Em novembro de 2004 no Rio de Janeiro, Gilmar Rogério Wendel era o mais calado da turma de 40 pessoas da oficina de produção de vÃdeo digital do projeto Revelando os Brasis, promovido pelo Ministério da Cultura, Instituto Marlin e Petrobras. Já na tarde fria, quase zero grau, do domingo, 24 de junho, passeava falante cumprimentando a todos pela quadra ao lado da Praça de Arroio do Tigre.
Apesar do nome e do tigre de pedra embaixo da placa de boas-vindas da cidade, Arroio do Tigre não é um parque temático. A cidade de 12.214 habitantes a 4 horas de carro de Porto Alegre ganhou esse nome quando os primeiros imigrantes alemães chegaram por volta de 1900 e abateram uma onça, que chamaram erroneamente de tigre, na beira do arroio. Seu dia de entretenimento na praça foi resultado da exibição do filme do agricultor e agora diretor Rogério, 33 anos, um dos vencedores do projeto Revelando os Brasis, um documentário histórico sobre a revolta conhecida como O Grito de Bamo, ocorrida na região na década de 30. Duzentas e cinqüenta pessoas estavam ali pra assistir ao filme, em sua maioria famÃlias com crianças, e outras duzentos e cinqüenta colaboraram na produção e elenco do filme. Todas da comunidade. Uma produtora de Santa Cruz do Sul foi responsável pela parte técnica e alguns lojistas apoiaram o vÃdeo financeiramente.
O Grito do Bamo foi um movimento camponês com fundo mÃstico que uniu os agricultores e por isso, foi destruÃdo a tiros. Seu lÃder, no vÃdeo interpretado pelo próprio Rogério, foi preso, morto e exibido pela cidade como troféu da polÃcia. Na vida real, o agricultor também é ligado a movimentos da terra, ele é ativo no movimento dos pequenos agricultores da região.
No filme, as cenas histórias são reproduzidas intercalando-se com o depoimento de um estudioso do assunto, professor da UNIJUÃ, também de Arroio do Tigre. Mas Rogério ficou sabendo da história pelo seu avô, Rudy Ghröel, 75 anos, como toda a famÃlia de Rogério presente para assistir à exibição. Rudy diz que era desse “tamanhinho†e mostra a altura do bisneto Luan, de 9 anos, quando viu tudo acontecer. Segundo o diretor, a visão do avô é dos vencedores e não a que ele quis mostrar no filme: dos oprimidos.
Rogério se entusiasmou em ser diretor. Estudante de jornalismo na UNISC, ele agora pretende fazer um documentário longa-metragem sobre o cultivo de fumo na região. E pensar que tudo começou por um anúncio na voz do Brasil. "Ouço sempre que posso", diz.
O projeto Revelando os Brasis foi uma proposta do Instituto Marlin e do Ministério da Cultura para democratizar o acesso às tecnologias digitais. O objetivo era mostrar um olhar do Brasil que dificilmente é documentado, ainda mais como audiovisual. A caravana em Arroio do Tigre, contava com uma produtora do Instituto Marlin, uma fotógrafa da ONG Observatório das Favelas e um estudante do Instituto Marlin responsável pelo making of.
Junto com a história de Rogério foram escolhidas outras 39. Todas viraram curtas digitais de 15 minutos (a de Rogério também teve uma versão do diretor de 19). A maioria das histórias eram documentais, 26 ao todo, enquanto as outras 14 foram de ficção. A caravana, que traz o caminhão de projeção já passou por 19 estados, depois de Arroio do Tigre segue para Mato Grosso do Sul e termina em Rondônia, encerrando uma viagem de mais de trinta dias por todo o Brasil. Segundo a produtora do Instituto Marlin, Gabriela Vieira, 33 anos, a maior emoção é ver a reação do público se identificando no filme e também a mudança de mentalidade das cidades. Algumas das histórias foram biografias de pessoas que eram oprimidas na cidade e, com a realização do filme, viraram estrelas por lá.
Para o diretor de Arroio do Tigre o mérito principal da sua história foi o resgate histórico de uma história que poderia ter sido esquecida e que assim, ainda foi popularizada. Mas o público de Arroio do Tigre que enfrentou o frio do final da tarde estavam ali estavam para ver a si mesmos na tela. Logo que o filme começou a ser feito todos os amigos e familiares de Rogério foram chamados. Os atores principais foram escolhidos por ele, que, como bom diretor, colocou a namorada como atriz principal, ao seu lado como a esposa do lÃder da revolta.
No hotel onde a caravana estava hospedada, o único da cidade, Dona Clari, a dona repetia continuamente que conhecia quase todos que participaram do filme. “Um que outro a gente não conheceâ€. Esses, Dona Clari, são das comunidades vizinhas. Rogério é natural de Coloninhas, no interior de Arroio do Tigre, e de lá trouxe atores e produtores para seu filme. Do movimento que participa, não muito diferente do lÃder que interpreta no filme, trouxe o apoio das comunidades vizinhas como Sobradinho e Estrela Velha de onde vieram figurantes e produtores.
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