P/Bosco Martins
A Morte chegou pelo interurbano na voz da amiga, vinda de Ribeirão Preto. De repente, num final de um mês de maio, a noticia calou fundo entristecendo nossos corações: o "mestre" ja havia partido. Fragmentos da memória, os tempos de redação, fizeram boiar um mar de lágrimas, como no poema de Vinicius. Ainda sob impacto da emoção, no escritório em Campo Grande, choramos por um longo tempo, até recuperar-mos parte de momentos vividos com ele. Foi como foca, ainda na década de setenta que iniciamos na profissão com uma geração de jornalistas, que me encantava e era mÃtica para mim. Era o tempo de O Diário e O Domingão, em Ribeirão, do Ex-, do Aqui São Paulo, entre outros alternativos que marcaram época sob sua orientação. Foi ainda neste tempo e lugar, que o Pena Branca nos introduziu na amizade e aprendizado da profissão através do Sérgio e seu sempre "anti curso" de jornalismo diário. Desta forma, um anônimo e aprendiz, como tantos que passaram por seu caminho, teve o privilégio e a sorte de poder conviver com verdadeiros "mitos " ou simplesmente jornalistas de "carne e osso" como: Hamiltinho Almeida Filho, Edmilson Martins, Tarso de Castro, João Garcia, "o Sombreiro," José Hamilton Ribeiro, Luciano Lepera, José Julio Chiavenato, Rosana Zaidan, Rubens Volpe, Vitor Cervi, Sidnei Quartier, Otavio Ribeiro, o Pena Branca, entre outros, que através de seus textos e matérias, marcaram pelo menos três gerações de profissionais.Quando vim trabalhar onde o Brasil foi Paraguai, Campo Grande/MS, em 1984, me enlacei de vez em minha amizade com o Sérgio que nunca perdeu o contato. Tornando-me um correspondente no Brasil Central dos leitores do "eixo" daquele que seria seu novo e ultimo projeto: a Caros Amigos. Na histórica numero 2, que trazia na capa Frei Beto ( senão me falha a memória) em parceria com o Ze Hamilton Ribeiro, ( que assina com pseudônimo), Sérgio nos pautou uma reportagem "com o maior poeta em atividade no Brasil", o Poeta Manoel de Barros. Sempre ao telefone, Sérgio sugeria textos ou matérias, sempre antenado com o que ocorria em todos os cantos do PaÃs e do Mundo. Após outras matérias e textos, produzimos outra capa: uma entrevista exclusiva, também com o Poeta, que completava 90 anos em Dezembro de 2006 e nos presenteou com um poema inédito. Sempre arredio, avesso, à imprensa, o Poeta Manoel de Barros , sempre teve uma admiração especial por Sergio de Souza, à quem tratava também de "mestre". Se conheciam desde os tempos da Realidade e entre suas afinidades estavam a literatura e o domÃnio do idioma.Aprendemos com Sergio e sua paciência Franciscana que jornalista que se preza não se acomoda nunca ao poder, que, escrever é fácil ou impossÃvel. Era belo aprender teus ensinamentos, cidadão! Prestar atenção em tudo que tinhas a dizer! Sentir sempre a indizÃvel expressão de fidelidade e paciência que trazias, teus conhecimentos. Ainda como num poema, teus ombros pareciam suportar e carregar as dores e os pecados do mundo, mas nunca se curvaram ao peso da enorme missão, que te predestinastes.
Dizei-nos o que te faltou realizar, Serjão, pois nunca te permitiu acomodar-se a nada e tão pouco à ninguém! Realizador, sempre foste o descobridor, a comandar, redações, projetos ou batidas de ventos, como os moinhos de Quixote. Mesmo em tempos sombrios nunca perdestes a fosforescência que te fez atravessar, vastos e noturnos oceanos. Fostes, companheiro e camarada, ponto extremo de um processo contÃnuo: anônimo, sereno, universal. Sergio de Souza nasceu em São Paulo, mas poderia ter sido no Japão, ou qualquer outro lugar do planeta. Onde passou emitiu, opiniões, criticas, através de jornais, revistas, veÃculos, redações ou palestras, continuando sempre "perturbador". Sua consciência democrática não fez surgir em nossa profissão, nestes tempos de jornalismo efêmero, nenhuma outra personalidade capaz de exprimir com vigor o sentimento de traição de nossos ideais, com tanta fidalguia, ética, e serenidade como a dele. No jornalismo atual, onde se confirma um consenso apático caracterizado pela falta de questionamento, sempre se caracterizou, por questionamentos, para nos lembrar que existem outras maneiras de ver, de conceber o real, além das veiculadas pelo discurso dominante. Sua paciência oriental, nos remete ao pássaro do romance japonês de Kenzaburo Oe, um dos mais importantes da literatura contemporânea. Sergio, como aquele canário da mina, esteve sempre alerta com seu canto, para abrir nossas consciências e já prestes a morrer , continuou "cantando" até o ultimo sopro, para se esforçar , simplesmente a viver com dignidade. Dizem que Deus fez tudo de bom, só cometendo um erro: a duração da vida. A vida é muito curta e deveria ser não infinita, pois seria muito chata, mas pelo menos o dobro. Duas vidas, uma para ensaiar e outra pra representar, constatou um artista que não me lembro o nome. Para o Sérgio de Souza suas " duas vidas" não teria nada de diferente da que viveu: de trabalho e outra de sonhar; o sonho de alguém que nunca perdeu a fé num mundo mais justo e num ser humano melhor.
O Tempo só anda de ida.
A gente nasce, cresce, envelhece e morre.
Amarrar o Tempo no Poste!
Dia que a gente estiver com tédio de viver é só desamarrar o Tempo do Poste.
PS: Acompanhando as eleições no Paraguai e a vitória de Lugo, fui surpreendido com a morte do Serjão ( que nos deixou no mesmo perÃodo). Mas como nunca é tarde a "Caros Amigos" que circula nas bancas, a partir deste próximo final de semana, traz uma Edição Especial em sua homenagem. O poema que fecha o texto é de Manoel de Barros, assim como o titulo, ONTEM CHOVEU NO FUTURO, frase retirada de um de seus poemas e que já foi utilizado como titulo de uma revista cultural editada pelo poeta do " Portunhol Selbagem," Douglas Diégues.
Bosco Martins- è Jornalista, da FIJ (Federação Internacional de Jornalistas),
ex-conselho fiscal da ABEPEC (Associação Brasileira de Emissoras públicas e Culturais)
colaborador: comunique-se, cronópios, overmundo e Caros Amigos.
bosco.martins@carosamigos.com.br:
www.boscomartins.com.br
Salve, Bosco!
Não devemos deixar morrer a lembrança dos BONS!
Abraço Pantaneiro.
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