Segundo Nietzsche, toda interpretação é um esforço de dominação e de subjugação; é a necessidade de impor a um 'objeto' seu próprio significado. Mas já a interpretação 'genealógica', ela consiste na determinação da luta entre as forças interpretativas que tentam, apropriando-o, dar significado ao objeto.
A concorrência dos discursos que inflamaram o caso de Macabu, antigo distrito do MunicÃpio de Macaé, no Estado do Rio de Janeiro, acabou por influenciar a postura do jovem promissor à escritor, jornalista e posteriormente lÃder abolicionista – José do PatrocÃnio - a escrever: Motta Coqueiro ou a Pena de Morte. O livro datado de 1877, quando PatrocÃnio tinha seus 24 anos e, não era ainda conhecido da população geral, tráz o enredo sobre o caso de Manuel da Motta Coqueiro.
O desenrolar deste Romance de Tese, nos envolve sobre uma sociedade cercada pelos seus próprios mitos. A convivência pacata entre os moradores da região de Macabu tem fim, quando uma chacina acerca de fatos outrora cometidos se concretiza, para proclamar 'por força maior' a um único culpado.
PatrocÃnio desenvolve a história em capÃtulos recorrentes ao imaginário popular. A pesquisa é desenvolvida pela oralidade local, o que acaba instigando o leitor a imaginar a cena de um crime não cometido, digo, não determinado por quem corresponde ao delito.
A luta de classes entre Senhores de Engenho e a inveja da população excluÃda, quando ela almeja por melhores condições de vida gira em torno do ato final. A corrupção do magistrado, da ignorância e da agitação publica é o foco para a dar estrutura ao romance. No entanto, antes dessa agitação toda, coube ao escritor demonstrar o desapego de um amor não correspondido, sendo este, portanto, o passo inicial da execução das páginas amarelas.
O anúncio Grátis
Motta Coqueiro = vende-se na Gazeta de NotÃcias
Pobre do Motta Coqueiro
Pobre do triste, coitado;
Depois de Preso e julgado,
E à morte condenado …
Ser vendido – e a bom dinheiro!
Ai! pobre dele, coitado!
Pobre do Motta Coqueiro!
Triste doi o tirocinio
Da vida do desgraçado …
Mas depois de sepultado
Vir as mãos do PatrocÃnio,
É ser mal predestinado!
Então, escrito e escarrado,
Impresso, morto, enforcado,
Sofre o golpe derradeiro:
Vai pra as lojas ser vendido
E vendido a bom dinheiro …
Pobre Motta Coqueiro,
Coitado dele, coitado!
Depois da forca – vendido
Depois da morte – comprado!
Tony
Motta Coqueiro - Cadáver algemado
Os mitos criados acerca da literatura de autor, por sua postura abolicÃonista e por seu ideal libertador infelizmente não fizeram pulsar seu romance para o sucesso. No trecho acima é citada uma sátira ao seu texto, que propõem uma inversão de valor, porém nos dias atuais (fora do paradigma vivido daquela época) podemos verificar que o nobre escritor envolve os personagens com uma exemplar descrição dos fatos dessa sociedade.
A forca, a conspiração latente e a cena de sangue
O intenso conteúdo que PatrocÃnio desenvolve nos personagens é a enfase dos capÃtulos seguintes. São páginas compremetedoras com o mais próximo da verdade, todas escritas com minimos detalhes. “Alto, magro, com as faces escaveiradas e ictérias, marcadas por uma grande mancha arroxeada, as pálpebras entecerradas, completamente brancos os compridos cabelos, as sobrancelhas extremamente salientes e espontanes, e as barbas longas de sob as quais pendia-lhe de volta ao pescoço até a cinta, em torno da qual se enrosca, o baraço infamante; tinha mais a aparência de um mártir do que a de um celerado†- este era seu trunfo principal, Motta Coqueiro.
O lÃder abolicionista ilustra os detalhes destes personagens e seu envolvimento com a ação dos fatos do cotidiano. Sobre a conspiração latente ele traça todo um plano. A pessoa que lê este capÃtulo se imagina fazendo parte da trama e até pode se isinuar como um possÃvel inspetor. “Via-se-lhe na fisionomia, misterioso livro onde a consciência nos escreve dia a dia, hora a hora, a história de nossos atos; lia-se-lhe na fisionomia uma série de interrogações e respostas, no passar repentino da serenidade para a pertubarçãoâ€.
Das páginas seguintes do livro a que mais chama atenção pela singeleza e a concentração extraordinária de suas linhas é a do capÃtulo dedicado a cena de sangue. São palavras que estremecem o mais emparedado de sentimento.
“Alta noite, na hora em que a superstição prende sob os tetos os moradores do sertão, duas pessoas afrontavam corajosas as aparições de almas penadas e o ranges de dentes dos lobisomens. Como se uma das grandes nuvens negras, que escureciam o céu, tivesse descido à terra e deslizasse, cosida com as paredes, pela face da casaria do sÃtio; um vulto, que pulara a janela de uma das senzalas, aproximou-se a pouco e pouco da casa grande...
E os lábios da fera pousaram, e demoraram-se num beijo longo sobre a lâmina pálida e lanceada da arma. Era o Ãdilio do crime alumiado por um braseiro, a fazer lembrar as cenas que a imaginativa religiosa desenha nas grutas inflamadas do infernoâ€.
A imaginação se faz mais que presente no momento do crime, para o leitor. Entoando a linguagem mais simples possÃvel, o jornalista, explica com maestria a ação.
Toda interpretação que PatrocÃnio propõem do Ãnicio ao fim é de colocar o leitor defronte a estrutura toda do caso de Motta Coqueiro – da conspiração latente, de como se pagam os benefÃcios e a desafronta social. A trama toda extenua sua maior forma só depois de 25 anos, quando os mais antigos moradores da cidade de Macaé, mais precisamente da provÃncia de Macabu podem verificar o factual. Talvez seja desta data também que o ditado popular foi pela primeira vez exaltado aqui no Brasil - a justiça é cega mais não falha, será ?
Livro – Motta Coqueiro ou a pena de morte
Autor - José do PatrocÃnio
Livraria Francisco Alves Editora S.A / SEEC/RJ
Emtempo: Agradeço a Claudia Rangel, mais conhecida aqui neste espaço por Ilhaandarilha. Obrigado pela indicação!
Higor Assis · São Paulo, SP 17/4/2009 16:18
Higor, que legal que vc procurou o livro, achou e, principalmente, leu. Eu achei esse livro faz anos num sebo no Rio. Comprei por duas razões principais: estava praticamente de graça e era um romance histórico do PatrocÃnio, o que, por si só, já é interessante. Não posso afirmar isso, mas imagino que o Motta Coqueiro do PatrocÃnio seja o primeiro registro de literatura - verdade, gênero que aqui no Brasil ainda tem poucos seguidores. Pelo menos nunca ouvi falar de outro romance anterior que tenha as caracterÃsticas dele.
Fico contente que a minha indicação tenha rendido a vc essa reflexão boa sobre o PatrocÃnio e o caso Motta Coqueiro.
abraços!
Higor Assis · São Paulo (SP)
PatrocÃnio e o suposto crime da fera de Macabu
trabalho muito especial, verdadeiramente de mão cheia, de bom tamanho e uma verdadeira lição. Leva lá no alto o orgulho da gente pelo Primeiro autor, José do PatrocÃnio e o Segundo Autor, Higor Assis, que esta sendo quem realmente esta nos apresentando o caso.
Parabéns porque com certeza vai revitalizar a vida e a obra de José do patrocÃnio
Abração Amigo
Grande notÃcia, e melhor, certamente em re-edição, se encontrará
nas grandes livrarias.
- Agradecido pelo aviso,
um abraço
andré
Estimado Higor: faço minhas as palavras de Azuir e André. Um trabalho muito importante para alimentarmos o dia a dia da nossa memória. Espero também encontrar essa preciosidade aqui nas livrarias. Parabens.
graça grauna · Recife, PE 20/4/2009 13:23
Claudia, que que lhe agradeço a indicação. O que você escreve também me deu essa sensação. Não ainda conheço um outro livro da mesma forma que PatrocÃnio escreveu. Mas é iso ai, vamos aprendendo e por meio da internet divulgando conhecimento.
Amigo Azuir, obrigado pela passagem e pelo belo depoimento. É preciso fazer esse resgate mesmo. Você é bom nisso, em tuas poesias faz muito melhor que importntes escritores que temos pelo Brasil, parabéns mestre.
André, caso for ler e quando terminar me avise... podemos entreter sobre o caso.
Graça, que bacana que irá buscar essa referência também... depois me conte.
Higor
Todas Historia precisa ser recontada de tempos em tempos, porque se não se perde na memoria.
Parabens e sucesso!
Andre Luiz Mazzaropi
O Filho do jeca
www.andreluizmazzaropi.com.br
Não preciso dizer nada, a não que o seu trabalho é excelente, que trata de história de primeira categoria. A citação netzschiana é bem apropriada.
Juscelino Mendes · Campinas, SP 21/4/2009 11:40Trazendo pros dias de hoje, vemos que os valores morais em si nada mudaram.
wancisco franco · São Paulo, SP 21/4/2009 11:57
Vou ver essa preciosidade ...bela sinopse e parabens a Clauiudiapor ter indicado e voce aqui nos trouxe delicioso postado.
Vou atrás...
bjs
Agradeço intensamente aos amigos: André, sempre presente nos meus postados, obrigado. Juscelino, grata surpresa, obrigado pela pessagem. Wancisco, pela lembrança e minha amiga jornalista Cintia, pela leitura do texto.
Higor Assis · São Paulo, SP 21/4/2009 13:58
Higor, esses textos, como o seu e como o faz o Azuir, são importantes para recuperarmos laços perdidos na memória e outras vezes, até, trazer uma informação nova para quem ainda não a tem. Parabéns pela ótima resenha.
Ivette G M
Igor,
Otima resenha
Toda a conspiração merece ser revisada e trazer a tona os desmandos, a cultura e supertições que marcaram uma época.
bjs
Excelete e produtivo texto Assis
Deixando minha marca aqui
Um beijo
Higor que bela resenha, fiquei curiosa em ver o livro. parabens
sinva
Prezada Ivette, que bom que gostou. Fico muito feliz por sua comparação aos maravilhosos textos do amigo Azuir.
Doroni, sempre presente por aqui. Agradeço também imensamente seu olhar sobre o texto.
Ailuj, obrigado pela presença. Amiga Sinva, valeu pela presença e leia sim este bom livro.
Higor Assis · São Paulo (SP) ·
PatrocÃnio e o suposto crime da fera de Macabu
Amigo Poeta, Parabéns pelo Trabalho de beleza e de utilidade, para formar e instruir a nossa gente.
Abração Amigo e o reconhecimento de muito valor.
Abração Amigo
Gostaria de ler seu livro, em que livraria eu encontro? Moro no INTERIOR glauberiano elomariano da Bahia e não aprendi ainda a FAZER e nem a LER, aprendi apenas q minha ALMA não é PEQUENA e meu RITMO é PRECISO, e TUDO VALE A PENA no jogo 21 que eu Já JOGUEI, não concretamente.
Adla Viana · Vitória da Conquista, BA 24/4/2009 12:46
Super esclarecedor o seu texto e vc escreve muito bem, aproveito para fazer um link com vc no textinho abaixo, espero podermos ser parceiros, mesmo que eu esteja em outra área de atuaçõa. Veja e um bei9jo de luz:
Sou Eliane Potiguara, escritora indÃgena e estou carinhosamente convidando vc a ler o meu texto sobre "Desenvolvimento indÃgena sobre perspectiva de gênero". Meu último livro é METADE CARA, METADE MÃSCARA, pela Global Editora com apresentação de Daniel Munduruku e Graça Graúna. Teria um prazer enorme em ser prestigiada por vc. Um beijo de Luz. Eliane Potiguara
CLIQUE NO LINK: http://overmundo.com.br/overblog/desenvolvimento-indigena-sob-perspectiva-de-genero
Um trabalho béim-feito, como pouco se têêêm visto no Overmudo.
Parabéins.
Caso não conhessa, e eu ricomendo:
Fera de Macabu - A História e o Romance de Um Condenado À Morte - Carlos Marchi - Editora Record - 1998
Receba o meu voto, que é umildi - mas dado com adimirassão.
Abraço.
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