O Amor do Sim

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Valmir Junior · São Paulo, SP
12/6/2007 · 90 · 0
 

Crítica original do blog Motocontínuo

Se existe uma atriz que pode personificar o TEATRO, essa é Ângela Barros. Sempre surpeendente, de uma energia fortíssima, uma mãezona, tal e qual uma Cacilda Becker de nosso tempo. Se Cacilda dizia que "se fingia que cantava, todo mundo acreditava", Ângela pode dizer: "se eu interpretar o próprio Teatro, as pessoas irão acreditar". E é isso o que acontece em O Amor do Sim, em cartaz no Espaço dos Satyros Um, na Praça Roosevelt.

Ela literalmente rouba a cena dos outros competentíssimos atores nessa comédia de Mário Viana, integrante do projeto E Se Fez a Praça Roosevelt em 7 Dias, com uma peça para cada dia, ligada à Praça que abriga vários teatros. O Amor do Sim é a de segunda-feira. Comédia leve, como deve ser o começo da semana. Entretanto, Viana insere pitacos interessantes, aproveitando o encontro de quatro personagens distintas: o espírito do Teatro, um iluminador (Otávio Martins), uma manicure (Flávia Garrafa) e um homossexual (Alex Gruli).

A manicure Sueli foge da barbárie que assola o mundo lá fora e é salva por um iluminador, Louro, que a ajuda a se esconder no teatro. Eles acabam se interessando um pelo outro quando descobrem a existência do espírito do Teatro, de nome Dirce (Ângela Barros). Entretanto, o homossexual Buri surge, também fugindo do caos, para colocar fogo na relação entre o artista e a esteticista.

Aparentemente despretensiosa, a comédia dirigida pelo requisitado Alexandre Reinecke (diretor também da há-pouco-estreada Ãlbum de Família, em cartaz no Sesc Anchieta) lida com situações para provocar o riso, muitas vezes auto-referenciais e metalingüísticos, não bastasse a cenografia reproduzir o Espaço Um dos Satyros na verossimilhança-espelho. Só faltava cópias do público sentado. Sueli estranha aquele teatro, o teatro não-convencional, sem drapeados e ornamentos. É a voz do dito "povão", que credita ao Teatro a alcunha de "difícil de ser entendido" e elitista. Quando a manicure diz a Dirce sobre as novelas, o espírito do Teatro quase se apaga.

A comicidade surge desses tipos, logicamente: um iluminador descolado (porque se entende que gente de teatro é assim), um homossexual afetado e uma manicure alienada. As interpretações estereotipadas, numa primeira análise, seriam passíveis de crítica ferrenha, já que é o que se faz atualmente: qualquer falta de complexidade de personagem é tremendamente criticada; tipos só na Commedia Dell'Arte... Mas eu não achei que foi o caso. Há uma proposta.

Os tipos não pretendem atingir só o riso. Na verdade, servem a múltiplas funções: abrangem a variedade de pessoas na Praça Roosevelt (gays e pessoas da classe teatral) e o povo que desconhece o lugar (moradores da periferia). Objetivam o macro, o foco maior: a Barbárie contra a Arte, o Teatro, o Povo, os Artistas e os Excluídos. Além do mais, os detalhes de composição que cada ator utilizou para as personagens retira o viés pejorativo do "estereótipo" daqueles seres ficcionais. Ponto para Reinecke e os atores.

Com todos esses prós, um contra me deixou de dar nota 10 à comédia: a resolução rápida dos conflitos estabelecidos numa lógica muito bem aceita para comédias românticas, mas inaceitável para dramaturgos e encenadores experientes. Entretanto, a peça diverte e é crítica, coisa que poucas comédias hoje fazem. Portanto, relevemos.

O Amor do Sim. Direção: Alexandre Reinecke. Elenco: Ângela Barros, Flávia Garrafa, Alex Gruli e Otávio Martins. Onde: Espaço dos Satyros Um, Praça Roosevelt, 214. Quando: Segundas, 19h. Até 30 de junho.

P.S.: Sem foto de divulgação, pois não conseguimos encontrá-la no formato utlizado pelo Overmundo, apesar de ter lindas fotos da Lenise Pinheiro aqui.

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