A matriz afro por mãos, pés e corpos do Majê Molê

Pedro Pessôa
Apresentação do novo balé do Majê Molê, inspirado no padrinho do grupo, Ogun
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Pedro Pessôa · Rio de Janeiro, RJ
13/11/2008 · 92 · 0
 

O Festival de Diversidade Cultural Tangolomango começou na Fundição Progresso dois dias antes do show, na sexta-feira, com uma confraternização entre todos os grupos participantes. Este ambiente de preparação inicial foi fundamental para dar ao evento deste ano, o seu verdadeiro sentido: o intercâmbio de culturas entre os diversos grupos do país que se apresentaram, aqui, no Rio de Janeiro, no domingo.

Sexta e sábado, os grupos produziram apresentações fantásticas, ainda em um ambiente de treinamento e interação para o show de domingo. Danças, músicas e instrumentos, das mais distintas culturas brasileiras, se juntaram às performances circences da Escola Social de Circo do Chile. Assim, não raros eram os momentos em que havia meninas do grupo pernambucano Majê Molê dançando entre as apresentações musicais do Gigantes pela Própria Natureza, grupo teatral que se apresenta sobre pernas-de-pau, ou em que os componentes mirins do grupo Pandeloucos se juntavam à Geraldo Junior & Banda, em uma criação sensacional improvisada de samba-forró.

Esta confraternização tem como objetivo a integração dos grupos e, para que isso acontecesse, todos os integrantes formaram uma roda. Seguidos de aplausos, eles disseram seus nomes, o de seus grupos e, alguns um pouco acanhados, outros extremamente animados, falaram sobre a sua motivação para o Festival.

"Vamos Tangolomanguear!"

Estas foram as primeiras palavras do percussionista Nino, do grupo Balé Afro Majê Molê, de Recife, na sua apresentação.
Podemos considerar a frase como o grito de guerra - ou melhor, de paz - do evento. Quando perguntado sobre o significado, ele explicou que "tangolomanguear" significa unir vários grupos de vários ritmos, exatamente o sentido do Festival.

“Crianças que Brilham”

Nino, ao lado de Beto Bala e Marquinho, dá ritmo às apresentações do Majê Molê, grupo que já participa pela segunda vez do evento, já que a primeira apresentação no fesvitval foi em sua cidade-natal, Recife.

O grupo é formado por meninas com idades entre 11 e 19 anos, além dos percussionistas. Jamile Roberta conta que conheceu o Majê Molê através de suas colegas, como Andressa Santos. Larissa Stefany, através de Fernanda Raissa. Viviane Kelly, por sua tia bailarina, que a convidou a participar do grupo. E Iraê Odara, religiosa do Candomblé, por Gloria Maria Gomes, uma das coordenadoras do grupo... e o balé afro do Majê Molê ainda conta com Angélica e Gleice.

De diferentes idades, as “crianças que brilham”- significado de Majesi Mimolê, nome original do grupo em dialeto ioruba - se contorcem entre passos e movimentos de danças africanas. São pisadas firmes, gritos e movimentos fulminantes, remetendo os traquejos e a dança de Ogun, deus da guerra na matriz anímica, oriunda da África. Cada manobra corporal é acompanhada de intenso ritmo, produzido pelos percursionistas do grupo em atabaques, o que aproxima ainda mais uma apresentação do Majê Molê de um ritual num terreiro de candomblé.

As meninas pesquisam livros, sites e músicas para se aprofundarem no denso conteúdo africano da matriza africana, berço da cultura que representam. Iraê ainda nos conta que leva alguns ensinamentos da sua religião para as colegas do grupo aprenderem sobre os movimentos (as mãos espalmadas, como a espada de Ogun), os gritos e as músicas.

Para os fundadores do grupo, Gilson Gomes e Mônica Soares, a intenção era empenhar as crianças em atividades musicais e corporais, durante eventos que deveriam ocorrer sempre em 12 de outubro. E mais: para se integrar ao grupo são necessários regularidade e notas boas na escola.

Do alto de seus 12 anos, Viviane Kelly atribui ao Majê Mole as responsabilidades de divulgar uma “dança clássica”, não muito conhecida, mas que se assemelha a ritmos tradicionais nordestinos, como o frevo, e apresentar as tradições de uma cultura que ainda sofre alguma resistência social: a cultura afro-brasileira. Este preconceito, que, de acordo com a coordenadora Mônica Soares, “só se vence através do tempo”, afasta do povo um conhecimento da raiz africana e impede ainda a aproximação de algumas crianças do grupo. Jamile conta que, ao tentar entrar para o grupo de dança, foi impedida por seu pai. Ele acreditava que o ambiente de “macumba” não traria nenhum benefício para a filha. Mesmo assim, Jamile consegui driblar os pais, que jogavam um sobre o outro a responsabilidade de lhe permitir participar do grupo, dizendo à mãe que o pai havia liberado sua participação e ao pai, o contrário.

O espírito de solidariedade também predomina: as meninas, que pretendem todas seguir carreira artística, dividem o cachê de algumas apresentações por igual com os percursionistas e os outros integrantes do grupo.

Quando questionadas sobre o que seria mais importante, aprender ou ensinar, em um festival como o Tangolomango, elas não titubearam. “Os dois”, responderam em uníssono, durante os ensaios de Geraldo Júnior & Banda. Larissa Stefany, 16 anos, uma das integrantes do grupo, ratifica: “vamos mostrar pra eles tudo que a gente sabe, mas também queremos muito aprender”.
Esta é a primeira apresentação do grupo no Rio de Janeiro. Experiência que, pela animação das meninas no evento, certamente será repetida.

Por Bruno Gouveia Motta, Luis Filipe Camacho Valente e Pedro Henrique Barbosa Pessôa
Agradecimentos especiais ao Grupo Majê Molê e à Gilson Gomes e à Helena Aragão e Thiago Camelo, do Overmundo.

Vídeo do primeiro dia de apresentações e ensaios para o Tangolomango 2008, no Rio de Janeiro
http://br.youtube.com/watch?v=S0vbCDnhsEs

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Todos os grupos se apresentam ao mesmo tempo, produzindo um espetáculo lindo zoom
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