O negócio é o seguinte: se você olhasse um leão na sua frente (considerando que tenha a improvável sorte de não ser devorado), e algum tempo depois visse um outro leão (considerando que seja realmente rabudo de não ser devorado mais uma vez), você saberia dizer se era o mesmo leão ou um outro? A não ser que seja um domador, um zoófilo com tendências suicidas ou um funcionário do jardim zoológico (ou as três coisas juntas, vai saber), você dificilmente saberia dizer. E dificilmente sairia vivo, claro.
É esta a indagação que dá titulo ao espetáculo Os Leões, da companhia curitibana A Armadilha, eleito um dos grandes destaques no Fringe (mostra paralela do Festival de Curitiba que de paralela não tem nada, uma vez que é promovida pela própria organização do festival oficial). A montagem está em cartaz até o final deste mês na unidade provisória do SESC Avenida Paulista, e faz parte do projeto Primeiro Sinal, em que o SESC apresenta produções de grupos jovens em inÃcio de carreira, possibilitando uma maior visibilidade para novos talentos. Tinha que ser o SESC.
Na trama, dois homens vivem dentro do mesmo apartamento e conversam sobre banalidades. Destas banalidades surgem pensamentos que, apesar de desconexos, vão sendo incorporados a diálogos absolutamente improváveis, em um clima surrealista delicioso criado pela dramaturgia obscura do espanhol Pablo Miguel de la Vega y Mendoza (não parece nome de personagem do Zorro?). De fato, o texto é um dos pontos altos da montagem - os outros principais pontos são a direção competente e a cenografia simples e bem elaborada. Só a iluminação peca um pouquinho pelo acende-apaga um tanto excessivo, embora este seja um detalhe bastante sutil e relevável. Confesso: tenho trauma de Natal e não gosto de pisca-pisca.
As atuações de Alexandre Nero e Diego Fortes oscilam entre o clima surrealista proposto pelo texto e algumas leves escorregadas para um naturalismo televisivo vicioso, mas nada que comprometa a qualidade da montagem e muito menos o dinamismo do texto, que entre tantos vaivéns, déja-vus, diálogos e situações improváveis, causam na platéia a confusão proposta pela metáfora do tÃtulo: é difÃcil de se dizer se estamos de frente para dois ou apenas um homem que não toma café. Um desafio interessante para um grupo que se propõe a trabalhar com um texto que não parece ser de tão fácil digestão.
Na saÃda, divido o elevador do antigo escritório administrativo do SESC com dois jovens "culturetes" que comentam sobre a crÃtica que acabaram de ler no mural, dizendo se tratar da primeira incursão de Nadja Naira na direção. "Por isso então que é essa droga", conclui a garota, em uma espécie de compreensão sarcástica. E o rapaz que a acompanha ri. Particularmente não tive a mesma impressão, saà do teatro satisfeito com o que vi e intrigado por um texto leve e instigante, embalado pela voz de Billie Holiday que ainda ecoava na minha cabeça.
Originalmente publicado na Revista Bacante.
MaurÃcio Alcântara · São Paulo, SP 14/6/2007 18:37
Caro MaurÃcio,
Por oportuno: o nome do Zorro era Don Diego de la Vega...
Salve a moçada do teatro de Curitiba!
Abç
A.
Oi Aldo,
Então foi por isso que me veio à cabeça de cara o Zorro, hehehe... Eu não sabia o nome dele de cabeça...
Quanto ao teatro de Curitiba, salve salve!
Grande abraço!
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