Ruas de Brasília, distanciamento e isolamento

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José Braga · Brasília, DF
22/9/2008 · 44 · 1
 

As ruas de Brasília, Plano Piloto, são distantes. Indo de ônibus para São Paulo, passando por pequenas cidades pela madrugada, vemos a proximidade entre a casa e a rua. Em Brasília, há a distância. Este distanciamento entre sua e casa, comércio, escola, é reflexo de um distanciamento social, e daí vem a frieza que se acusa em Brasília.
Nasci em Brasília, morei alguns anos fora, e as relações pessoais em Brasília também são distantes. A questão é: o distanciamento das relações pessoais provoca o distanciamento espacial ou o distanciamento espacial gera o distanciamento social?
Não tenho uma resposta definitiva para isso, mas partindo da teoria de Marx, Lukács, Korsch, Nildo Viana, podemos pensar que é necessário ir mais longe, ver a totalidade. A categoria de totalidade é fundamental para não isolarmos estes dois fenômenos - distanciamento espacial e distanciamento social. Na verdade, há uma origem histórica de ambos. A organização espacial de Brasília precede as relações sociais e pessoais contemporâneas. E tal organização espacial nasceu sob o signo de uma arquitetura stalinista, do controle, da existência de um panóptico urbano, para usar expressão foucautiana. O panóptico urbano, quem vem se generalizando, tem Brasília como um modelo incompleto, pois falta as câmeras nas ruas para filmar os pedestres e a população. Mas é um olhar disciplinador e o espaço tem a distância como forma de não-comunicação e não-organização. A não-comunicação se vê no vão, no vazio, no espaço que separa. A não-organização é resultado dessa não-comunicação. Brasília é como se fosse um edifício gigante, no qual cada um vive sua vida isolada em seu apartamento e nem conhece ou se relaciona com o vizinho do lado.
Brasília, templo da distância, templo do poder, templo da burocracia. A minha cidade, onde nasci, vivi grande parte da minha vida, onde cresci, onde estão minhas referências, meu passado, minhas lembranças, meus sentimentos. Por gostar, apesar da sua essência separatista, digo minha cidade. Mas será minha cidade? Não foi produzida por mim e para mim. Mais uma cidade do capital, mais uma capital a serviço do capital.

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Eloy Santos
 

Conheci Brasília em meados dos anos 60. Era uma friagem social terrível. Um distanciamento em tudo. Passados os anos, nada mudou.
Acho que esse seu trabalho merece uma ampla discussão aqui no Overmundo. Espero e faços votos para que isso aconteça.
Brasília foi construída pelos "candangos", trabalhadores que, terminada cada obra, não podiam por os pés nela. Não tinham ascenso social para tanto.
Vinícius de Moraes dá uma pungente idéia disso no poema que dedicou ao operário em construção. Dedicou ao Jesus-trabalhador?
Meus cumprimentos pela visão social e pelo trabalho que você nos expõe.

Eloy Santos · Rio de Janeiro, RJ 24/9/2008 16:09
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