Sonorizar um filme sem som é um paradoxo que se complementa. Se pensarmos que o paradoxo não tem um sentido determinado, mas que os sentidos são colocados a prova e vividos a medida que vão emergindo, a sonorização ilumina novas perspectivas para o cinema então silencioso. Foi o que o Kuarteto Mococa mostrou na Mostra 300 anos de Cinema: Da Lanterna Mágica ao Digital, realizada na Cinemateca Brasileira, entre 07 a 22 de setembro. No total foram três sonorizações, Tempestade Sobre a Ãsia (1928), do russo Vsvolod Pudovkin, e duas raridades do alemão Fritz Lang, Depois da Tempestade (1920) e Corações em Luta (1921).
Os três dias de apresentação contaram com boa presença de público na sala BNDES da Cinemateca Brasileira. A sincronia da música com o filme era tamanha que o a presença dos músicos ao lado da projeção não era percebida. O olhar da platéia era para a tela. A atenção era ampliada com a complementação de som e imagem. As percepções iam e vinha com a melodia. Toda angustia da cronologia de Lang em Depois da Tempestade era preenchida com a música. As disputas de Corações em Luta, também do alemão viajavam com os acordes da sonorização. A ideologia do russo Vsvolod Pudovkin explodia em arranjos quebradamente harmônicos.
Quando a fúria se apossou do Pastor que aplicava sua vingança, em Tempestade Sobre a Ãsia, o Kuarteto se aproveitou das sobreposições de imagem criadas por Pudovkin para criar um clima de tensão em toda sala. Foram mais de duas horas de ação cinematográfica e musical. A ideologia do russo era extremamente marcada pelo baixo e os efeitos produzidos por Artur. Se aproveitando da boa fotografia do filme, as melodias do teclado do Maestro Coelho e do saxofone de Conrado suavam de forma a colocar o espectador dentro do quadro.
Para trabalhar as sensações conflitantes de Lang e do cinema impressionista alemão o Kuarteto mostrou toda sua versatilidade. As fugas de Depois da Tempestade ganharam ritmos e sentimentos nas harmonias e sonoplastia do grupo. Com as improvisações de percussão de Guilherme a tensão se tornava presente na sala. Todos os sentimentos e confrontos propostos em Corações em Luta estavam nos a acordes de Maciel e na harmonia da flauta de Conrado, que preenchia qualquer espaço vazio da pelÃcula. A indecisão e apreensão da escolha estavam perfeitamente sincronizada pelos teclados.
A sonorização é um acompanhamento do enredo, sendo uma evolução do comentador, uma figura que apareceu já no teatro do meio do Séc. XIX. Com a chegada do cinema surgiu o bonimenteur, que usava, além da voz, discos no som do vitafone para complementar a imagem. Depois da consolidação da indústria cinematográfica se estabelece o ofÃcio de músico de cinema. Alguns filme já saiam com partituras e discos para sonorização, tornando a prática popular. ImpossÃvel também não relacionar este fenômeno a ópera, onde a música conta a história.
Kuarteto Mococa na Cinemateca Brasileira | https://vimeo.com/75487030
Post Completo | http://antimidiablog.wordpress.com
Sobre o Kuarteto Mococa
O Kuarteto Mococa surgiu em 1997, tendo suas primeira apresentações na Mostra Internacional de Cinema, organizada pelo crÃtico Leon Cakoff naquele ano. Posteriormente o grupo correu o Brasil sonorizando filmes do cinema impressionista alemão num projeto do Instituto Goeth. Através da música a banda se aproveita do clima da cena cinematográfica para provocar sensações e sentimentos. Os músicos seguem um tema, mas com total liberdade para improvisação e variações do mesmo. Como resultado cria-se uma atmosfera harmônica na sala de projeção, onde som e imagem se complementam.
Atualmente o grupo é constituÃdo de cinco músicos com influências bem distintas. O Maestro Coelho de Moraes possui formação musical clássica, além de ter cursado filosofia. Luis Antonio Maciel é artista plástico e fotógrafo, e sua guitarra tem forte ascendência para o blues. Conrado Pereira trás na flauta e no saxofone toda universalidade da música com a compreensão de sua formação como psicologo. Com melodias rasgadas, os efeitos do baixo do professor de história Artur Bez dão o ritmo da obra. Através do violão de Guilherme Giordano ecoam todos os sentimentos possÃveis, vindas da MPB e sua faculdade de história.
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