Continuação do livro A CHAVE DE MICHELANGELO

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sergioRS · Canoas, RS
1/12/2006 · 9 · 0
 

— Compreende agora, Max, o meu temor em abrir este sarcófago? Estariam os homens preparados para os terríveis mistérios que esse livro contém? Veja bem, eu ainda não lhe contei tudo... Amenófis IV acumulara tanto poder e conhecimento oculto, que sua mente tornara-se pervertida ao extremo. Assim ele saqueava os povos vencidos aplicando-lhes os suplícios mais atrozes, não poupando nem mesmo crianças, das quais aproveitava para seus ritos mágicos. Segundo o pergaminho, o sacrifício de meninas virgens proporcionava-lhe enormes poderes místicos, além da compreensão humana; foi este faraó que, usando de magia, enfeitiçou e destruiu o homem mais sábio do mundo — o Rei Salomão. Usando de magia sexual, fez com que o velho rei de Israel fosse seduzido pelos encantos de sua filha, a princesa egípcia Aksulamim — uma jovem comum que, por feitiços de seu pai, tornou-se a mulher mais bela da terra naquela época. O coração do sábio rei fraquejou perante a visão de tanta beleza, permitindo assim que a filha de Amenófis IV invocasse os mesmos poderes místicos de seu pai causando a ira de Deus sobre Salomão e a conseqüente divisão do reino de Israel.
— Professor, antes de responder qualquer pergunta, temos que ter certeza de que o livro esteja aí dentro, tudo isso pode ser apenas uma lenda, o senhor não acha? Vamos abrir o sarcófago.
— Max, você tem razão, não há motivos para ficarmos nos martirizando. Me ajude a abrir o sarcófago.
Usando de uma ferramenta como alavanca sobre a parte inferior da abertura do sarcófago, este vagarosamente cedeu e abriu-se em duas partes.
— Por Deus!, olhe Max, o Livro de Ouro de Lagahs!
O ancião teve que segurar-se nas bordas do sarcófago — suas pernas haviam fraquejado. A face do jovem iluminou-se, enquanto sua mão adentrava o casaco em busca de alguma coisa.
— Professor, passe-me o livro...
O velho não lhe deu atenção — estava absorto em seus pensamentos, até que tomou uma decisão:
— Vamos levá-lo para o Museu Britânico, Max...
— Professor... eu disse passe-me o livro!
O egiptólogo virou-se para o assistente, seu sorriso estancou no momento em que viu o revólver apontado para ele.
— Max, o que isso significa? Estava totalmente perplexo.
— Sinto muito, professor, mas há coisas que o senhor não compreenderia. Sempre com os olhos voltados para a antiguidade, o senhor nunca reparou no brasão de minha família?
— O que tem a sua família a ver com esta descoberta?
— Isto! — O jovem segurou a arma com a mão esquerda mostrando-lhe o sinete em seu dedo anular — talvez o senhor ainda não esteja compreendendo, mas eu vou esclarecer: lembra-se do que me disse há pouco, que os manuscritos eram de uma antiga sociedade secreta? Pois bem, de certa forma eu sou membro dessa seita!
— Pare de brincadeiras, Max, você nem é judeu! — disse irritado o professor.
— O senhor está certo, eu não sou judeu — sou um inglês de antiga linhagem, mas o que me admira é que como estudioso que é, não consiga se aperceber da dinâmica da vida — o senhor acha que todos os mistérios de Lagahs ficaram ocultos nesse livro e encerrados até o dia de hoje? Não, professor, está enganado... É verdade que terríveis mistérios outrora perdidos agora serão revelados, mas também é verdade que existiram, como ainda existem, outros magos além de Amenófis IV, que agora, exatamente, agora, em nosso tempo se dedicam a aperfeiçoar o conhecimento oculto passado de geração à geração entre os iluminados.
— Mas com que objetivo? Por que este segredo? A perplexidade dera lugar à inquietação no espírito do velho estudioso.
— Qual o objetivo? Ora, professor, não seja ingênuo! Conhecimento é poder, quanto mais exclusivo, mais vigoroso; mais aumenta a força de quem o detém, veja o emblema da fênix de duas cabeças nos estandartes de Alexandre, o Grande, Carlos V, Napoleão... Você acha que o poder que eles alcançaram foi por acaso?
— Meu Deus — exclamou o velho — isso é uma loucura!
— Não, professor, não há espaço para a loucura. Os conhecimentos secretos foram guardados de geração em geração por milênios, e reis, príncipes, sacerdotes e magos conquistaram seus poderes por meio dele. A própria ciência deve muito de seu progresso a fagulhas desse conhecimento, reveladas aqui e ali a alguns sábios, conforme melhor serviam a nossos propósitos. Veja o caso de Pitágoras: a própria história registra que foi em uma sociedade secreta no Egito que ele alcançou o seu saber.
— Isto que você está me dizendo é algo próprio de uma mente megalomaníaca, nenhuma conspiração poderia durar tanto tempo!
— Não vamos nos estender mais, professor! Basta que eu lhe diga que sou apenas uma pequena engrenagem a serviço de um grande e milenar propósito. Nós, os Filhos de Set, herdeiros dos antigos mistérios e guardiões dos conhecimentos secretos, nos preparamos desde o início dos tempos para a Grande Revelação, mas é com tristeza que eu reconheço que, apesar de nossos redobrados esforços, o mundo ainda não está pronto para Absalão. É possível que os requisitos sejam completados somente no século vindouro.
— Absalão, quem é Absalão?
— Chega de perguntas, professor — disse o assistente, apontando o revólver já engatilhado para a cabeça do velho — infelizmente terei de matá-lo, o senhor sabe muito a nosso respeito, mas olhe pelo lado positivo: não existe lugar melhor no mundo para a morte de um egiptólogo do que dentro da tumba de um faraó, o senhor não acha?
— Max, não faça isso! Você não é um assassino!
— Sinto muito, professor! Eu mesmo não gostaria de fazer isso, o senhor não merece morrer, mas infelizmente, sabe muito a nosso respeito, e eu arriscaria muita coisa em jogo, deixando-o viver.
— Que seja breve então — disse fechando os olhos resignando-se ante a tenebrosa realidade. Minha neta, eu jamais a conhecerei, amargurou-se o velho.
Um som produzido por um jarro sendo quebrado trouxe o egiptólogo de volta de seus últimos pensamentos. Ao abrir os olhos, Max Fuchon estava inerte, caído sobre o que restava de um valiosíssimo vaso da oitava dinastia. A seu lado, Tarik, um dos nativos da expedição, com um objeto dourado que tremulava em suas mãos.
— Eu não poderia deixar que ele — disse apontando a lança ensangüentada para o corpo inerte do assistente — tirasse sua vida, professor, não depois que o senhor salvou meu filho levando-o para ser curado em Londres.
— Tarik, em toda minha vida eu nunca fiquei tão feliz em ver um objeto egípcio como eu fiquei agora. Onde você conseguiu essa lança?
O ajudante da expedição indicou então uma estátua dourada do deus Osiris, com uma armadura de guerra completa, porém desfalcada da lança.
— Professor, o que o senhor pretende fazer agora com o livro?
— Tarik, pelas revelações que tivemos até agora, e por tudo que acabou de acontecer aqui — o olhar triste do velho fixara-se sobre o corpo sem vida de Max Fuchon — este livro provou ser muito perigoso para que nós deixemos que ele caia em mãos erradas. Minha missão será fazer com que ele nunca seja encontrado.
Os imensos tesouros do faraó foram enviados para o Museu do Cairo, cujo curador agraciou o Dr. Albert Raidech pela descoberta, com algumas peças de pouco valor. Quanto à morte de Max Fuchon, as autoridades egípcias ficaram gratas a Tarik por ter impedido o roubo de belíssimas jóias encontradas providencialmente nos bolsos do assassinado assistente.

Este livro pode ser encontrado na Livraria Cultura:
www.livrariacultura.com.br

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