal, mas realizando várias viagens àquele município, percebi que muito daquela história ainda não tinha sido contada�, relata.

Agora a história roda o Tocantins em associações, oficinas de Direitos Humanos, e outros espaços voltados para a comunidade. Em setembro os personagens reais da tela serão, também, espectadores, já que o filme será exibido em Araguatins ainda este mês.

Mesmo com tanto rebuliço envolvendo, inclusive, cientistas mundiais, até hoje não há uma explicação para a cegueira em Araguatins. O filme não mostra a causa e nem propõe a cura – já que nem os cientistas conseguiram - mas trata do problema sob a ótica, sem trocadilhos, da comunidade: as perdas, o sofrimento, o curandeirismo e o bom humor, tipicamente brasileiro, mesmo nas situações adversas.

Polêmica o documentário já causou. Rendendo discussões políticas e sociais, além de opiniões controversas. Reações comuns a qualquer manifestação artística que instigue e provoque o público.

Para Wherbert o filme tem uma finalidade social. “Nosso principal interesse é agilizar o tratamento para as pessoas que aparecem no nosso filme e não tiveram o apoio necessário do poder público para seguir adiante. Existe também a intenção de se fundar uma associação de familiares e lesionados pela doença ocular de etiologia desconhecida. Nesta iniciativa, estamos apoiando incondicionalmente os idealizadores. Obviamente novas dificuldades e ações irão surgir e minha vontade como autor e diretor é continuar apoiando e brigando para que todos recebam o tratamento adequado�, frisa.


Produção
Cerca de 20 profissionais fizeram parte da produção de O mistério do globo ocular. Praticamente a mesma equipe que produziu o documentário Raimunda, a quebradeira, vencedor do 3º Doc TV pelo Tocantins e ganhador dos festivais Prêmio Ver-O-Peso do Cinema Brasileiro, Cineamazônia – Festival de Cinema e Vídeo Ambiental, I Guará – Festival de Cinema Ambiental e do prêmio Chico Mendes de Meio Ambiente.
“Optei por utilizar a mesma equipe, inclusive os profissionais que não residem no Tocantins, primeiramente porque todos são meus amigos e segundo pela qualidade observada naquele filme�, conta o diretor.

Na trilha sonora, a canção “Noites do Irã�, de Rodrigo Maranhão, ajudam a compor o enredo inexplicável do filme.