Tarde de sexta, 20 de julho. Enquanto parte da equipe do Revelando os Brasis montava o telão na praça da igreja matriz de Monsenhor Gil, pequena cidade a 56km de Teresina, os meninos da cidade se alvoroçavam querendo saber que novidade era aquela. Puxei conversa e em minutos já era tia pra lá, tia pra cá. Paulo, Felipe e Cláudio, todos com 11 anos, nunca entraram em um cinema e ficaram surpresos ao saber qual o filme que estaria em cartaz na praça naquela noite:
“-Eeeeeita, é o filme do ‘seu’ Noronha. Eu conheço ele, e conheço seu Zé Coelho, ele é amigo da vó; já até dancei o Balandê no colégio”, disse o Paulo. Cláudio completou: “Eu dancei também, até levei uma queda lá no meio, porque tava me sacudindo demais”, contou, às gargalhadas. Felipe, mais calado, só observava o movimento.
À noite, por volta das 18h30 as primeiras pessoas começaram a chegar, alguns sentaram logo, outros ficaram dando voltas em torno do caminhão, as crianças curiosas foram chegando mais perto e logo ganharam uma tarefa: ajudar a distribuir os folderes do projeto e flyers do Overmundo entre os presentes.
Lá pelas 19h, chegou a grande estrela da noite, Luís Pereira de Andrade, o mestre Zé Coelho, 84 anos, mestre do balandê e do baião. Animado, revelou que estava orgulhoso da “festa” que estava acontecendo na cidade onde nasceu e se criou. “Eu tô satisfeito e agradeço ao doutor Antóin Filho, que ele toma conta de mim direito. Por causa desse filme dele eu já fui pra Brasília, pro Rio de Janeiro, pra Fortaleza e não gastei um tostão, eu agora sou um cidadão brasileiro. Não careço de mais nada não”, disse, já cercado de gente.
Sentado na primeira fila, ‘seu’ Zé assistiu ao documentário Balandê-Baião, que conta a história de sua vida e da dança que ele eternizou em Monsenhor Gil. Nas primeiras cenas, as senhorinhas que estavam perto apontavam: “Oí, é o seu Zé Coelho. Ó ele ali sentado, aquele veím ali, ó”.
Lembranças da infância
Os mais velhos da cidade lembram da dança como brincadeira de infância, relembram as músicas e contam que o filme os faz voltar no tempo. Também gostam de ver seu Zé Coelho sendo homenageado.
Dona Maria Teresinha de Jesus, 54 anos, mora a mais de três quilômetros da praça onde o filme foi exibido. Arrastou a filha e mais uma amiga e estava orgulhosa de ver sua cidade na telona. “Seu Zé é o homem mais famoso de Monsenhor Gil, todo mundo aqui está feliz com esse filme do Noronha porque é um jeito de mostrar a cultura da cidade, essa dança que só existe aqui. Tinha gente que nem lembrava mais como era e quando viu o filme sentiu vontade de dançar de novo, é uma brincadeira muito boa, muito bonita”, disse.
O agricultor Agnelo da Conceição se arrumou todo para ir assistir ao filme dos amigos Noronha e Zé Coelho. Ele também já dançou o Balandê e afirma que antigamente as danças eram mais animadas, mais bonitas de se ver. “Eu acho importante esse trabalho de lembrar as brincadeiras que a gente fazia quando era criança, admiro isso. Assim os jovens vão poder saber mais sobre a cultura do lugar onde a gente mora. Se não fosse esse filme, a dança ia se acabar e ninguém mais ia saber dela”.
O amigo Abdias Assunção concorda e diz que viu muita gente que não via há tempos na praça assistindo ao filme. “Todo mundo queria ver, tem gente que veio de longe só pra isso. É uma dança que faz a gente lembrar de quando era pequeno e é bom ver os meninos pequenos aprendendo, tem menino de dois anos que já começa a se balançar quando vê os mais velhos dançando o Balandê”.
“Eu vi o sol, eu vi a lua, eu vi o dia clarear”
Depois do filme, a festa. As cadeiras do cine Revelando foram arrastadas para as laterais da praça, que virou um terreiro de dança, alumiado por lamparinas à base de querosene.
Mulheres de todas as idades usando lindos vestidos rodados e homens cheios de ginga mostraram a beleza do Balandê-Baião. A banda Eita Piula assumiu a animação da festa, contando com a participação de moças da cidade nos vocais, e em poucos minutos um grupo enorme de gente dançava pela praça. Durante mais de uma hora a poeira subiu e não teve quem conseguisse ficar parado.
O pernambucano Artur Gomes dos Santos, autor de Tropeiros, acompanha a equipe do Revelando os Brasis em alguns municípios e conta que ainda não tinha visto tanta folia nas exibições. “Sempre que posso eu acompanho o pessoal do Revelando e vou colhendo imagens por aí. Não vi em outros lugares uma festa bonita como essa”, comenta.
Mestre Zé Coelho, tocando seus gafanhotos - uma espécie de castanhola, com formato diferente - lá pelas 23h, reclama: “Ô povo mole, dança duas horinhas e já ta reclamando de cansaço. Pra me acompanhar tem que dançar é a noite toda”.
O Projeto Revelando os Brasis, parceria entre o Instituto Marlin Azul (ES) e a Secretaria do Audiovisual do Ministério da Cultura, está viajando pelo país desde maio e já passou por 61 cidades. Aqui no Piauí aconteceu o encerramento da “turnê” dos 40 vídeos selecionados em sua primeira edição.
Em Monsenhor Gil e Teresina foram exibidos “Balandê/Baião”, de Antônio Noronha; Tropeiros (PE), de Artur Gomes dos Santos; Pipa, Praia em Poesia (RN), de Mary Land de Brito Silva; Esperança (CE), de José Welliton Moraes e Uma Pescadora Rara no Litoral do Ceará (CE), de Sidnéia Luzia.
O Overmundo está acompanhando as exibições em vários Estados, leia mais nos textos com a tag revelando-os-brasis.
Nas próximas horas, mais fotos.
Perdoem a má qualidade do vídeo, foi feito com minha máquina fotográfica, à noite, com pouca iluminação. Somando isso à minha falta de jeito, o resultado é esse aí...
Mas pelo menos dá pra ter uma idéia da dança!
beijos gerais
Natacha, eu tinha lido meio ás pressas, voltei pra copia o vídeo e lhe parabenizar, e votar claro.
Mas "este afago que nos concede o poder intelectual", dizia João Pequeno, o agnóstico do meu lugar, é que vai fazer o Brasil se iniciar. Quando o intelectual vê os outros saberes; se identifica com quem sabe e ensina algo; admira-lhe, ouva-lhe a grandeza - se inicia a perpetuar uma identidade brasileira, que salve o negro e o índio, não tem o Brasil. E é isto um abraço, andre
Natacha.
Sou de Belém do Pará, terra de muitos sons, muitos ritmos, de lendas que são contadas perfumadas com o perfume do nosso cheiro-cheiroso. Confesso, desculpe, que eu não conhecias o Balandê/ Baião.
No momento, no entanto, isso pouca importa. O fantástico de tudo é o teu excelente texto que além de encantar nossa imaginação, nos permite eternalizar no nosso coração mais uma cultura musical do Brasil.
Parabéns.
Há muito não vou ao teu Estado. Conheço Terezina. Terra quente de clima e de amor. Passei férias em Parnaiba, de praias lindas, areia branca e de coqueiros de formatos fascinantes bisbilhotando o mar.
Parabéns, por essa aula de cultura.
Abraços
Noélio Mello
Menina!!!!!! que coisa boa!
lindas as fotos! mestre Zé Coelho me parece um show..
bem bonito mostrar a cultura e a sabedoria popular, são nossas raízes preservadas e celebradas.
parabéns, Natacha!!!
beijão
Esse tipo de projeto é muito importante.
Belo texto!
Belas fotos!
Abraços.
Oi queridos!
Pra mim foi uma experiência muito rica ver o balandê lá em Monsenhor Gil, totalmente diferente de ver em Teresina, onde eles dançam "pra se apresentar".
Lá foi a festa deles mesmo, no terreiro deles...
Tô terminando de escrever a entrevista que fiz com o Mestre Zé Coelho, devo postar no fim de semana.
beijos e obrigada pelos coments, votos e visitas
Ah, Noélio, sou apaixonada pela tua terra, amo de paixão tudo o que o Pará tem (e casei com um paraense, hahaha)
Muito bom Natacha. Realmente essa iniciativa do "Revalando os Brasis" vêm dando o que falar não é mesmo? Muito bonito ver essas pessoas tendo contato com o cinema. Um abraço.
FILIPE MAMEDE · Natal, RN 27/7/2007 11:01As fotos deixam um gostinho de "eu queri estar lá"... queria mesmo era ter visto você balaiando!! =****
Biá Boakari · Teresina, PI 1/8/2007 21:57
Que beleza, Natacha. Dá orgulho ser piuiense. Parabéns, belo texto. E lindas fotos.
Bjs
Ah, consegui ver o vídeo. O ritmo é realmente maravilhoso e a agilidade de seu Zé Coelho com o cafanhoto é inacreditável, na idade dele! Adorei.
Bjs
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