Inquieto, esquisito e performático, Marcelo Gandhi, 30, é daquelas pessoas que despertam diferentes reações imediatas nas pessoas. Artista multimÃdia, único do Rio Grande do Norte selecionado pelo Programa Rumos Itaú Cultural de Artes Visuais 2006, não vai sossegar enquanto não abrir uma janela para o mundo do próprio jardim. Seja pelo visual andrógino ou por suas obras sempre provocadoras, uma coisa é certa: ninguém passa batido quando topa com esse potiguar de Parnamirim.
Arredio à primeira vista, logo solta o verbo e a verve ao interlocutor mais atento. Quando questionado sobre algum aspecto social contemporâneo, ou mesmo o meio cultural, Marcelo Gandhi não perde a chance de ligar sua metralhadora: "Sabe porque nossa arte (potiguar) não tem nenhuma repercussão lá fora (além fronteiras)? Simplesmente pela falta de referências. Nossa 'regionalidade' é falsa, vem a reboque do que anda acontecendo em estados vizinhos. Em Natal, as pessoas esquecem da obra e correm atrás do retorno rápido a todo custo, mesmo que na base da concessão", atira sem perda de tempo.
Há dez anos militando nas 'trincheiras', Gandhi diz que suas "coisas" são mundiais e não globalizadas. "O problema não é morarmos em uma cidade pequena do Nordeste brasileiro, e sim não assumirmos nossa vocação vanguardista. Ao mesmo tempo em que o pensamento provinciano limita a criação, e impõe a assimilação de um pop massificado, feio e burro, a cidade tem toda uma importância histórica dentro do contexto do Poema/Processo (movimento surgido em 1967, simultaneamente em Natal e no Rio de Janeiro, e que posteriormente ficaria conhecido por Poesia Visual). Encaro Natal como um poço de contradições: de um lado todas as possibilidades do mundo, do outro a consciência de que estamos longe...", remói o artista, cujo trabalho em muitos momentos lembra a arte imprevisÃvel de Farnese de Andrade.
Licenciado em Artes Visuais pelo Departamento de Artes da Universidade Federal do RN, Marcelo Gandhi crê em soluções alternativas como 'desorganizações' organizadas a partir de fóruns na internet (citou uma lista que reúne bandas de rock). "Temos que abrir o leque, misturar música com artes visuais, poesia e performances teatrais. Nada de querer agradar os outros, vejo o artista como um pensador e não como um bobo da corte que precisa ser aceito, ser popular", diz o artista. "Estamos ilhados pela 'lado A'. A cidade precisa de gente freqüentando o 'lado B', e ele existe! TÃmido, mas existe!!".
Um dos três vencedores do IX Salão de Artes Visuais da Cidade do Natal, realizado em dezembro de 2005, prefere não ser visto como um pessimista, e sim um realista que gosta de falar e fazer. "Discurso é uma coisa, prática é outra. Natal precisa sair do meio do caminho, parar de vampirizar o que é dos outros e transformar do seu modo tudo o que está rolando. Prefiro observar o movimento dessa 'realidade'... e agir no momento certo. Quer compor, componha. Quer lançar um disco, lance. Uma coisa puxa a outra", afirma com a propriedade de quem lançou o único CD demo duplo do Brasil com 30 faixas autorais pelo dueto Évora (foto, Gandhi está em primeiro plano de óculos), onde divide as experimentações com o guitarrista Dallys.
O registro das 30 músicas, na verdade, serviu para fechar outro ciclo de mais uma de suas investidas musicais: primeiro veio Duo Vox, depois Flávio Frankestein, Marcelo Gandhi e os Ernestos, Deva e, por fim, o Évora. "Costumo dizer que lanço bandas póstumas", diverte-se sem perder o tom de seriedade e firmeza.
Se diz execrado pelos Beatles e amaldiçoado pelos Stones, porém influenciado por Hermeto Pascoal, Björk, Zé Celso Martinez Corrêa, PlÃnio Marcos e bandas minimalistas canadenses, Gandhi planeja criar um novo grupo em 2006 (ainda sem nome), sempre prezando pelo experimentalismo e pelo conteúdo autoral. "Primeiro o trabalho tem que agradar a gente, depois o mundo. Essa é minha maneira de contribuir para a derrubada do falso moralismo que engessa a produção artÃstica aqui e ali. Natal é uma cidade muito louca: na galeria de arte uma mostra de excelente nÃvel, enquanto nas ruas falta de respeito com o patrimônio histórico e arquitetônico impera."
Este ano, além das intenções musicais, o artista também pretende aproveitar a oportunidade de expor no Rumos de Artes Visuais. "Quero mais é continuar ligado com o mundo, conectado a pessoas e tentando viver nesse turbilhão - aparecendo e desaparecendo. Meu desejo é continuar morando aqui, e daqui conseguir fazer com que minha arte tenha repercussão mundial. Os meios de comunicação estão aà para isso", finaliza.
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