O mito é um discurso e seu enunciado reproduz uma "história feérica" da sociedade; os heróis suprem o imaginário popular através da ascensão ou dos feitos grandiosos cuja função é inocular na "alma coletiva" os sÃmbolos e signos que envolvem os sujeitos sociais.
A narrativa mÃtica ajusta-se a cada época, momento polÃtico e poder central, ratificando uma ideologia e uma gama de significados.
A imanência do mito deve-se a sua diacronia significativa, ou seja, a sua atemporalidade semântica. O mito não encerra uma fala centrada no tempo (passado, presente ou futuro); posto seja o resultado de uma ressemantização contÃnua.
A imagem mÃtica suscita também uma forma de poder que se mantém viva através do inconsciente coletivo, que é a camada mais profunda da mente humana. Nessa atmosfera amorfa em que pairam todos os pressupostos constituintes da sociedade; pairam também os mitos, que assumindo um formato reticular integram sub-repticiamente toda a diversidade abstrata do pensamento humano. Tomemos como exemplo a figura de Tiradentes. Sua imagem não encarna o ideal de liberdade ou democracia; antes estas caracterÃsticas só se tornam patentes quando as analisamos a partir de uma hagiografia mÃtica, ou seja, sua imagem só permanece no inconsciente coletivo porque está envolta em uma transcendência, isto é, na sublimação de sua aparência.
Nilson Lage aludindo Roland Barthes diz o seguinte: "o mito como unidade do discurso: signo lingüÃstico apropriado para significar outra coisa, de modo que instaura uma duplicidade de entendimentos, inocenta as violações à regra social e a mantém viva ainda quando desmentida pelos fatos." (Nilson Lage, 2001, 76).
Assim sucede aos heróis e à constituição dos brasileiros e do acreano; pois a duplicidade significativa destila tantos sentidos que a assimilação mÃtica só se torna possÃvel com a criação de novos mitos. É uma "invenção" invariavelmente cÃclica que se deixa eternamente interpretar; com isso temos que ver o mito com um olho na sociedade que o produziu e outro olho nos demais mitos que permeiam o contexto social, porque é dessa ambigüidade que ele se nutre.
O mito fundador do Estado do Acre
A história acreana não está centrada nos sujeitos coletivos (seringueiros, Ãndios), estes são meros coadjuvantes encenando uma história que é engendrada por outrem. O seringueiro é apenas um nome, semantizado em um desvão de nomes: são apenas emblema do ofÃcio que executam, são "coisas", são sujeitos reificados.
A figura do Ãndio está inclusa no velho preceito evolucionista que os coloca num patamar de inferioridade em relação aos outros indivÃduos, não atendendo ao estereótipo do herói que se deseja materializar para a história.
A sede pelo portento, pelo maravilhoso instaura algo que não se prende no tempo; por isso a figura do herói é tão importante para a configuração do mito, porque ela encarna a aura de um povo.
O mito fundador acreano não se firma com a chegada de Neutel Maia no final do século XIX; e, sim com a luta entre brasileiros e bolivianos que finda com a assinatura do Tratado de Petrópoles em 1903.
Figuras como Plácido de Castro e Galvez passam a fazer parte do imaginário coletivo, constituindo-se em verdadeiros mitos identificatórios de um povo e de uma cultura.
São heroificados sob a égide de interesses e para a manutenção de uma memória coletiva. Ora, para a coesão do Território do Acre fazia-se necessário a elevação de sujeitos individuais para a "arquitetura sÃgnica" e historiográfica de uma coletividade cheia de ambigüidades e visões antagônicas. Portanto, a proposição "mÃtico-ideológica" tem a função de suavizar as dessemelhanças, instaurando por meio de sÃmbolos, Ãcones e Ãndices formas sutis e aparentes de realidade.
Plácido de Castro é uma figura marcante da história acreana, exemplifica a partir de sua existência a convergência simbólica de que se nutre uma gama dispare de pessoas. Forma-se um arquétipo mÃtico no qual todos os cidadãos vêem ressaltadas, sem duplicidade, as qualidades e o vigor audaz dos acreanos, isto sem contradições ou erros. É o passado presentificado a todo momento cujo objetivo é criar uma unicidade inconteste.
Sua imagem firma-se como insÃgnia da luta, da força e da valentia; torna-se uma espécie de semideus pairando na secularidade do tempo e vivo nos sentidos mÃticos que o heroificam para a eternidade.
A Florestania constitui um mito, que através do discurso polÃtico tenciona unificar toda a sociedade sob sua égide. Deseja-se construir uma identidade a partir da configuração regional; entretanto, um pressuposto fica patente nesse enunciado: não é a Florestania que se afirma, mas a legenda partidária que a utiliza como retórica discursiva de seu governo. Portanto, a Florestania é uma fala mÃtico-ideológica que se propõe a criar sÃmbolos identificatórios e ordenar discursos polÃticos, salvaguardando suas oposições.
Parque da Maternidade
A construção semântica se dá também com a criação de espaços de lazer. O Parque da Maternidade representa um marco, um sinal de mudança que sempre remeterá ao governo Jorge Viana.
O mito não é apenas um discurso ordenado e homogeneizador; é visÃvel a partir das estruturas que o comportam e validam.
Estes espaços são o "pão e circo" modernos, porque têm o papel "lúdico-catártico" do convencimento aparente; são antes manutenção da fala do que aplicabilidade democrática, isto é, são espaços sÃgnicos de poder.
Semióforos midiáticos
A imagem televisiva é um processo vicário do real, transcendendo-o. Os semióforos midiáticos apoiam-se na verossimilhança para criar seus mitos e montar seus discursos.
Cria-se uma fidelidade platônica com a imagem em contraposição às incertezas práticas do real, ou seja, a imagem vale mais do que a objetividade do real.
O grande inconveniente dos semióforos midiáticos e que precisam ser ressemantizados continuamente, atendendo aos interesses dos grupos de poder.
Portanto, os semióforos televisivos são simulacros discursivos que estão assentados numa suprarrealidade imagética, que se baseia na sublimação do real.
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