O Dance of Days faz parte de um grupo de bandas que produz um efeito peculiar: a sua música provoca culto. As pessoas nascem e morrem entre o inÃcio e o fim de um show. Não é (ou era, pelo menos, nos tempos em que eram a cereja do bolo) incomum ver uns que choram, meninos ou meninas, e todos gritam os versos com tanta ou maior força do que o vocalista Fábio Altro, ou Nenê Altro, como apelidado; cantam como se a música fosse mesmo vida, a deles, fielmente traduzida. As melhores letras do com freqüência limitado rock nacional são deles. O Dance of Days apresenta um repertório enorme de referências mitológicas, históricas, culturais; recria metáforas e traz imagens novas. Na produção brasileira, não há muitas bandas tão abrangentes.
São quatro álbuns principais, fora o primeiro lançamento, com seis músicas em inglês quase sempre fora do repertório: A História Não Tem Fim (2001), Coração de Tróia (2002), A Valsa das Ãguas Vivas (2004) e LÃrios Aos Anjos (2005). Mas, irredutÃveis a fórmulas, se você ouvir apenas um desses, terá uma visão errada do conjunto. Dentro de um mesmo álbum, se calhar de ouvir as três mais cheias de ódio, vai criar uma imagem que não seria de longe compatÃvel com outras três, leves e lÃricas. Talvez por isso, tanto choro e tanta identificação – ouvir Dance of Days é uma espécie de relacionamento. No decorrer dos cds, as letras mudam, os temas são tratados de outra forma, a sonoridade se transforma. Multifacetado, portanto. Ou se ama ou se odeia.
No primeiro álbum: traição, ateÃsmo (na verdade, uma fé ao inverso), amor cor-de-rosa e choro sentido, que pede atenção. A batida e as melodias que levam a dançar lembram um pouco o The Smiths, em Hathful of Hollow. No segundo álbum, as letras se tornam únicas. A começar pelo nome, cheio de significado – Coração de Tróia, como cavalo de Tróia – cada uma das composições vai tecendo intertexto com tantas outras obras. Prova disso, o próprio tracklist: Pregos, Cruzes e um Saco de Moedas, Tijolos Amarelos, Nos Olhos da Guernica (um curto verão em La Mancha) – só essas três relembram Jesus, O Mágico de Oz, um quadro de Picasso e Don Quixote. E essa é apenas a superfÃcie.
A intertextualidade não causa problemas de entendimento. Nenê Altro se apropria bem das referências que toma, ao contrário de outros letristas brasileiros, que, sem posse real das idéias, só repetem alguma frase, apenas dão melodia a filosofices. Os Titãs, recente, fizeram do “o inferno são os outrosâ€, de Sartre, um verso. Pitty canta aquele “o homem é o lobo do homemâ€, de Hobbes. Ecoam idéias; o Dance of Days as usa. As citações são renovadas, existem por si só na música, contam a história que precisam contar. Assim, personagens da guerra de Tróia, Joana d’Arc, o traidor de César Brutus, todos, são só instrumentos de um maestro maior.
Do segundo álbum ao terceiro, a diferença é de temas. “Coração de Tróia†ignora amor que seja belo; há ódio, despeito e mágoa. Desesperança. Isto tudo no pessoal e no que é de todos. São músicas polÃticas. Mas não são um outro Dead Fish, gritando pra sempre contra o sistema. Falam do vazio dos rebeldes. Da revolução que não dá em nada. É um caminho para “A Valsa das Ãguas Vivas†– que aborda a polÃtica como reconciliação, os revolucionários como quem perdeu o foco. O dragão nos sorri, mas não sabemos o que queremos, diz Cem Mil Bolas de Neve (letra). É um comentário único sobre ideologias.
E é a última palavra sobre elas. Um ponto importante sobre o Dance of Days é que não se sabe bem o que virá a seguir. A banda é orgânica e mutante. O estilo se define cada vez mais, e a temática se afunila. Abandonam a polÃtica e o sofrimento. “LÃrios aos Anjos†é puro carpe diem. Diz: esse mundo não merece nossa tristeza. Recentemente, lançaram um dvd que faz um panorama de como são no palco e de como foi a trajetória. Chama-se “Metrópole em Chamasâ€. A dança dos dias teve a luta e compreensão final. Das cinzas da cidade, o que virá? Não se sabe, como eu disse, nunca se sabe.
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Correção
Adeus, Sofia
Quem vai Limpar o Quarto de Gregor Samsa?
É Só o Inferno e Mais Nada
Ficou bom sem ser puxa-saco.
Dance é sem sombra de dúvida uma das melhores, senão a melhor, bandas de rock da atualidade.
Bacamarte.
Bacana o texto bem desenvolvido. Mas também concordo com a Leticia Silva, se fosse menos puxa ficaria melhor.
Quando você fala de outra banda como citou o Dead Fish é bom dar referências em seu texto, pois as pessoas que não conhecem vão ficar voadas quanto a outras referências.
Eu ainda prefiro o Dead Fish
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