O vôo livre de Valéria
ENTREVISTA: VALÉRIA OLIVEIRA
Por Itaércio Porpino e Marcelo (Panela) Tavares
O canto de Valéria Oliveira continua rompendo barreiras geográficas. Depois do Japão e SuÃça, a cantora e compositora potiguar se prepara para mostrar seu talento nos Estados Unidos. Ela foi selecionada para participar de um dos maiores festivais de música do mundo, o “South by Southwestâ€, no Texas. Nessa entrevista, Valéria fala, entre outros assuntos, sobre a importância desse evento para sua carreira, do mercado de música em Natal e de sua porção compositora. Veja a entrevista.
SOLTO: Entre “Impressões†(1997) e “Leve Só as Pedras†(2007) são exatamente dez anos. O que mudou em seu trabalho nesse tempo?
VALÉRIA OLIVEIRA: Eu acho que cada disco meu foi um grande aprendizado. Eu me cerquei inicialmente dos melhores profissionais que encontrei na cidade, que estavam em sintonia com o que eu estava fazendo naquele momento. Eu fui tomando consciência de uma série de coisas em relação à música que eu fazia. Ao longo do tempo fui descobrindo que tipo de música me atraia mais, além disso, o ouvido foi ficando mais apurado e as referências foram se afunilando. Pessoas muito importantes da música também chegaram muito mais perto de mim. Eu tive um contato maravilhoso no Japão, que muito contribuiu também para o amadurecimento da minha carreira e que resultou em quatro discos. Conheci novas referências e novos músicos. Foi uma vivência muito interessante até chegar ao ponto de eu me sentir preparada para compor. Eu acho que aà foi realmente a grande virada. Eu fui amadurecendo, me sentindo mais segura pra mostrar minhas composições, sentindo a necessidade de participar dos arranjos das músicas, de ouvir as sonoridades que me interessavam, que permeavam a minha cabeça de um forma inevitável. Foi tudo saindo ao mesmo tempo, a letra, a melodia, a harmonia que eu queria, o tipo de interpretação que eu estava a fim de fazer, os arranjos que eu estava a fim de colocar.Tudo isso está sendo um momento muito especial na minha vida.
SOLTO: Quanto ao mercado, quais foram as mudanças?
VO: Nos primeiros trabalhos independentes a gente sentia muita dificuldade, porque não era fácil fazer com que esses discos e músicas chegassem até o público. Mas à medida que o tempo foi passando ganhamos experiência e confiança, além, é claro, de começar a despertar para uma coisa que nós à s vezes esquecemos. Ou seja, a nossa promoção enquanto artistas. Por isso, uma coisa que hoje eu estou trabalhando muito é a ampliação da minha rede de contatos, além de produzir materiais de qualidade para apresentar em feiras e eventos relacionados à música. Hoje em dia eu estou muito mais consciente de que a gente precisa se preocupar não só em fazer a música, mas também em como promovê-la, como fazer para que essa música chegue até as pessoas. E o que ajudou muito nesse percurso todo, sem dúvida nenhuma, foi o advento da internet e todas as ferramentas que ela agrega (dos sites de relacionamento ao myspace). Estamos completamente disponÃveis para as pessoas que curtem música, desde pesquisadores, produtores, caçadores de talento e músicos. Hoje você disponibiliza todo o seu material com muito mais facilidade e rapidez, o que antes era muito mais complicado e demorado. Nesse sentido, isso evoluiu bastante, sem falar na própria criação. A música hoje está menos enjaulada, está mais solta. Você hoje pode brincar, pode experimentar, você tem muito mais liberdade de fazer música.
SOLTO: E essa decisão de mostrar o seu lado compositora? Foi uma coisa planejada ou fruto de um processo natural, de uma maturidade musical?
VO: Na realidade, não foi bem uma um decisão minha. O Yoshida pediu pra colocar letra numa melodia que ele tinha. Então lá mesmo no Japão eu escrevi. O nome da música é “Flor da Felicidadeâ€, que está no CD “Imbalançaâ€. Aliás, ele sempre dizia: a gente podia compor, vamos fazer alguma coisa sua. Quando estive na SuÃça a história se repetiu. Conversando com um produtor, ele me sugeriu a mesma coisa: você podia fazer um trabalho autoral. Quando eu cheguei em Natal, depois dessa viagem, eu me encontrei com Simona Talma e Luiz Gadelha. E entre uma conversa e outra, Luiz me cobrava: “Poxa, vamos fazer uma música!â€. Então, começou a pintar essa coisa mais forte de fazer. Mas foi meio sofrido, confesso. Eu não me achava capaz de compor. Morria de vergonha de mostrar, era uma limitação muito forte. Era insegurança mesmo. Hoje quando estamos (eu, Simona e Luiz) produzindo, fazendo música, é uma coisa tão boa, tão prazerosa. A gente já se compreende. Aliás, foi uma das melhores coisas que aconteceu pra mim, porque a partir disso foi que minha carreira se transformou e está indo pra um lugar que eu desejo, que eu gosto. Posso me colocar de uma maneira mais sincera no trabalho, sou eu 100%. Eu me lembro que quando a gente fez a primeira rodada do “Projeto Retrovisor†a distribuição era mais ou menos a seguinte: de uma lista de 20 músicas, 15 eram covers e cinco autorais. A gente ri muito porque hoje em dia são 19 autorais e um cover. Mas eu continuo interpretando músicas que eu gosto. Nos shows eu sempre coloco três, quatro, cinco.
SOLTO: Qual o peso que o Projeto Retrovisor teve em sua trajetória musical?
VO: O Projeto Retrovisor foi, pra mim, um marco porque ele cumpriu uma função muito importante na cidade. Eu não vou dizer que tudo que está acontecendo hoje é reflexo do projeto, mas essa mudança na carreira dos cinco componentes e de mais alguns artistas é palpável. A gente sobe no palco hoje e não tem o menor problema de cantar nossas músicas. É uma coisa tão natural, tão gostosa. Aliás, existe um projeto que eu gostaria de citar, que é o “Poticantoâ€. Eu acho que é um dos projetos mais importantes da cidade. A proposta é muito legal. São cantores ou compositores-cantores locais cantando outros compositores da cidade. É uma proposta totalmente autoral. É preciso ter muita coragem pra fazer um projeto desses aqui em Natal.
SOLTO: Você acha que o músico acostuma mal o público cantando músicas de gente consagrada? Porque o público reage muito bem às músicas que ele já conhece, mas fica apático, muitas vezes, quando ouve uma composição nova, principalmente se é de um autor local.
VO: É comum a gente ouvir por aÃ: “o povo de Natal não valoriza o artista da terraâ€. Mas eu faço a seguinte reflexão: se o público não tem acesso à essa música, como é que ele vai gostar? Tem que acontecer um rompimento. Eu acho que nesse sentido o Projeto Retrovisor veio também para marcar presença nessa história da virada, e algumas outras iniciativas como a Rádio Universitária FM, a Rádio Cidade e alguns projetos musicais, mas não é suficiente. É preciso que realmente as pessoas que estejam ligadas à cultura na cidade sejam pessoas mais abertas nesse sentido, com esse mesmo desejo de mudança.
SOLTO: De que forma você está se mexendo para mudar isso?
VO: Eu estou me mexendo o tempo todo. Ultimamente tenho trabalhando bastante. Eu venho aprendendo muito, venho me cercando de pessoas que pensam pra frente, que têm um pensamento muito positivo, uma visão muito mais ampla de mercado, que não só é o mercado local. O meu trabalho, o meu esforço hoje em dia, está sendo todo nesse sentido. Natal é uma cidade em que eu adoro morar, adoro viver. Participo, na medida do possÃvel, de algumas coisas pontuais que acontecem, de outras eu deixei de participar por uma questão de condições dignas para o artista. Hoje eu tenho um certo grau de exigência para realizar o meu trabalho. Eu quero poder subir num palco, ter um som bacana, não é nada demais, é simplesmente ter condições favoráveis para apresentar o show do jeito que a gente ensaia, de maneira adequada. É um respeito até pra quem está lá assistindo, seja para cinco ou mil pessoas.
SOLTO: Em Natal você tem encontrado oportunidades para realizar um trabalho do jeito que você quer?
VO: Muito poucas. É por isso que meu foco está mais voltado para fora, mas quando aparece uma boa oportunidade aqui a gente vai e se apresenta, como aconteceu no Encontro de Escritores, no ano passado. Ou então nos shows que a gente mesmo produz, como os que aconteceram na Casa da Ribeira e no Teatro Alberto Maranhão, de divulgação do “Leve só as pedras†(disco mais recente da cantora, de 2007). Eu ainda pretendo passar, se possÃvel, mais um ano divulgando o “Leve só as Pedrasâ€. Ele já foi lançado em São Paulo, no Teatro Crowne Plaza, e também em Fortaleza, na Feira da Música.
SOLTO: Foi em Fortaleza que apareceu a oportunidade de você participar de um dos maiores festivais de música do mundo, o “South by Southwestâ€, nos Estados Unidos. Como isso aconteceu?
VO: Essa oportunidade da Feira da Música foi muito bacana porque a gente já sabia mais ou menos o que podia encontrar por lá. Além do lançamento do disco, nós fomos preparados para fazer negócios, para aprender, para participar da programação do evento. É tanto que uma das atividades mais importantes da qual participamos foi a rodada de negócios internacionais. A gente sabia que ali tinha produtores, representantes de gravadoras e distribuidoras. Por isso organizamos com todo cuidado o nosso material, afinal, precisávamos estar preparados para alguma oportunidade que surgisse. Passaram nessa rodada internacional mais ou menos 50 artistas e dentre eles fomos escolhidos para falar com o diretor artÃstico do festival. Ele informou que o nosso trabalho se adequava ao perfil do festival e sugeriu que fosse inscrito no “South by Southwestâ€. Aliás, de uns três anos pra cá o festival está se abrindo para outros estilos, porque antes era mais voltado para o rock. Centenas de artistas e bandas de todo o mundo estarão por lá. Serão mais de 1800 apresentações, em 80 palcos espalhados pelo centro de Austin, capital do Texas. O festival será realizado de 13 a 22 de março de 2009.
SOLTO: E as despesas com a viagem? O festival vai ajudar de alguma forma?
VO: Esse é um fato importante para ser colocado. O festival não banca a ida do artista. Os organizadores consideram o evento uma grande vitrine, afinal, todo o mercado musical (produtores, donos de gravadora, músicos, etc) de várias partes do mundo, estará reunido por lá. Portanto, eles querem ver até que ponto o artista está disposto a investir em sua carreira. Querem ver se você vai ter essa disponibilidade toda para sair do seu paÃs e participar do festival. Eu já tenho alguns parceiros muito especiais que colaboram com o meu trabalho, que fazem parte da minha história, da minha carreira e que possivelmente também irão nos ajudar. Mas também a gente precisa de novas parcerias e, principalmente, de um crédito do Governo do Estado e da Prefeitura de Natal. Um crédito e ao mesmo tempo um estÃmulo, afinal, a gente está indo representar o Estado.
SOLTO: Até onde você pensa em chegar com seu trabalho?
VO: A gente produz na intenção desse produto chegar às pessoas. Seja através de shows, discos, entrevistas. Então o meu desejo é que o meu trabalho seja conhecido. Eu não tenho grandes pretensões. O que eu gostaria é que se uma gravadora se afinasse com o meu trabalho, a gente pudesse produzir discos. E que esses discos pudessem chegar até as pessoas, que eu pudesse viver deles e que a partir disso eu pudesse fazer mais shows. Temos um mercado muito restrito aqui, como a gente vai viver disso? Queremos fazer shows, queremos estar no palco, queremos cantar para as pessoas, falar do nosso trabalho, trocar experiências com outros artistas. É isso que a gente busca: estar inserido no mercado de música de alguma forma.
Veja mais: www.soltonacidade.com.br
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Onde posso conseguir material da Valéria para ouvir?
Aluisio Gonzaga · Belo Horizonte, MG 10/1/2009 13:08
Achei bem conduzida.Prepara algo sobre a entrevista, tipo uma breve biografia. Este pessoal precisa ser melhor conhecido. Melhor mostrada a "raça" com que ele luta para sobressair.
abraço
andre.
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